Por ocasião da Semana da Família, o jornal O SÃO PAULO fez uma seleção de pronunciamentos e escritos do Papa sobre o tema
Os grandes pastores da Igreja sempre souberam confirmar os fiéis na fé, recordando a doutrina e explicando-a nos diferentes tempos da história. Entre os grandes pastores do conturbado século XX, não é possível esquecer-se de São João Paulo II, canonizado apenas nove anos depois de sua morte. O papa polonês foi sem dúvida uma das personalidades mais marcantes e influentes do final do segundo milênio. Com a coragem de um Apóstolo, ele alimentou a Igreja com a reta doutrina, abordando todos os temas que se mostraram mais desafiadores e necessitados de luz.
Entre os temas que receberam maior atenção, destaca-se a família. Eleito sucessor de Pedro em outubro de 1978, ele realizou, em 1981, um sínodo de bispos com o objetivo de “debruçar-se sobre as tarefas da família cristã no mundo contemporâneo”. Um dos frutos do Sínodo foi a exortação apostólica Familiaris Consortio; outro, foi a constituição do Pontifício Conselho para a Família. Além disso, ao longo de todo seu pontificado, São João Paulo II ensinou incansavelmente o significado e missão da família cristã.
Não à toa, por ocasião de sua canonização, o Papa Francisco disse que “João Paulo II fez-se tudo por todos. Nesse serviço ao povo de Deus, São João Paulo II foi o papa da família. Ele mesmo disse uma vez que assim gostaria de ser lembrado: como o papa da família. João Paulo II continua a inspirar-nos. Inspiram-nos as suas palavras, os seus escritos, os seus gestos e o seu estilo de serviço. Inspira-nos o seu sofrimento vivido com esperança heroica. Inspira-nos a sua entrega total a Cristo, Redentor do homem, e à Mãe de Deus”.
Portanto, em ocasião da Semana da Família, o jornal O SÃO PAULO apresenta uma seleção de pronunciamentos e escritos do Papa sobre o tema, para ajudar a compreender mais à fundo o significado e missão da família e encorajar todos a lutar por ela.
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A família no Projeto Divino
Em uma homilia, quando celebrava a Santa Missa pelas famílias em Quinxassa, Zaire, em 3 de maio de 1980, João Paulo II recordou que a família é reflexo da Santíssima Trindade:
Todos conhecem a célebre narrativa da Criação pela qual começa a Bíblia. Diz-se ali que Deus fez o homem à Sua semelhança, ao criar varão e mulher. Eis o que surpreende logo de início. A humanidade, para assemelhar-se a Deus, deve ser um casal de duas pessoas em movimento uma para a outra, duas pessoas que um amor perfeito reúne na unidade. Este movimento e este amor fá-las semelhantes a Deus, que é o próprio Amor, a Unidade absoluta das Três Pessoas. Jamais se cantou de maneira tão bela o esplendor do amor humano como nas primeiras páginas da Bíblia: “E Adão disse: Eis aqui agora o osso dos meus ossos e a carne da minha carne… Por isso deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e se unirá à sua mulher, e serão os dois numa só carne” (Gen 2; 23-24). Parafraseando o Papa São Leão, não posso deixar de dizer-vos: “Cônjuges cristãos, reconhecei a vossa eminente dignidade! ”
Anos depois, por ocasião do Jubileu das famílias, em 15 de outubro de 2000, o Papa falou:
Esta bênção originária está relacionada com um desígnio de Deus, que a sua palavra acaba de nos recordar: “Não é bom que o homem esteja sozinho: vou fazer-lhe uma auxiliar que lhe seja semelhante” (Gn 2, 18). É desta forma que, no Livro da Gênesis, o autor sagrado delineia a existência fundamental sobre a qual se baseia a união esponsal de um homem e de uma mulher, e com ela a vida da família que dela tem origem. Trata-se duma existência de comunhão. O ser humano não é feito para a solidão, traz em si uma vocação relacional, radicada na sua própria natureza espiritual. Em virtude desta vocação, ele cresce na medida em que se relaciona com o próximo, encontrando-se plenamente “no dom sincero de si mesmo” (Gaudium et spes, 24). Para o ser humano não são suficientes relações meramente funcionais. Ele precisa de relações interpessoais ricas de interioridade, gratuidade e oblação.
Uma só carne! Como não captar o vigor desta expressão? A palavra bíblica “carne” não recorda apenas o aspecto físico do homem, mas a sua identidade global de espírito e de corpo. O que os esposos realizam não é só um encontro corpóreo, mas uma verdadeira união das suas pessoas.
Já na carta às famílias Gratissimam sane, publicada em 2 de fevereiro de 1994, por ocasião do ano internacional da família, promovido pela Organização das Nações Unidas, o Papa, após afirmar que o homem caminha por várias estradas, escreveu:
Dentre essas numerosas estradas, a primeira e a mais importante é a família: uma via comum, mesmo se permanece particular, única e irrepetível, como irrepetível é cada homem; uma via da qual o ser humano não pode separar-se. Com efeito, normalmente ele vem ao mundo no seio de uma família, podendo-se dizer que a ela deve o próprio fato de existir como homem. Quando falta a família logo à chegada da pessoa ao mundo, acaba por criar-se uma inquietante e dolorosa carência que pesará depois sobre toda a vida.
Desafios da família contemporânea
São João Paulo II tinha clara consciência dos desafios enfrentados pela família no mundo contemporâneo. As novas condições de vida, bem como a ação deliberada de muitos grupos pela destruição da família, a colocaram no centro da batalha que a Igreja trava contra o demônio. Para o Papa, o futuro da Igreja e da humanidade dependem do resultado dessa batalha.
No início da exortação apostólica pós-sinodal Familiaris Consortio, escreveu:
A família nos tempos de hoje, tanto e talvez mais que outras instituições, tem sido posta em questão pelas amplas, profundas e rápidas transformações da sociedade e da cultura. Muitas famílias vivem esta situação na fidelidade àqueles valores que constituem o fundamento da instituição familiar. Outras, tornaram-se incertas e perdidas frente a seus deveres, ou, ainda mais, duvidosas e quase esquecidas do significado último e da verdade da vida conjugal e familiar. Outras, por fim, estão impedidas por variadas situações de injustiça de realizarem os seus direitos fundamentais.
Consciente de que o matrimônio e a família constituem um dos bens mais preciosos da humanidade, a Igreja quer fazer chegar a sua voz e oferecer a sua ajuda a quem, conhecendo já o valor do matrimônio e da família, procura vivê-lo fielmente, a quem, incerto e ansioso, anda à procura da verdade e a quem está impedido de viver livremente o próprio projeto familiar. Sustentando os primeiros, iluminando os segundos e ajudando os outros, a Igreja oferece o seu serviço a cada homem interessado nos caminhos do matrimônio e da família.
Pouco antes, na oração pelo Sínodo dos Bispos feita em 15 de agosto de 1980, João Paulo II havia dito:
A família é “o fundamento da sociedade” (Const. Gaudium et Spes, n. 52); e ainda, que dado ser ela ao mesmo tempo uma “igreja doméstica”, garante a existência e o desenvolvimento de toda a Igreja: na família, de fato, “nascem novos cidadãos da sociedade humana, os quais se tornam filhos de Deus pela graça do Espírito Santo no Batismo, para perpetuar através dos tempos o Povo de Deus” (Const. Lumen Gentium, n. 11).
Esta imagem divina da família, renovada e santificada por Jesus Cristo, na nossa época acha-se muitas vezes empobrecida, obscurecida e talvez mesmo profanada (cf. Const. Gaudium et Spes, n. 47). É necessário, pois, refletir novamente nas palavras de Jesus Cristo: “Ao princípio não foi assim” (Mt 19, 8).
Sim! É preciso que as famílias do nosso tempo recobrem seus valores! É preciso que elas sigam Cristo!
Luta que vale a pena
Na missa em Quinxassa, o Papa procurou recordar que o máximo progresso humano se dá no amor abnegado, e não em carreiras profissionais ou outras coisas:
Se o matrimônio cristão é comparável a uma montanha muito alta que põe os esposos na proximidade imediata de Deus, é preciso então reconhecer que a sua ascensão exige muito tempo e muita fadiga. Mas será esta uma razão para suprimir ou para abaixar um tal cimo? Não é através de ascensões morais e espirituais que a pessoa humana se realiza em plenitude e domina o universo, muito mais do que por meio dos recordes técnicos e mesmo espaciais, por muito admiráveis que sejam?
União, união, união… construída dia após dia
Ainda na mesma homilia,em Quinxassa:
É, portanto, conformando-se a Cristo, que se entregou por amor à Sua Igreja, que os esposos chegam, dia após dia, ao amor de que nos fala o Evangelho, “amai-vos como Eu vos amei”, e, mais precisamente, à perfeição da união indissolúvel em todos os níveis. Os cônjuges cristãos prometeram reciprocamente pôr em comunhão tudo o que são, e tudo o que têm. É o contrato mais audacioso que existe e, ao mesmo tempo, o mais maravilhoso! A união dos seus corpos, querida pelo próprio Deus, como expressão da comunhão ainda mais profunda dos seus espíritos e dos seus corações, realizada tanto com respeito quanto com ternura, renova o dinamismo e o vigor do seu compromisso solene, do seu primeiro “sim”. A união do caráter: amar um ser é amá-lo tal como ele é, amá-lo ao ponto de cultivar em si o antídoto das suas fraquezas ou dos seus defeitos, como por exemplo a calma e a paciência se o outro falta notoriamente nestes pontos. A união dos corações! Os matizes que diferenciam o amor do homem daquele da mulher são inúmeros. Cada um dos dois não pode exigir ser amado como ele ama. É muito unificador o pôr em comum as alegrias e, mais ainda, os sofrimentos do coração. Mas é sobretudo no amor comum dos filhos que a união dos corações se fortalece. A união das inteligências e das vontades! Os esposos são também duas forças diversificadas, mas conjugadas para o serviço recíproco que prestam, para o serviço ao seu lar, ao meio social, ao serviço de Deus. O acordo essencial deve manifestar-se na determinação e no encalço de objetivos comuns. O cônjuge mais enérgico deve amparar a vontade do outro, por vezes supri-la, sendo para o outro, sensata e educadamente, a alavanca.
A necessidade da oração e a força do sacramento
Em missa celebrada em Cebu, Filipinas, dia 19 de fevereiro de 1981, o Papa deu o único caminho possível:
A todos vós, casais cristãos – esposos e pais – dirijo este convite: caminhai com Cristo! É Ele que vos revela a dignidade do pacto solene que estipulastes; é Ele quem confere um valor imenso ao vosso amor conjugal; e é Ele, Cristo Jesus, que pode fazer infinitamente mais do que tudo quanto podemos pedir ou entender (cf. Ef 3, 20).
Na carta Gratissimam sane lê-se:
A oração faz com que o Filho de Deus habite no meio de nós: «Onde estiverem reunidos, em meu Nome, dois ou três, Eu estou no meio deles» (Mt 18, 20). Esta Carta às Famílias quer ser sobretudo uma súplica dirigida a Cristo, para que permaneça em cada família humana; uma súplica feita a Ele, através da família restrita dos pais e filhos, para que habite na grande família das nações, a fim de que todos, juntos com Ele, possamos dizer com verdade: «Pai nosso»! É preciso que a oração se torne o elemento predominante do Ano da Família na Igreja: oração da família, oração pela família, oração com a família. Significativo é que, precisamente na oração e pela oração, o homem descubra, de modo tão simples e ao mesmo tempo profundo, a sua típica subjetividade: na oração, o «eu» humano percebe mais facilmente a profundidade do seu ser pessoa. Isto vale também para a família, que não é apenas a «célula» fundamental da sociedade, mas possui mesmo uma própria e peculiar subjetividade. Esta obtém a sua primeira e fundamental confirmação, e consolida-se, quando os membros da família se encontram na invocação comum: «Pai nosso». A oração reforça a estabilidade e a solidez espiritual da família, ajudando a fazer com que esta participe da «fortaleza» de Deus.
Assim o Papa confirmava aquela sabedoria que sempre acompanhou os cristãos: “família que reza unida, permanece unida”. Na já mencionada homilia em Quinxassa, porém, o Santo Padre convidou a não abandonar outro momento de oração, ainda mais fundamental:
Por fim, a união das almas, estas mesmas unidas a Deus! Cada um dos cônjuges deve reservar-se momentos de solidão com Deus; de “coração a coração”, nos quais o cônjuge não é a primeira preocupação. Esta vida pessoal indispensável da alma com Deus está longe de excluir o pôr em comum toda a vida conjugal e familiar. Pelo contrário, ela estimula os cônjuges cristãos a procurarem Deus juntos, a descobrirem juntos a Sua vontade e a cumpri-la concretamente com as luzes e as energias hauridas no próprio Deus.
Com isso, João Paulo II recordava uma verdade um tanto óbvia, mas tão facilmente ignorada ou esquecida por nós: esposo, esposa ou filhos, ninguém pode preencher o espaço vazio que existe dentro de cada pessoa, somente Deus pode fazê-lo. A família é sempre um auxílio e um caminho para o encontro com Cristo. E isso não leva a instrumentalizar ninguém, muito pelo contrário, pois o cristão descobre o próprio Cristo em cada um de seus familiares, em especial em seu esposo ou esposa.
Ao lado da oração, o Papa sempre reforçou a importância da graça do sacramento, auxílio real e eficaz. No jubileu das famílias, em 2000, falou:
Sem dúvida, existem dificuldades. Mas Jesus não deixou de fornecer aos esposos os meios da graça adequados para as vencer. Por vontade sua, o matrimônio adquiriu, nos batizados, o valor e a força de um sinal sacramental, que consolida a sua índole e as prerrogativas.
E na homilia em Quinxassa:
Que dignidade e que responsabilidade! Sim, este sacramento é grande! E que os esposos tenham confiança: a sua fé garante-lhes que recebem, com este sacramento, a força de Deus, uma graça que os acompanhará durante toda a sua vida. Que eles não deixem nunca de recorrer a esta fonte que jorra e que está neles!
A verdadeira sabedoria
A verdadeira sabedoria é aquela que, em vez de impressionar ou seduzir com aparências, conduz verdadeiramente à felicidade. O Santo Padre gritou ao mundo: “não tenham medo”, porque só o amor vale a pena. A homens e mulheres, solteiros e casados, falou: coragem, vale a pena lutar pelo amor conjugal! Na missa pelas famílias cristãs, em 1º de fevereiro de 1990, em Djamena, Chade, João Paulo II ensinou:
“E a paz de Cristo reine nos vossos corações porque a ela fostes chamados em um só corpo” (Cl 3, 15). Não deveis temer as exigências do vosso empenho recíproco, porque são as exigências de um amor que Deus pôs nos vossos corações e que Jesus fortifica com sua presença de paz. Permanecei próximos dele: “a palavra de Cristo habite em vós abundantemente”. A sua palavra é uma palavra de amor para guiar o vosso amor. Prendei sua palavra de verdade para fazer dela a vossa palavra, para pôr em comum a sua luz: “instruí-vos e aconselhai-vos com toda sabedoria” (Cl 3, 16). A verdadeira sabedoria é aquela do Criador que fez o homem e a mulher a sua semelhança. A verdadeira sabedoria está ainda na sua palavra: “o homem abandonará seu pai e sua mãe e se unirá a sua mulher e os dois serão uma só carne” (Gn 2, 24). A verdadeira sabedoria é aquela do Redentor: ele fundou o mandamento do amor sobre o amor divino que o conduziu a doar sua vida por nós: “amai-vos uns aos outros, como eu vos amei” (Jo 15, 12).
Caros amigos, alguns sem dúvida pensam que seja muito audaz para um homem e uma mulher empenhar-se para a vida em um caminho de uma fidelidade tão pura quanto a própria fidelidade de Deus. As circunstâncias difíceis atravessadas pelo vosso povo provocaram algumas perturbações. Tradições familiares foram destruídas pelas mudanças de residência ou do modo de viver. Novas tentações aparecem e a estabilidade do casal e da família é golpeada. Entendo essas dificuldades e sofrimentos que comportam. Mas não deveis renunciar à grandeza e à beleza do matrimônio. Com São Paulo, vos digo: “suportai-vos uns aos outros” (Cl 3, 13). Não se trata somente de ser pacientes, se trata de amar a tal ponto o outro de ajuda-lo, de sustenta-lo. No matrimônio, não deixareis de descobrir as qualidades e os defeitos do vosso cônjuge, o ajudareis a aumentar as primeiras e a diminuir os outros. E depois: “perdoai-vos uns aos outros, se alguém tiver do que se lamentar em relação aos outros. Como o Senhor vos perdoou, assim fazei também vós”. Tenhais tanto amor a ponto de reconciliar-vos se uma crise ameaça a vossa união. Porque destruir a vossa recíproca fidelidade é romper também com Deus que é sempre fiel, que não deixa nunca de amar. Vivei na confiança um com o outro. Dia após dia, lançai lenha no fogo do vosso amor, através dos gestos cotidianos da vida comum. A graça do sacramento do matrimônio não vos faltará.
A família no mistério da Encarnação
Na carta às famílias Gratissimam sane João Paulo II recordou o papel da família no mistério da Encarnação:
O Filho unigênito, consubstancial ao Pai, «Deus de Deus, Luz da Luz», entrou na história dos homens através da família: «Pela sua encarnação, Ele, o Filho de Deus, uniu-Se de certo modo a cada homem. Trabalhou com mãos humanas, (…) amou com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, tornou-Se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no pecado». Se é certo que Cristo «revela plenamente o homem a si mesmo», fá-lo a começar da família onde Ele escolheu nascer e crescer. Sabe-se que o Redentor passou grande parte da sua vida no recanto escondido de Nazaré, «submisso» (Lc 2, 51) como «filho do homem» a Maria, sua Mãe, e a José, o carpinteiro. Esta sua «obediência» filial não é já a primeira manifestação daquela obediência ao Pai «até à morte» (Fil 2, 8), por meio da qual redimiu o mundo?
Vínculo com a Eucaristia
Em missa no Rio de Janeiro, no dia 1º de julho de 1980, falou do vínculo entre família e Eucaristia:
A Eucaristia é uma reunião de família, da grande família dos cristãos. O Senhor Jesus quis instituir este grande sacramento por ocasião de um importante encontro familiar: a Ceia pascal e, naquela ocasião, sua família foram os Doze, que com Ele viviam há três anos. Por muito tempo, nos inícios da Igreja, era em casas de família que outras famílias se reuniam para a “fração do pão”. Cada altar será sempre uma mesa, em torno da qual se congrega mais ou menos numerosa uma família de irmãos. A Eucaristia ao mesmo tempo reúne esta família, manifesta-a aos olhos de todos, estreita os laços que unem uns aos outros os seus membros.
A Sagrada Família, modelo das famílias
O Santo Padre concluiu a carta Gratissimam sane com uma oração:
A Sagrada Família, ícone e modelo de cada família humana, ajude cada um a caminhar no espírito de Nazaré; ajude cada núcleo familiar a aprofundar a própria missão civil e eclesial, mediante a escuta da Palavra de Deus, a oração e a partilha fraterna de vida! Maria, Mãe do belo amor, e José, Guarda do Redentor, nos acompanhem a todos com a sua incessante proteção!
Defesa da família contra todas as tentativas de deformação
Na já mencionada homilia em Cebu:
Com legítimo orgulho podemos afirmar que o ensinamento hodierno da Igreja sobre o matrimônio e a família foi o seu ensinamento constante em fidelidade a Cristo. A Igreja católica sempre ensinou – e repito-o aqui com a convicção que me vem da minha missão de pastor supremo e mestre – que o matrimônio foi estabelecido por Deus; que o matrimônio é um contrato de amor entre um homem e uma mulher; que o laço que une mulher e marido é indissolúvel por vontade de Deus; que o matrimônio entre os cristãos é um sacramento que é o símbolo da união de Cristo com a sua Igreja; e que o matrimônio deve estar aberto à transmissão da vida humana.
É um amor santo, e representa sacramentalmente a união de amor entre Cristo e a Igreja, como São Paulo escreveu aos Efésios: “É grande este mistério; digo-o, porém, em relação a Cristo e à Igreja! ” (Ef 5, 32). Por estes motivos, a Igreja não modificará nem mudará nunca o próprio ensinamento sobre o matrimônio e a família. Por estes motivos, a Igreja condena todo o atentado, como a poligamia, que possa destruir a unidade do matrimônio, e cada atentado, como o divórcio, que pretenda destruir o vínculo do matrimônio. Por estes motivos, a Igreja afirma também com clareza que o matrimônio deve estar aberto à transmissão da vida humana. Deus quis que a união de amor entre marido e mulher fosse origem de novas vidas. Ele deseja partilhar, como fez, o Seu poder criativo com os maridos e as mulheres, confiando-lhes o poder de procriar. Deus deseja que este tremendo poder de procriar uma nova vida humana seja aceito pelo casal, livremente e com amor, no momento em que escolhe livremente unir-se em matrimônio.
Fermento da sociedade e manifestação de Deus no mundo
Em Quinxassa, o Papa contrapôs a elevada missão e os grandes desafios da família:
O matrimônio cristão é também chamado a ser fermento de progresso moral para a sociedade. O realismo leva-nos a reconhecer as ameaças que pesam sobre a família como instituição natural e cristã, na África como em outros lugares; devido a certos costumes e também às mudanças culturais que se generalizam. Não vos parece que se pode comparar a família moderna a uma piroga que vaga no mar e prossegue o seu curso por entre águas agitadas e obstáculos? Sabeis, tanto como eu, o quanto as noções de fidelidade e de indissolubilidade são insidiadas pela opinião pública.
Fermento da sociedade, a família cristã é ainda uma presença, uma epifania de Deus no mundo. A constituição pastoral Gaudium et spes (n.48) contém páginas luminosas sobre a irradiação desta “comunidade profunda de vida e de amor”.
E na já mencionada homilia em Djamena, o Santo Padre exortou à coragem, própria da caridade, de acolher aqueles que carecem de família:
Que a vossa generosidade e o vosso espírito de fraterna comunhão não parem na porta de vosso lar! Se vos foi dado viver felizes em família, saibam acolher aqueles que são sós, pobres, estrangeiros e também os homens e as mulheres com o coração ferido por cruéis abandonos.
Oração pelas famílias
Concluímos com a oração feita pelo Santo Padre por ocasião do Sínodo dos Bispos sobre a família, que pode ser encontrada em seu pronunciamento de 15 de agosto de 1980, citado acima:
Ó Deus, do qual provém toda a paternidade, nos céus como na terra, Vós, Pai, que sois Amor e Vida, pelo Vosso Filho Jesus Cristo, “nascido de uma Mulher”, e pelo Espírito Santo, fonte de caridade divina, fazei que, na terra inteira, cada família humana se torne um verdadeiro santuário da vida e do amor, para as gerações que incessantemente se renovam.
Fazei que a Vossa graça oriente sempre os pensamentos e as ações dos esposos para o maior bem das suas famílias, de todas as famílias do mundo.
Fazei que as novas gerações encontrem na família um apoio sólido, que as torne sempre mais humanas e as faça crescer na verdade e no amor.
Fazei que o amor, consolidado pela graça do sacramento do Matrimônio, seja sempre mais forte do que todas as fraquezas, mais forte do que todas as crises, que, por vezes, se verificam nas nossas famílias.
Fazei, enfim — nós vo-lo pedimos — por intercessão da Sagrada Família de Nazaré, que em todas as nações da terra a Igreja possa realizar com fruto a sua missão, na família e pela família.
Vós, ó Pai, que sois a Vida, a Verdade e o Amor, na unidade do Filho e do Espírito Santo. Amém!