Somente em 2024, mais de 40,85 milhões de brasileiros perderam dinheiro devido a crimes on-line

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Talvez você tenha ouvido uma história parecida com a relatada a seguir ou até sido vítima de algo similar: o telefone toca e do outro lado da linha alguém diz que fez uma transferência financeira por engano, via PIX, para sua conta. Pede, então, que seja devolvido o dinheiro. O golpista chega até a enviar o comprovante da operação financeira; e há ainda aqueles que realmente realizam a operação de depósito, mas usando um cheque sem fundo ou um boleto.
A cada dia crescem os relatos dessa modalidade de golpe digital, o chamado PIX reverso, que se concretiza quando a vítima faz um depósito para a conta que o golpista indicar.
Uma pesquisa realizada pelo Instituto DataSenado revelou que 24% dos brasileiros foram vítimas de algum crime digital em 2024. Os dados, divulgados em outubro do ano passado, mostram que mais de 40,85 milhões de pessoas perderam dinheiro ao cair em golpes de criminosos que atuam exclusivamente no ambiente digital.
O estudo aponta que o estado com o maior número de ocorrências é São Paulo, com 30% dos casos, seguido pelo Mato Grosso, com 28%. A maioria das vítimas dos crimes cibernéticos, 51%, possui renda de até dois salários mínimos.
“Atualmente, os golpistas utilizam a engenharia social, estudam antecipadamente as vítimas para aplicar golpes cada vez mais sofisticados. Isso ocorre porque, à medida que o público fica mais informado, os golpistas percebem que precisa haver uma certa sofisticação do golpe para que não se torne comum”, explica, ao O SÃO PAULO, o advogado Kevin Santos, especializado em Direito Digital.
O advogado recomenda que, ao receber esse tipo de pedido, a pessoa verifique seu extrato bancário para confirmar a origem do valor e se o pagamento realmente foi realizado.

VARIEDADE DE GOLPES
Os tipos de crimes digitais mais comuns são o furto de identidade, quando o golpista se passa por uma pessoa para conseguir vantagens como o depósito de valores financeiros; a antecipação de recursos, que ocorre quando o criminoso induz o fornecimento de informações confidenciais ou de adiantamento de pagamentos.
Existe também o phishing, prática em que o golpista obtém dados pessoais e financeiros a partir de técnicas de engenharia social. Essa prática desencadeia outros crimes como a falsificação de documento, abertura de contas bancárias, movimentação de valores financeiros em contas, entre outros.
Outro golpe comum é o da falsa pontuação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Nele, a vítima recebe uma notificação por e-mail ou SMS, informando sobre uma possível suspensão da CNH, acompanhada de um link para o pagamento das multas. O Detran, porém, só faz esse tipo de notificação por vias oficiais, como os Correios e o Diário Oficial; trata-se, portanto, de um golpe.
“O universo da criminologia migrou para o ambiente digital, pois as pessoas estão cada vez mais conectadas, tornando-se mais suscetíveis a esses crimes”, comentou Kevin Santos.

JOVENS SÃO OS MAIS SUCETÍVEIS
O levantamento do Instituto DataSenado indica que os brasileiros entre 16 e 29 anos são os mais suscetíveis a estes golpes, 27% do total das ocorrências. Para o advogado Kevin Santos, isso se deve ao fato de que as pessoas nesta faixa etária cresceram em um ambiente digital e, com o tempo, foram mais expostas a golpes, principalmente os relacionados a falsos investimentos.
O advogado destaca que esse grupo tende a confiar excessivamente na tecnologia, acreditando conhecer bem o ambiente digital, e, assim, nem sempre adota as devidas medidas de segurança.
“Outro fator relevante é a pressa e o imediatismo: a pessoa recebe uma oferta e já clica, sem analisar adequadamente o que está lendo”, acrescenta o especialista.

COMO SE PREVENIR?
Para evitar cair em golpes digitais, Kevin Santos aconselha que as pessoas adotem algumas precauções:
1º Sempre desconfiar de produtos oferecidos por preços muito abaixo do mercado ou de investimentos com promessas de retornos excessivos;
2º Verificar as fontes antes de fornecer dados pessoais ou realizar pagamentos;
3º Nunca clicar em links suspeitos;
4º Jamais fornecer as próprias senhas.
Outra recomendação é adicionar camadas extras de segurança, como a autenticação em duas etapas em aplicativos de mensagens, bancos e redes sociais.
Também é importante pesquisar sobre os golpes mais comuns e compartilhar essas informações com familiares e amigos, especialmente os mais velhos.

O QUE FAZER SE CAIR EM UM GOLPE?
Quando a pessoa perceber que foi vítima de um golpe financeiro, as primeiras coisas a serem feitas são registrar um boletim de ocorrência e notificar a instituição financeira. Em casos mais simples, a situação pode ser resolvida administrativamente. Já as situações de golpes mais complexos exigem assistência jurídica e, possivelmente, medidas judiciais.
Kevin Santos explica que muitos tribunais no Brasil têm considerado que os bancos possuem responsabilidade em transações fraudulentas. “Se uma pessoa que nunca fez um PIX realiza uma transferência de R$ 30 mil e o banco não faz a checagem necessária, existe uma responsabilidade da instituição”, exemplificou.
No entanto, o advogado alerta que são raros os casos em que o valor é recuperado quando não há responsabilidade por parte da instituição financeira.

UMA ALIANÇA CONTRA OS GOLPES
Com o objetivo de melhorar e centralizar os canais de denúncia de crimes digitais, o Ministério da Justiça e Segurança Pública, em parceria com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), lançou, em 18 de fevereiro, a Aliança Nacional de Combate a Fraudes Bancárias e Digitais.
O grupo de trabalho atuará em três frentes. A primeira será promover campanhas de conscientização, prevenção e detecção de fraudes, além de destacar a importância de aprimorar a identificação digital para a abertura de contas on-line.
A segunda frente de ação se concentrará no aprimoramento dos critérios de tratamento de dados, com destaque para a Plataforma Tentáculos, criada pela Febraban e pela Polícia Federal em 2018, que já resultou em 200 operações, 445 mandados de busca e apreensão e 85 prisões.
Por fim, haverá um grupo dedicado ao atendimento das vítimas e à capacitação de agentes, centralizando os canais de denúncia e criando protocolos para a notificação de crimes cibernéticos nas delegacias.