No Natal dos Pobres, a solidariedade acalenta os ‘irmãos da rua’

Luciney Martins/O SÃO PAULO

A Praça da Sé, no centro de São Paulo, foi transformada em um restaurante ao ar livre no domingo, 18, para a realização de mais uma edição do Natal dos Pobres. 

O evento, realizado desde 2015, consiste em uma ceia natalina para cerca de 2 mil pessoas em situação de rua ou em vulnerabilidade social. A iniciativa foi promovida pela comunidade Aliança de Misericórdia e outras organizações eclesiais ligadas ao Vicariato Episcopal para a Pastoral do Povo da Rua da Arquidiocese de São Paulo. Ao todo, cerca de 300 voluntários, entre leigos, consagrados e sacerdotes, participaram da ação. 

O Natal dos Pobres ocorreu no encerramento da 22ª edição da ação missionária Thalita Kum. Pelas ruas e praças do centro da capital paulista, missionários anunciam a alegria do nascimento de Jesus por meio de músicas, danças, teatro, pregações e abordagens individuais. 

A ceia foi antecedida por uma missa presidida pelo Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo Metropolitano de São Paulo, na Catedral da Sé, concelebrada por Dom Rogério Augusto das Neves, Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Sé, e por diversos padres. 

Também participaram da missa o prefeito da capital, Ricardo Nunes, e o secretário municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Carlos Bezerra. 

BOA-NOVA DA SALVAÇÃO 

Na homilia, Dom Odilo elogiou a iniciativa de anunciar com palavras e obras a Boa-Nova do Natal aos pobres, doentes, àqueles que estão sem esperança, abandonados, estendendo-lhes a mão e dizendo: “Deus pensa em você também… A salvação é também para você. Coragem!”. 

“Que Deus abençoe todos vocês que realizaram esta missão pelas ruas da cidade”, manifestou o Cardeal, salientando haver muitos que um dia estiveram em situação de rua ou de vulnerabilidade social e, hoje, com as vidas restauradas, colaboram para ajudar outros irmãos. “Que bom encontrar irmãos que ajudam, que estendem a mão, que dão coragem, esperança a quem está nas ruas, nas drogas e em outras situações de sofrimento. Que Deus os abençoe e recompense”, reforçou. 

Ao destacar que ainda há muito a ser feito pelo combate à pobreza na maior cidade do País, Dom Odilo enfatizou que deve haver um esforço conjunto, envolvendo o poder público, as organizações da sociedade e cada pessoa individualmente. “Que possamos encontrar soluções para essa situação tão séria em nossa cidade, com tantos recursos, mas que, ao mesmo tempo, enfrenta uma situação humana tão difícil de resolver”, disse. 

O prefeito de São Paulo agradeceu o trabalho realizado pela Aliança de Misericórdia e outras organizações católicas que somam esforços com o poder público nos desafios do combate à pobreza. “Se não fossem os trabalhos dessas entidades religiosas, nós não conseguiríamos ter avançado tanto”, afirmou. 

PROVIDÊNCIA 

Irmã Mary de Calcutá, consagrada da Aliança de Misericórdia e uma das organizadoras do evento, explicou ao O SÃO PAULO que foram preparadas 2 mil refeições e, na praça, foram disponibilizados lugares para 1,5 mil pessoas. 

Durante o dia, as pessoas em situação de rua tiveram à disposição um banheiro móvel com chuveiros, ofertado pelo projeto “Anjos das Ruas”, troca de roupa, corte de cabelo, manicure, assistência médica, entre outros serviços. 

Quando perguntada sobre como conseguem preparar tanta comida, Irmã Mary foi enfática na resposta: “Confiamos muito na providência de Deus. Logo que iniciamos a organização, é incrível como aparecem pessoas de todos os cantos querendo ajudar. São tantas doações que chegamos até a compartilhar com outros grupos”. 

Segundo a consagrada, todos os anos, o grupo vive uma verdadeira experiência da “multiplicação dos pães”. “É impressionante! Todos comem muito bem e ainda sobra para fazermos marmitas e distribuirmos em outros pontos da cidade, como, por exemplo, na região da Cracolândia”, contou. 

Padre Evandro Torlai, Vice-presidente da Aliança de Misericórdia, enfatizou que a proposta do Natal dos Pobres não consiste apenas em oferecer um prato de comida, mas, sim, uma experiência mais completa da celebração natalina para os mais necessitados, começando pelo anúncio do nascimento do Senhor, a celebração eucarística e a ceia. 

“Esses nossos irmãos já comem nas calçadas o ano todo. Então, queremos proporcionar o mínimo de dignidade para poderem se sentar à mesa, serem servidos por missionários, religiosos, leigos, que, muitas vezes, são de realidades socioeconômicas elevadas da cidade, que vêm servir os mais pobres com respeito e amor”, afirmou. 

Jerry Adriani Silva, 52, chegou de Goiânia (GO) há poucos dias com a esposa e os três filhos, de 2 a 6 anos. Após ficar desempregado, ele perdeu a moradia. Em São Paulo, conseguiram abrigo temporário em um hotel social fornecido pela Prefeitura. Silva continua procurando emprego na área de funilaria e pintura de automóveis. 

“Eu não pensava que, nas condições que estamos, teríamos como comemorar o Natal. Mas, felizmente, graças a esta ceia, o nosso Natal não passará em branco”, contou à reportagem, acrescentando que jamais imaginou passar por uma situação tão difícil com seus filhos pequenos. “Mas tenho esperança de que dias melhores virão”, completou. 

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