Francisco manifestou satisfação por visitar a Bélgica, e disse que quando “se pensa neste País, evoca-se ao mesmo tempo algo pequeno e grande, um país ocidental e simultaneamente central, como se fosse o coração pulsante de um organismo imenso”. O Pontífice falou sobre os “dramáticos acontecimentos do abuso de menores, um flagelo que a Igreja está enfrentando com decisão e firmeza”.
O Papa Francisco encontrou-se com as autoridades, a sociedade civil e o Corpo diplomático, nesta sexta-feira, 27, no Castelo Real de Laeken, na Bélgica, segunda etapa de sua 46ª Viagem Apostólica Internacional.
Francisco manifestou satisfação por visitar a Bélgica, e disse que quando “se pensa neste País, evoca-se ao mesmo tempo algo pequeno e grande, um país ocidental e simultaneamente central, como se fosse o coração pulsante de um organismo imenso”.
“A Bélgica não é um Estado muito extenso, mas a sua história peculiar fez com que, imediatamente depois da Segunda Guerra Mundial, os povos europeus, cansados e exaustos, iniciando um sério caminho de pacificação, colaboração e integração, olhassem para ela como a sede natural das principais instituições europeias. Por se situar nos limites entre o mundo germânico e o mundo latino, fazendo fronteira com a França e a Alemanha, que mais encarnaram as antíteses nacionalistas da origem do conflito, surgiu como lugar ideal, quase uma síntese da Europa, de onde partir para a sua reconstrução, física, moral e espiritual”, frisou o Papa.
A Bélgica é uma ponte
“Poderia-se dizer que a Bélgica é uma ponte: entre o continente e as ilhas britânicas, entre as regiões germânicas e francófonas, entre o sul e o norte da Europa. Uma ponte para permitir a expansão da concórdia, fazendo retroceder os conflitos. Uma ponte onde cada um, com a sua língua, a sua mentalidade e as suas convicções, se encontra com o outro e escolhe a palavra, o diálogo e a partilha como meios de relação. Uma ponte, portanto, indispensável à construção da paz e ao repúdio da guerra.”
Segundo o Papa, a Europa precisa da Bélgica “para se lembrar da sua história, feita de povos e culturas, de catedrais e universidades, de conquistas do engenho humano, mas também de muitas guerras e de uma vontade de domínio que, por vezes, se converteu em colonialismo e exploração. A Europa precisa da Bélgica para prosseguir na via da paz e da fraternidade entre os povos que a compõem”.
“Na verdade, a concórdia e a paz não são uma conquista alcançada de uma vez por todas, mas antes uma tarefa e uma missão incessante a cultivar, a cuidar com tenacidade e paciência. Porque quando os seres humanos deixam de recordar o passado e ser educados por ele, esquecendo o sofrimento e os custos assustadores pagos pelas gerações anteriores, ficam com a desconcertante capacidade de voltar a cair mesmo depois de se terem finalmente reerguido.”
“A história, magistra vitae tantas vezes não escutada, da Bélgica convoca a Europa a retomar o seu caminho, a redescobrir o seu verdadeiro rosto, a investir de novo no futuro, abrindo-se à vida, à esperança, para vencer o inverno demográfico e o inferno da guerra”, disse ainda Francisco.
O abuso na Igreja é uma vergonha
A seguir, o Papa disse que “a Igreja Católica quer ser uma presença que, testemunhando a sua fé em Cristo Ressuscitado, oferece aos indivíduos, às famílias, às sociedades e às Nações uma esperança antiga e sempre nova”. A Igreja “anuncia uma Notícia que pode encher os corações de alegria e, com obras de caridade e inúmeros testemunhos de amor ao próximo, procura oferecer sinais concretos e provas do amor que a move. Entretanto, vive na realidade das culturas e das mentalidades de um determinado tempo, ajudando a plasmá-las ou, por vezes e de algum modo, ressentindo-se delas; porém, nem sempre compreende e vive a mensagem evangélica na sua pureza e plenitude”, acrescentando: “a Igreja vive nesta perene coexistência de luz e sombra, muitas vezes com frutos de grande generosidade e esplêndida dedicação, e outras vezes, infelizmente, com o aparecimento de dolorosos contra-testemunhos. Estou a pensar nos dramáticos acontecimentos do abuso de menores, um flagelo que a Igreja está enfrentando com decisão e firmeza, escutando e acompanhando as pessoas feridas e implementando em todo o mundo um programa capilar de prevenção”.
“Irmãos e irmãs, esta é uma vergonha! Uma vergonha que hoje todos nós devemos enfrentar, pedir perdão e resolver o problema: a vergonha do abuso, do abuso de menores. Pensamos na época dos santos inocentes e dizemos: ‘Oh! Que tragédia, o que fez o rei Herodes’, mas hoje na Igreja existe este crime e a Igreja deve se envergonhar e pedir perdão, e tentar resolver essa situação com humildade cristã, fazendo todos os esforços para que isso não aconteça mais.”
O Pontífice sublinhou a esse propósito, que alguém lhe diz que, “segundo as estatísticas, a grande maioria dos abusos ocorre na família ou no bairro ou no mundo do esporte, na escola”. “Apenas um abuso é suficiente para se envergonhar. Na Igreja, devemos pedir perdão por isso e que os outros peçam perdão por sua parte. Essa é a nossa vergonha e nossa humilhação”, observou Francisco.
As “adoçÕes forçadas” na Bélgica
Ainda sobre os abusos, o Papa recordou o problema das “adoções forçadas” que ocorreram “na Bélgica nos anos 50 e 70 do século passado”. “Nessas histórias espinhosas, o fruto amargo de um delito e de um crime misturava-se com o que, infelizmente, era o resultado de uma mentalidade prevalecente em todos os estratos da sociedade, de tal modo que aqueles que agiam de acordo com ela, em consciência, acreditavam fazer o bem, tanto à criança como à mãe”, disse ainda Francisco.
“Muitas vezes, a família e os outros agentes sociais, incluindo a Igreja, consideravam que, para eliminar o estigma negativo que, infelizmente, recaía sobre a mãe solteira naquela época, era preferível, para o bem de ambos, mãe e filho, que este último fosse adotado. Houve até casos em que não foi dada a possibilidade a algumas mulheres de escolher entre ficar com a criança ou dá-la para adoção. Como sucessor do Apóstolo Pedro, peço ao Senhor que a Igreja encontre sempre dentro de si a força para esclarecer e não se conformar com a cultura dominante, mesmo quando esta – manipulando-os – usa valores derivados do Evangelho, para deles tirar conclusões indevidas, com consequências pesadas de sofrimento e exclusão”, sublinhou Francisco.
O Papa disse ainda que reza “para que os dirigentes das Nações, ao olharem para a Bélgica e para a sua história, saibam aprender com ela e poupem assim os seus povos de desgraças e lutos sem fim”. “Rezo para que os governantes saibam assumir a responsabilidade, o risco e a honra da paz e saibam afastar o perigo, a ignomínia e o absurdo da guerra. Rezo para que temam o julgamento da consciência, da história e de Deus, e convertam os seus olhos e corações, colocando sempre em primeiro lugar o bem comum”, concluiu o Papa.
Fonte: Vatican News