Superproteção: um mal fantasiado de bem

Crianças nascem pequenas, frágeis, débeis, incapazes de sobreviver sem o cuidado dos pais ou de algum adulto que se responsabilize por elas e seu bem-estar. Diante dessa real fragilidade, os pais, rapidamente, ocupam o lugar de proteção de seus pequenos e assumem os cuidados necessários para que sobrevivam e possam crescer. 

Há, no entanto, um limite tênue nesse movimento, que muitas vezes acaba passando despercebido. Para que eles verdadeiramente cresçam e se tornem pessoas autônomas, capazes de cuidar de si mesmos, os pais têm que discernir com muita sabedoria os limites da proteção, cuidando atentamente para não superprotegerem os filhos. 

Formar pessoas é uma missão complexa e exigente. É preciso ter em mente os objetivos e trabalhar incansavelmente para alcançá-los. Mais ainda, é fundamental ter em mente que serão alcançados em longo prazo e que, exatamente por isso, é preciso determinação e persistência no caminho em busca deles. 

Quanto mais os pais quiserem proteger os filhos, livrando-os de todos os pequenos riscos e sofrimentos que se apresentam desde a mais tenra idade, menos autônomos e seguros eles estarão para enfrentar os desafios cada vez mais complexos que a vida apresentará. 

Exatamente por isso, é fundamental que a família favoreça a aquisição de autonomia por parte da criança, desde cedo. 

Quanto mais estruturada for a rotina e quanto mais bem implementados forem os hábitos, maior será a possibilidade de a criança assumir atitudes mais autônomas, tanto no que diz respeito ao autocuidado quanto ao cuidado do entorno. 

Quando pequenos, até aproximadamente 3 anos, ainda não têm critérios para decisões, porém, já têm capacidade de, por hábito e estímulo, assumir pequenas tarefas como: jogar fora a própria fralda, colocar no cesto sua roupinha suja, juntar seus brinquedos, contribuir com alguns encargos mais simples na casa (colocar guardanapos ou talheres na mesa, tirar o pó de algo etc.). A partir dos 4 anos, essa listinha de atividades possíveis cresce rapidamente, uma vez que vão se tornando mais hábeis física e intelectualmente. Também é necessário para que cresçam em autonomia que sejam desafiados fisicamente, ou seja, que engatinhem, se arrastem, andem, corram, subam, desçam, mesmo que eventualmente caiam e cheguem a se machucar. Observar a capacidade dos filhos e permitir que enfrentem desafios compatíveis com ela é muitíssimo importante para que se tornem pessoas seguras, confiantes, autônomas e audazes. Encontro, frequentemente, crianças com dificuldades de locomoção, equilíbrio e destreza porque, com medo de que se machuquem, os pais ou responsáveis evitam que elas realizem atividades físicas absolutamente necessárias para seu bom desenvolvimento. 

É importante considerarmos, também, que muitas vezes os pais dificultam que as crianças assumam posturas mais autônomas não exatamente por superproteção, mas por falta de tempo ou por impaciência, afinal, esperar uma criança pequena trocar de roupa, colocar uma meia ou mesmo ajudar a colocar a mesa custa, especialmente neste mundo que valoriza a rapidez em tudo o que se faz. 

Quando os pais superprotegem os pequenos e evitam que corram riscos ou assumam pequenas responsabilidades, seja por medo que se machuquem, seja por falta de paciência no processo educativo, estão, na verdade, formando pessoas dependentes, fracas, que esperarão soluções mágicas e externas para seus possíveis problemas. 

Para uma boa formação, é necessário medida até mesmo na proteção que se oferece aos filhos – não permitir que corram riscos graves é correto, porém, é preciso exercitá-los diariamente a se tornarem capazes de enfrentar as mais diferentes situações por si mesmos –, caminho longo e exigente, mas que conduz a um resultado seguro: pessoas autônomas e verdadeiramente livres. 

Simone Ribeiro Cabral Fuzaro é fonoaudióloga e educadora. Mantém o site www.simonefuzaro.com.br. Instagram: @sifuzaro 

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