ACN: 62,5% da população mundial vive em países com violações à liberdade religiosa

Dado consta no Relatório da Liberdade Religiosa no Mundo, lançado na sexta-feira, 23, em evento em São Paulo, com a participação de lideranças religiosas, entre as quais o Cardeal Scherer, Arcebispo Metropolitano

A fundação pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN) lançou na manhã da sexta-feira, 23, o Relatório da Liberdade Religiosa no Mundo, um mapeamento feito em 196 países, no período de janeiro de 2021 a dezembro de 2022.

De acordo com o estudo, 4,9 bilhões de pessoas, cerca de 62% da população mundial, vivem em países com violações graves ou gravíssimas aos direitos humanos. Dos 196 países analisados, em 61 (cerca de 31%) o direito humano à liberdade de pensamento, consciência e religião é violado.

Além disso, em 49 países, a perseguição e assassinato dos cidadãos por motivos religiosos é feito pelo próprio governo.

A IMPUNIDADE IMPULSIONA AS VIOLAÇÕES

A ACN afirma que nos últimos dois anos, foi observado o aumento global do poder e do alcance de governos autoritários e líderes fundamentalistas que buscam exercer um poder ilimitado e têm ciúmes e medo da autoridade espiritual e da capacidade de mobilização das comunidades religiosas. E com isso aumenta a impunidade aos que praticam tais atos: em 36 dos países analisados, os agressores raramente ou nunca são processados pelos crimes.

A fundação pontifícia também destaca que o silêncio da comunidade internacional contribui com essa cultura de impunidade com regimes considerados estrategicamente importantes para o Ocidente, como China e Índia, que não têm sofrido sanções internacionais ou quaisquer outras consequências por suas violações do direito à liberdade religiosa.

A PREOCUPANTE REALIDADE AFRICANA

Como já verificado em relatórios anteriores, a África continua a ser o continente mais violento para a vivência da fé. Dos 28 países considerados mais perigosos do mundo para a liberdade religiosa, 13 estão no continente africano.

O aumento dos ataques jihadistas – ala radical do Islamismo – bem como a cooptação financeira que grandes corporações internacionais fazem à população e às autoridades de países africanos para explorar suas riquezas, são apontadas como causas principais para a perseguição às religiões.

No evento de lançamento do relatório, no auditório das Paulinas, na Vila Mariana, em São Paulo, Dom Luiz Fernando Lisboa, atualmente Bispo de Cachoeiro do Itapemirim (ES) e que por sete anos foi Bispo da Diocese de Pemba, em Moçambique, destacou que a perseguição por parte dos jihadistas ou por aqueles que não o são, mas que se passam por este grupo, tem motivações econômicas, com vistas à exploração de recursos naturais como gás, ouro e rubi, que são abundantes no continente africano.

LÍDERES RELIGIOSOS PEDEM RESPEITO ÀS DIVERSIDADES

Foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO

Ainda no evento do lançamento do relatório, quatro líderes religiosos foram convidados a falar sobre a temática.

O Sheikh Mohamad Al Bukai, da comunidade islâmica de São Paulo, destacou que o livro sagrado do Islamismo, Al Corão, tem entre seus princípios que Deus é o Senhor dos mundos e criou todos os seres humanos, e que todos são irmãos, devendo ser tratados de modo digno. Assim, quem em nome do Islã pratica atos violentos e de intolerância está em desacordo com o Al Corão.

Já o pastor Luterano Marcos Ebeling ressaltou que no Brasil o Estado é laico, havendo ampla garantia para as manifestações da multiplicidade religiosa, mas que têm surgido situações de tensão quando os que ocupam o poder utilizam a retórica do Estado laico para reforçar discursos progressistas ou conservadores, que por, vezes, redundam em casos de intolerância religiosa, algumas das quais externadas pelas redes sociais. Ele destacou que às religiões sempre cabe o papel de agir e propor a tolerância perante as diferenças e a busca permanente da paz.

A yalorixá Mãe Carmem de Oxum, liderança do Cadomblé, lamentou que ainda hoje aqueles que participam das religiões de matriz africana são alvos de preconceitos sutis – como perceber que alguém atravessou a rua ao se deparar com outro vestido com as roupas próprias dessa religião – ou ostensivos, que vão desde as agressões físicas até o ataque aos templos. “Nós, das religiões de matriz africana, queremos apenas ser respeitados como qualquer ser humano”, declarou.

A mesa-redonda foi concluída com a fala do Cardeal Odilo Pedro Scherer. O Arcebispo de São Paulo destacou que o verdadeiro Estado laico não interfere nas religiões e enfatizou que qualquer violação à liberdade religiosa acaba por repercutir nas liberdades civis, por isso este deve ser um tema de atenção de toda a sociedade. 

Dom Odilo apontou que sempre deve haver acolhida e defesa àqueles que sofrem perseguições religiosas. “Não podemos ser coniventes com a intolerância e devemos fomentar uma cultura de respeito à tolerância religiosa, respeitando a quem tem uma fé diferente da nossa. Essa luta é de todos”, enfatizou.

O Arcebispo de São Paulo comentou, ainda, que o Papa Francisco – a exemplo de seus antecessores – tem se preocupado com a temática da liberdade religiosa, ao lembrar que todos somos irmãos – como ressalta na Fratelli tutti – e que vivemos na mesma casa comum – como escreve na Laudato si’.

Por fim, Dom Odilo pediu a todas as pessoas de boa vontade que colaborem com os trabalhos da ACN. Anualmente, esta fundação pontifícia atende a mais de 5 mil pedidos de ajuda, em cerca de 140 países, incluindo iniciativas para a formação de seminaristas, impressão de bíblias e literatura religiosa; apoio a padres e religiosos em missões e situações críticas; construção e restauração de igrejas e demais instalações eclesiais; programas religiosos de comunicação; e ajuda a refugiados e vítimas de conflitos.

LEIA A REPORTAGEM COMPLETA NA PRÓXIMA EDIÇÃO DO O SÃO PAULO

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