Com recomposição de forças, começa a nova legislatura na Câmara e no Senado

Os 513 deputados federais e 27 senadores eleitos em 2022 tomam posse na quarta-feira, dia 1o, quando acontece a eleição para a presidência de cada uma das casas legislativas.

Foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO

Contando com o apoio do PT e dos chamados partidos do centrão, Arthur Lira (PP-AL) deve ser reeleito presidente da Câmara. Ele concorre contra Chico Alencar (PSOL-RJ), partido cuja bancada é de apenas 13 parlamentares, e Marcel van Hattem (Novo-RS), sigla partidária que terá três deputados na casa.

Já no Senado, a disputa tende a ser mais acirrada entre Rodrigo Pacheco (PSD-MG), atual presidente, e Rogério Marinho (PL-RN). Eduardo Girão (Podemos-CE) também concorre à presidência da casa. Considerando os votos dos parlamentares de partidos que integram o governo Lula, Pacheco teria exatamente os 41 votos necessários para se eleger (metade mais um dos 81 senadores). Já Marinho, apoiado pelo PP e o Republicanos, inicia a disputa com 23 votos e ainda procura o apoio de senadores do União Brasil, Podemos e PSDB. Entretanto, como os parlamentares votam individualmente e não necessariamente alinhados com seus partidos, tudo pode mudar.

NECESSIDADE DE CONSTANTE DIÁLOGO

Na Câmara, 262 deputados são de partidos que integram o governo Lula, quantidade superior aos 257 votos necessários (metade mais um dos 513 parlamentares) para aprovar projetos de lei complementares e medidas provisórias, mas não para realizar, a princípio, mudanças na Constituição, para as quais é necessária a aprovação de 3/5 dos parlamentares (308 votos). A maior bancada, com 99 deputados, é do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro.

“Com o apoio do governo Lula à reeleição do Arthur Lira, espera-se que o PP vote com o governo em questões importantes. Assim, o presidente não vai encontrar tanta resistência e provavelmente até vai conseguir aprovar Propostas de Emenda à Constituição (PECs), pois, além destes partidos, existem os chamados partidos satélites, como o Podemos, Rede, PV, que podem vir a aderir a pautas enviadas pelo Executivo”, analisou, ao O SÃO PAULO, Joyce Luz, doutoranda em Ciência Política pela USP e professora na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).

Cumpre lembrar, porém, que toda mudança na Constituição precisa ser aprovada em dois turnos tanto na Câmara quanto no Senado, e nesta última o governo Lula deve encontrar maior resistência, especialmente de senadores ligados a Bolsonaro, como os ex-ministros Sérgio Moro (União Brasil-PR), Tereza Cristina (PP-MS), Marcos Pontes (PL-SP) e Damares Alves (Republicanos-DF), além do ex-vice-presidente Hamilton Mourão (Republicanos-RS), também defensores daquilo que se habituou a ser chamado de pautas conservadoras, como, por exemplo, a contrariedade à legalização do aborto e à regularização do comércio de drogas no País.

O papel do Congresso Nacional de fiscalização e de controle dos atos do Poder Executivo tende a ganhar mais projeção nesta legislatura. “O PL, tendo 99 cadeiras na Câmara, fará uma oposição de peso ao governo, que irá enfrentar a todo momento questionamentos sobre seus atos por parte desse grupo mais oposicionista. Deve haver uma fiscalização e intensa cobrança por parte do Congresso muito mais forte do que se deu com outros governos, pois o Lula sucede a um governo totalmente oposto, e a oposição no Congresso é muito mais à direita do que antes”, comentou a doutoranda em Ciência Política.

Foto: Agência Câmara/Arquivo

PAUTAS PRIORITÁRIAS

Os novos congressistas iniciam o mandato já com a missão de deliberar sobre 27 medidas provisórias editadas pelo presidente Lula, entre as quais a que mantém o benefício mensal de R$ 600,00 às famílias de baixa renda e a prorrogação da desoneração de tributos federais sobre os combustíveis.

Entre as pautas prioritárias está a reforma tributária, com propostas que já tramitam tanto na Câmara quanto no Senado. “Já estão prontas para ser votadas. Basta que sejam ajustadas ao programa de governo de Lula”, disse em entrevista à Agência Senado o senador Humberto Costa (PT-PE). “Como a reforma tributária é de interesse do País, não tenho dúvidas de que o Parlamento fará a sua parte. É urgente que se reduzam o encargo das empresas e o custo-Brasil e que se torne o pagamento de tributos mais equilibrado”, afirmou o senador Carlos Viana (PL-MG).

Até o final de agosto, o governo federal terá de enviar ao Congresso a proposta de um novo arcabouço fiscal em substituição ao teto de gastos. “O Congresso vai ter de sentar para negociar propostas econômicas e de ajuste fiscal, pois é preciso aumentar a arrecadação no Brasil. Hoje se vive um cenário de déficit, o País gasta mais do que arrecada. E, se não houver dinheiro nos cofres públicos, também os deputados e senadores não conseguirão cumprir suas promessas eleitorais”, comentou Joyce Luz.

Na avaliação da professora, a reforma administrativa, apresentada como caminho para dar mais eficácia aos serviços públicos e reduzir custos com a manutenção do Estado, não será pautada neste primeiro momento: “A reforma administrativa é mais complexa, pois mexe com o Judiciário, o Legislativo e os próprios funcionários do Executivo. Assim, acredito que primeiro o governo irá focar o ajuste econômico e fiscal. A reforma administrativa ficará para o segundo ou terceiro ano de mandato”.

Revisões nas reformas trabalhistas e da Previdência também devem estar no radar dos congressistas, mas no entender de Joyce Luz, as alterações dependerão muito da forma como os projetos de lei forem apresentados: “Nos últimos quatro anos, o Legislativo saiu mais fortalecido em termos de poder propositivo. Assim, possivelmente, propostas mandadas pelo Executivo serão alteradas pelos parlamentares para que se chegue a um consenso até serem votadas”.

Conheça as principais atribuições dos senadores e deputados federais

– Deputados federais e senadores podem propor leis, normas e mudanças na legislação, incluindo alterações na Constituição federal;

– Em suas respectivas casas legislativas, eles integram comissões que debatem temas específicos – economia, agricultura, segurança etc – e nas quais se discutem detalhadamente projetos de lei e emendas constitucionais;

– Podem criar Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) para investigar denúncias e suspeitas de irregularidades;

– Compete às duas casas legislativas fiscalizar as ações do Poder Executivo. O Senado pode processar o presidente e o vice-presidente da República nos crimes de responsabilidade. No entanto, somente a Câmara tem poderes para autorizar a instauração de um processo ou um pedido de impeachment, que primeiro deve ser aprovado no plenário da Câmara e, depois, votado pelos senadores;

– O Senado é a casa revisora, tendo a prerrogativa de avaliar e rever as propostas e projetos de lei que já tenham sido votados na Câmara;

– É de competência dos senadores avaliar a escolha de pessoas que irão ocupar cargos de ministros de tribunais superiores. A indicação dos nomes é feita pelo presidente da República;

– Em conjunto, deputados e senadores devem discutir o orçamento da União e, em suas respectivas casas legislativas, fiscalizar a aplicação adequada dos recursos públicos. Durante a discussão do orçamento, cada congressista pode apresentar emendas parlamentares, a fim de que parte da verba pública seja destinada à realização de obras em seus estados;

– Projetos de lei de iniciativa do Executivo primeiramente tramitam na Câmara e depois são apreciados pelo Senado. Também compete aos parlamentares dessas duas casas discutir e votar as medidas provisórias editadas pelo governo federal.
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