‘Seduziste-me, Senhor!’

Prevendo os sofrimentos de Jeremias, Deus lhe prometeu: “Lutarão contra ti, mas nada poderão, pois Eu estou contigo” (Jr 1,19). O Senhor tem um desígnio para nós; ainda que haja dores pelo caminho, Ele jamais nos abandona! Apesar disso, no momento mais duro da prova, quando as promessas divinas pareciam distantes, o profeta se lamentou: “Seduziste-me, Senhor, e deixei-me seduzir” (Jr 20,7).

O sofrimento e a injustiça vêm à nossa vida num momento, de um modo, e numa intensidade diferentes daquilo que esperávamos. Ainda que estejamos dispostos a enfrentar adversidades por amor a Deus, os bons propósitos e a confiança são postos à prova. Questionamos, então, o porquê dos acontecimentos; nutrimos um desejo impaciente de justiça; sentimos que a dor é inútil e poderia ser evitada; culpamo-nos; perdemos a paz, achando que as dificuldades nos impedem de viver. Essa luta interior aconteceu a Jeremias, a Jó e a tantos outros!

Diante do mal que não pode ser mudado, há até quem julgue o Senhor, exigindo-Lhe respostas, e recriminando-O pela injustiça e pela dor dos homens. Essa atitude se difunde numa sociedade cada vez mais soberba e, portanto, incapaz de suportar contrariedades. Outros, ao invés, tentam dar uma explicação fácil aos sofrimentos concretos: “acontece por causa disto ou daquilo”; “com certeza é punição divina”; “não, Deus não castiga” etc. Arriscam-se a receber a reprimenda: “Não pensas as coisas de Deus, mas, sim, as coisas dos homens!” (Mt 16,23). Há situações diante das quais podemos apenas aceitar e, com humildade e reverência, silenciar.

A única certeza é que, se o Senhor permite um aparente mal, é porque Ele quer tirar disso um bem maior. É preciso aceitar sem rebelião o desafio de cada dia! Sabendo que passamos por provações e cansaços, o Senhor nos previne: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga” (Mt 16,24). Não é um convite à resiliência fria: devemos abraçar a cruz com amor! Na sua Agonia, Paixão e Morte, Cristo sentiu o peso de todos os pecados, injustiças e sofrimentos do mundo. Fez isso para nos salvar e para consolar os que sofrem.

Somente no Céu haverá uma vida sem sofrimentos. Jesus, porém, veio conferir um sentido aos sofrimentos presentes. Não se trata de “entender o porquê” de tudo, mas de aceitar e de saber que não estamos sozinhos e que a dor do cristão nunca é estéril! Aliás, tudo o que nos faz padecer pode ser oferecido por meio Dele como “sacrifício vivo, santo e agradável a Deus” (Rm 12,1). Levamos espiritualmente os nossos ais à Missa e os oferecemos por intenções concretas.

“Quem perder a sua vida por causa de mim, vai encontrá-la” (Mt 16,25)… Quem se rebelar contra a dor, sofrerá ainda mais e endurecerá. Quem aceitar o que não pode ser mudado nem explicado, terá condições de fazer o “milagre da Cruz”. Este consiste em transformar a dor em amor, em humildade, paciência, sabedoria, compreensão e até mesmo em… alegria! Deixemo-nos “seduzir” pela Cruz do Senhor!

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