‘Preparai os caminhos do Senhor’

Ao realizar milagres, Jesus às vezes requeria um gesto de colaboração: a doação de uns pães (cf. Jo 6,9); o ato de estender a mão (cf. Lc 6,8.10); o pedido do que se necessita (cf. Mc 10,51). Deus é onipotente e pode realizar prodígios sem ajuda alguma, mas não prescinde de nossa cooperação. Isso se dá não apenas em relação às graças extraordinárias. A ordem estabelecida por Deus na criação mostra que a colaboração humana – ainda que mínima – é requerida para recebermos os bens mais importantes.

A vida é um mistério cuja origem se encontra em Deus. Ele, porém, conta com o amor humano e a generosidade dos cônjuges para trazer ao mundo novos filhos. A manutenção da existência é um ato da Providência. O Senhor, porém, requer que nos alimentemos, trabalhemos e repousemos. A inteligência é um tesouro que nos foi dado. Mas, para colher os seus frutos, temos de nos empenhar fatigadamente. Algo semelhante se verifica no que diz respeito à nossa salvação eterna. 

O maior exemplo disso é a Anunciação. Deus já havia disposto o seu maravilhoso plano para salvar o mundo. Não quis realizá-lo, porém, sem a colaboração de uma criatura: a Virgem santa de Nazaré. Ele quis que, por meio da cooperação de sua inteligência e vontade humanas, Ela desse o livre consentimento que beneficiaria a todos: “faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38). Esse simples “sim”, que Nossa Senhora deu como Mãe ao Arcanjo Gabriel, precisa ser repetido individualmente por cada um ao longo de nossas vidas. 

A salvação é um dom de Deus, obtido por Cristo na Cruz e infinitamente superior às forças humanas. Jamais poderíamos nos salvar a nós mesmos, por melhores e mais empenhados que fôssemos. O Pai, contudo, nos pede algo pequeno como um grão de mostarda, e essencial: a fé. Sem ela, bloquearíamos a ação maravilhosa do Criador. O Espírito Santo continuamente vem em nosso auxílio, para nos iluminar, conduzir e derramar profusamente todos os seus frutos e dons. No entanto, Ele não agirá se não lhe dermos uma só coisa: docilidade. 

Pois bem, este é o sentido das palavras de São João Batista “preparai os caminhos do Senhor, endireitai as suas veredas” (Mt 3,3): temos que fazer a nossa parte! Ela é pequenina, em vista do imenso bem que receberemos. Mas compete somente a nós. Ninguém deve pensar que o Senhor lhe pede algo tão grande que não possa ser dado, nem tão pequeno que deva ser desprezado. Deus nos pede algo que somente nós, individualmente, podemos dar. 

O que Ele pede? Confiança, agradecimento, oração, reconhecimento dos pecados, desejo sincero de estar com Ele, cumprimento dos deveres de estado… em síntese, amor! Pede também as virtudes humanas, que, como um vale aplainado, tornam a alma capaz de amar: humildade, temperança, sinceridade, lealdade, penitência, ruptura total com o pecado, sobretudo mortal. Se fizermos o pouco que nos compete, Deus fará muito mais. E, então, “o Senhor descobrirá o seu braço e os confins da terra verão a sua salvação” (Is 52,10). 

guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Veja todos os comentários