São Paulo e a verdadeira Igreja

Aproxima-se a festa da Conversão de São Paulo, grande discípulo missionário de Jesus Cristo. Ele é Patrono (Padroeiro) de toda a nossa Arquidiocese, da Cidade e do Estado de São Paulo, e nós nos alegramos por ter nele um exemplo que inspira nossa ação eclesial e evangelizadora nesta metrópole. Comemoramos também a fundação da cidade de São Paulo, em 25 de janeiro de 1554. A data está relacionada com a celebração da primeira missa festiva na missão “São Paulo Apóstolo”, dos Jesuítas, justamente na festa litúrgica da Conversão de São Paulo.

Na mesma ocasião, inauguravam-se a capelinha e a pequena escola da missão. É importante lembrar que nossa “cidade imensa” nasceu de uma missa e do anúncio do Evangelho “entre as nações”. Anúncio da Palavra de Deus, Liturgia e promoção humana, nas mais diversas formas, estiveram unidos desde o princípio da Igreja em São Paulo. Isso mantém toda a sua atualidade ainda hoje.

Do Apóstolo, aprendemos sempre de novo as questões fundamentais da nossa fé e da prática da vida cristã. Em nossos dias, constata-se uma movimentação estranha, pondo dúvidas sobre a autenticidade da Igreja. Se os questionamentos viessem apenas de quem não é membro da Igreja, seriam compreensíveis, pois a Igreja é um “mistério da fé”, e sua compreensão verdadeira requer, além da abertura humana, também a ajuda do Espírito Santo. É estranho que certos questionamentos venham de dentro da Igreja e não por motivos teológicos, mas ideológicos. Respeitada a boa consciência de quem procura a verdade sinceramente, mas acaba errando, é preciso refletir e afirmar a verdade sobre a Igreja e seus fundamentos irrenunciáveis, como pretendo fazer neste e em outros artigos.

Na pregação e nos escritos de São Paulo, aparece uma série de elementos essenciais para compreender corretamente a Igreja. Mas é preciso observar logo que nem os escritos de São Paulo nem os demais escritos do Novo Testamento trazem uma doutrina já evoluída e completa sobre a Igreja. Ali, vamos encontrar os fundamentos, mas seu desenvolvimento teológico e doutrinal vai acontecendo ao longo dos séculos e está estreitamente relacionado com o desenvolvimento da doutrina cristã sobre a Santíssima Trindade, especialmente sobre a ação e missão do Filho e do Espírito Santo. Partindo sempre dos mesmos fundamentos bíblicos e dos grandes teólogos dos primeiros séculos da Igreja, vemos que ainda hoje a compreensão da Igreja evolui e se explicita sempre mais.

A compreensão que São Paulo tinha da Igreja está relacionada estreitamente com sua experiência de Jesus Cristo. E aqui já temos um elemento essencial da Igreja: esta não pode ser compreendida corretamente sem sua relação estreita com a pessoa e a missão salvadora de Jesus Cristo no mundo. Da mesma forma, a Igreja não pode ser compreendida sem sua relação com o Espírito Santo. São Paulo entende que o Filho de Deus e o Espírito Santo foram enviados a este mundo por graça e benevolência de Deus Pai. Essa relação com a Trindade Santa aparece, entre outros lugares, nas saudações que São Paulo usa no final de suas cartas (cf. Rm 1,1-8; 1Cor 1,1-3): “A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós” (2Cor 13,13).

Sem essa dupla relação estreita com Jesus Cristo e com a Trindade Santa, a Igreja acaba sendo vista e compreendida apenas como uma realidade humana entre outras. O Papa Francisco tem alertado em mais de uma ocasião que a Igreja não deve ser vista como uma ONG, nem mesmo, apenas, uma “ONG do bem”. É verdade que ela é, também, uma realidade humana e se expressa nas realidades humanas, usa os elementos culturais para se apresentar ao mundo, serve-se de organizações humanas, é formada de pessoas, que podem até mesmo falhar e errar. Mas isso não é tudo. A Igreja é muito mais que uma organização meramente humana e possui, no seu fundamento, o desígnio de Deus Providente e Salvador. Sua natureza é humana e sobrenatural, e ela está a serviço “das coisas de Deus”. No seu centro estão o próprio Jesus Cristo, “Senhor e Cabeça da Igreja”, e o Espírito Santo, que torna fecundas e eficazes as suas ações, quando feitas na sintonia com o mesmo Espírito Santo.

São Paulo tinha clara compreensão de que a Igreja era a comunidade das pessoas, que haviam aceitado o Evangelho e aderido à vida nova, em conformidade com o Espírito Santo. Por isso, ele bate com frequência nessa tecla: quem é membro da Igreja deve acolher com alegria o dom da fé, recebido de Deus, viver em conformidade com o Evangelho e ser testemunha fiel de Jesus Cristo. Ao mesmo tempo, viver sintonizado com o Espírito Santo, fazendo frutificar os dons recebidos do mesmo Espírito Santo.

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