Pandemia impacta os transplantes de órgãos e doações de medula óssea

Comparação entre os primeiros semestre de 2019 e 2020 mostra diminuição de 32% no total de transplantes e 34% no aumento de mortes

Santa Casa de Formiga/Divulgação/Arquivo

O Brasil registrou uma queda de 61% dos transplantes de órgãos e tecidos, entre abril e junho deste ano, em comparação com o início do ano. Os dados divulgados pela Associação Brasileira de Transplantes (ABTO) evidenciaram que além do país realizar menos da metade dos procedimentos previstos, as mortes de pacientes cadastrados na fila de espera entre os dois períodos cresceram 44,5% em todo país. Se comparados o primeiro semestre de 2020 e o de 2019, a diminuição no total de transplante foi de 32%, e o aumento de mortes foi de 34%.

O número de doadores efetivos – aqueles cujos exames detectam a morte encefálica, a família autorizou a doação e os órgãos são viáveis – também teve uma relevante baixa. O indicador que atualmente é de 15,8 doadores Por Milhão de População (PMP) é 6,5%, menos que a marca de junho de 2019, que era de 16,9 doadores PMP.

A taxa ideal segundo a ABTO é de 20 doadores PMP e até teve perto de ser alcançada no primeiro trimestre quando o país teve 18,4 doadores PMP.

O grande motivo da queda nos números é a pandemia do novo coronavírus e esses números já eram previstos, conforme alertou o médico José Huygens Garcia, presidente da ABTO, em entrevista ao O SÃO PAULO realizada em 19 de abril.

“A partir da chegada do vírus no Brasil, em março, houve uma diminuição muito grande na doação de órgãos, eu diria que em cerca de 70%. Certamente, muitos pacientes vão falecer na fila de espera, porque os transplantes diminuirão muito”, afirmou na ocasião.

PRINCIPAIS MOTIVOS

Senado Federal/Agência de notícias do Paraná

Com a expansão do novo coronavírus pelo Brasil, mais leitos de UTI estão sendo destinados para pacientes com a COVID-19, o que representa um dos complicadores para a obtenção de órgãos para doação. Mesmo com os índices de ocupação de leitos regredindo gradativamente em muitos estados, segundo o Ministério da Saúde, as porcentagens de ocupação já foram bem altas.

“Um médico não pode aceitar o órgão de um doador que teve uma morte por acidente vascular cerebral e que esteve na mesma UTI onde havia pacientes com a COVID-19, pois há chance de que o doador tenha tido contato com o vírus”, detalhou Garcia na já referida entrevista.

Em muitos dos casos, o doador e a pessoa que necessita do órgão não estão no mesmo estado. “Às vezes, até existe o órgão, mas não se consegue mais transportá-lo em tempo hábil. Para alguns órgãos, este tempo é muito curto. O do coração, por exemplo, é de até quaro horas. O de um fígado, de até dez horas. O rim pode ser até 24 horas, por isso até que este é o órgão que mais viaja de um estado para outro”, completou Garcia

MEDULA ÓSSEA

Neste ano, foram cadastrados 136.754 novos doadores de medula óssea, totalizando 5.212.391 doadores cadastrados no sistema.

Atualmente há 850 pacientes na fila de espera para o transplante de medula óssea com a doação de não aparentados, ou seja, aquelas em que o doador não tem nenhum grau de parentesco com o receptor.

Para chamar atenção sobre a importância da doação de medula óssea e de outros órgãos, o mês de setembro é destacado com a cor verde e por meio da campanha Setembro Verde são realizadas ações e eventos para esclarecimento e conscientização da população sobre o impacto da doação como um ato de amor ao próximo e na vida de quem aguarda na fila por um transplante.

De acordo com o Ministério da Saúde, as doações e transplantes de medula óssea não foram interrompidos por causa da pandemia de COVID-19, mas estão sendo aplicadas algumas restrições de segurança, descritas em notas técnicas publicadas no portal da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Para ser doador de medula é preciso ter entre 18 e 55 anos, estar em bom estado geral de saúde, não ter doença infecciosa ou incapacitante, não ter câncer, doenças no sangue ou do sistema imunológico. Algumas complicações de saúde não são impeditivas para doação, sendo analisado caso a caso.

QUEM RECEBE A DOAÇÃO

Para receber a doação é preciso fazer inscrição e entrar em uma fila no Registro de Receptores de Medula Óssea (Rereme) do Instituto Nacional do Câncer (Inca), com autorização de médico avalizado pelo Ministério da Saúde.

Agência Brasil

Assim que o paciente entra no Rereme, ocorre a primeira tentativa de encontrar um doador. A partir disso, o próprio sistema refaz a busca todos os dias e um resultado preliminar aponta uma lista de possíveis doadores compatíveis.

A busca também é feita na Rede BrasilCord, que contém os dados de cordões umbilicais armazenados nos Bancos Públicos de Sangue de Cordão Umbilical e Placentário. Caso não seja encontrado um doador brasileiro, a equipe de registro faz a busca internacional simultaneamente.

Os critérios de prioridade na lista são definidos de acordo com compatibilidade, gravidade, idade, tempo de espera, disponibilidade de doadores e disponibilidade de leitos. Para que seja feito um transplante de medula é necessário a total compatibilidade entre doador e receptor, segundo o Ministério da Saúde.

OS IMPACTOS DA PANDEMIA NOS TRANSPLANTES DE ÓRGÃOS

– Se mantida a tendência de queda atual, serão realizados 20,5% a menos de transplantes de coração, fígado, pâncreas, pulmão, rim, córnea e medula em comparação a 2019

– No final de junho, mais de 40 mil pessoas aguardavam pelo transplante de um órgão ou tecido no Brasil, 3 mil a mais que em 2019.

– O número de doações de medula óssea caiu 30% de janeiro a julho, em relação ao mesmo período do ano passado,

– Em São Paulo, a queda no número de doadores foi de 33% na primeira quinzena de junho e de 67% no número de cirurgias.

– Maiores quedas no números de transplantes de órgãos em SP: rim vivo (-93%), córnea (-86%); fígado vivo (-33%)

Fontes: ABTO, Redome e Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo

(Com informações de Folha de São Paulo, G1 e Agência Brasil)

*Texto publicado sob a supervisão de Daniel Gomes (redator-chefe)

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