No domingo, 17, acontecerá o VIII Dia Mundial dos Pobres, iniciativa criada em 2016 pelo Papa Francisco, celebrada pela primeira vez em novembro de 2017 e que vem sendo anualmente realizada no 33º Domingo do Tempo Comum. Este ano com o tema “A oração do pobre eleva-se até Deus” (Sr 21,5), o Pontífice motiva, de modo especial, que a data também seja oportunidade para que se reze em favor dos pobres e com eles.
Na mensagem para o I Dia Mundial dos Pobres, em 2017, o Papa exortou os cristãos a promoverem a cultura do encontro e pediu a todas as pessoas de boa vontade “que se abram à partilha com os pobres em todas as formas de solidariedade, como sinal concreto de fraternidade”. Também indicou que todos são chamados “a estender a mão aos pobres, a encontrá-los, fixá-los nos olhos, abraçá-los, para lhes fazer sentir o calor do amor que rompe o círculo da solidão”.
Na Arquidiocese de São Paulo, muitas são as ações das pastorais, movimentos e organizações católicas não só para atender pontualmente os mais pobres com doações de roupas e alimentos, mas também para abrir-lhes uma nova perspectiva de vida, como o jornal O SÃO PAULO mostra a seguir, a partir dos testemunhais dos que são beneficiados por algumas dessas iniciativas.
‘O Arsenal da Esperança abriu as portas para mim’
Fundado em 1996 pelo Sermig – Fraternidade da Esperança, no bairro da Mooca, o Arsenal da Esperança acolhe diariamente 1,2 mil homens que antes estavam em situação de rua por razões diversas, como a falta de trabalho, de moradia ou de suporte familiar.
Uma dessas pessoas é Irandir Marcos dos Santos, 49, que veio de Minas Gerais para São Paulo em 2023 e há seis meses está no Arsenal: “Eu cheguei aqui só de chinelo, com uma camisa e bermuda, todo sujo, irreconhecível. Estava desacreditado de tudo e a esperança já tinha ido embora”.
Ele conta que, desde então, foi aprimorando as habilidades de convivência social, tomou gosto pelos estudos e pela leitura – “Eu não gostava de leitura, de caneta, de escrever, mas hoje eu ando grudado com eles” – e começou a fazer cursos técnicos no Arsenal, como o de Jardinagem e Paisagismo, e até já trabalha prestando serviços nesta área.
“O preconceito com a gente que está na rua é muito grande. Você pode ser um bom profissional, mas, mesmo assim, é malvisto por estar na rua. Mas aqui foi diferente: o Arsenal da Esperança abriu as portas para mim”, ressalta.
‘A Missão Paz a encorajou a sonhar novamente’
Localizada na região do Glicério, a Missão Paz engloba a Casa do Migrante, o Centro Pastoral e de Mediação dos Migrantes, o Centro de Estudos Migratórios e a Igreja Nossa Senhora da Paz. Lá, os imigrantes encontram acolhida, apoio para regularizar a documentação no Brasil, aprendizagem do idioma, suporte para inserção profissional, atendimento médico e orientação jurídica.
Esse suporte foi fundamental para a filipina Jona Acosta. Na década passada, ela deixou o país natal para trabalhar em Cingapura, mas se deparou com condições de trabalho análogas à escravidão. Decidiu, então, mudar-se para o Brasil. Em São Paulo, arrumou um emprego de babá, mas a rotina era ininterrupta e os patrões diziam que caso deixasse o trabalho não conseguiria sobreviver na cidade. Quando conheceu a Missão Paz, Jona percebeu a exploração a que estava exposta e tomou coragem para buscar novos rumos. Além de arrumar outro emprego, ela formou um grupo “para ajudar outras mulheres das Filipinas que estão passando por situações de trabalho análogas à escravidão. Estamos no Brasil para trabalhar por nossas famílias”, declarou em um vídeo da Missão Paz.
‘O Amparo Maternal faz você se sentir segura, ver que não está sozinha’
Há 85 anos, a Associação Amparo Maternal acolhe e apoia gestantes e mães em situação de vulnerabilidade social, bem como seus bebês, para que possam viver esta fase com dignidade e segurança. Há, ainda, atendimentos voltados à reinserção social das acolhidas, como oficinas e cursos de capacitação profissional e suporte individualizado com assistentes sociais, psicólogas, orientadoras socioeducativas e pedagogas.
Jaqueline de Barros, 27, passou pelo Amparo em 2024, grávida do Luck. A gestação ocorreu após sofrer abuso sexual e mesmo com todas as dificuldades, ela disse sim à vida. “Sem meu filho, eu estaria perdida, sem família, sem um lugar para morar… então, hoje ele é meu tudo; eu olho para ele e agradeço. Eu o amo”.
Jaqueline deixou o centro de acolhida do Amparo em setembro, mas ainda retorna ao espaço, na Vila Clementino, na zona Sul, para o curso de auxiliar de cabelereiro: “O Amparo Maternal dá um abraço, faz você se sentir segura, ver que não está sozinha. Aqui, eles ajudam a conseguir um emprego, dão curso, fazem de tudo para você poder sair abraçada com seu filho e seguir sua vida”.
Missão Belém: a família para quem não tem família
Criada em 2005 pelo Padre Gianpietro Carraro e a Irmã Cacilda da Silva Leste, a Missão Belém atua para restaurar a dignidade de vida das pessoas que aceitam sair das ruas, em especial as viciadas em drogas. Desde 2010, também mantém ações missionárias no Haiti.
Willamis Ponciano da Silva, 42, é um dos que tiveram a vida restaurada. Em 2007, já viciado em drogas e álcool, ele estava em situação de rua no Capão Redondo, na zona Sul, quando aceitou o convite da Missão Belém.
“Eu fiquei muito tocado pela acolhida que recebi de pessoas que nem me conheciam. Elas me abraçaram, disseram ‘seja bem-vindo, irmão’, me ajudaram a tomar banho, a trocar de roupa e até a me alimentar, pois eu tremia demais por causa da bebida”, recorda.
Na Missão Belém, Willamis recebeu os sacramentos da iniciação à vida cristã, casou-se e hoje é pai de três filhos. Atualmente, ele é um dos que acolhem os que são resgatados das ruas: “Aqui é náufrago salvando náufrago, pois aquele que um dia esteve na rua, dentro da Cracolândia, chega à Missão, faz uma caminhada de fé e daqui um tempo já acolherá um irmão que chega. Por isso, dizemos que a Missão Belém é a família para quem não tem família”.
‘A Aliança de Misericórdia foi mais do que um teto’
Iniciada na cidade de São Paulo no ano 2000, a Aliança de Misericórdia realiza ações assistenciais, socioeducativas, educacionais, esportivas e culturais, visando à formação integral da pessoa em nível humano, espiritual e social. Renan Fabiano Gameiro, 21, encontrou um lar e uma nova chance de vida na Aliança de Misericórdia. Ele foi acolhido em 2012 na Casa Naim. No ano de 2016, teve continuidade no acolhimento dentro da instituição no serviço Casa Lar Aliança I, onde recebeu todo apoio e incentivo para a prática do caratê, esporte que transformou sua vida.Recebeu todo apoio, cuidado e descobriu a prática do caratê.
“A Aliança de Misericórdia foi mais do que um teto. Eles me deram uma família e me ajudaram a encontrar um propósito”, conta. Ainda criança, sua mãe faleceu. Na pandemia, perdeu o pai, vitimado pela COVID-19. Com determinação, Renan equilibrou trabalho, estudos e treinos. Neste ano, venceu o 37º Campeonato Paulista de Karatê. Hoje, com o apoio da Aliança e de parceiros, avança na carreira de esportista.
Rede Rua: um braço de solidariedade na metrópole
Contribuir para a construção de uma rede de relações, que promova o resgate da cidadania e o direito da vida digna da população em situação de rua é a missão da Associação Rede Rua, sediada no Brás, no espaço conhecido como Chapelaria Social Irmã Alberta.
Eloi Nascimento Ribeiro, 51, o Gaúcho, como é mais conhecido, apesar de ter nascido em Palmas (PR), esteve na Chapelaria Social pela primeira em abril do ano passado, após ter chegado a São Paulo à procura de emprego.
“Ali me senti acolhido e fiz novas amizades. E me abriu bastante portas”, recorda. Ele se inscreveu no Programa Operação Trabalho, mantido pela Rede Rua em parceria com a Prefeitura, fez um cursos de qualificação profissional e voltou a trabalhar. “No final do mês, tenho um dinheirinho, compro as minhas roupas. Agora tenho onde morar e onde tomar banho”, comenta Eloi, que já viveu em situação de rua. Atualmente, ele pernoita no Centro Temporário de Acolhimento – CTA Brás, mantido pela Prefeitura, e está cursando uma faculdade na área de Tecnologia. Participante da turma de Catequese da Chapelaria Social, ele se prepara para receber a primeira Comunhão.
Novos horizontes se abrem aos que passam pelo Sefras
Em todo o Brasil, o Sefras – Ação Social Franciscana atende diariamente mais de 4 mil pessoas, atuando de modo direto no combate à violação de direitos – incluindo a erradicação da fome – e na busca da inserção econômica e social de idosos, migrantes, refugiados, crianças e adolescentes e pessoas em situação de rua.
Uma dessas iniciativas é o Recifran – Serviço Franciscano de Apoio à Reciclagem, projeto socioambiental que oferece atividades de formação e geração de renda, auxiliando a população em situação de rua na reinserção ao mercado de trabalho, atendendo diariamente cerca de 50 pessoas.
Pedro Luiz da Silva, 63, viveu nas ruas por 21 anos antes de encontrar apoio no Recifran em 2003. Após duas décadas nesta iniciativa, em 2023 ele foi convidado para participar, do Hub de Catadores, criado pela ANCAT, na função de mobilizador da equipe. Ele é parte de um projeto de uma organização vinculada ao Movimento Nacional do Catadores de Materiais Recicláveis: “O que me ajudou a superar as dificuldades da vida foi minha fé, os ensinamentos e toda a acolhida do Sefras, com cursos de formação, estadia e orientações”.
No contraturno escolar, é hora de aprimorar as virtudes na Paróquia São Vito
Desde abril de 2023, o Instituto Virtus, um dos braços das obras de misericórdia do CorUnum, associação da Paróquia Nossa Senhora do Brasil, nos Jardins, realiza o contraturno escolar para crianças que estudam do 2° ao 5° do ensino fundamental na Escola Estadual Romão Puiggari, próxima à Paróquia São Vito Mártir, no Brás.
A iniciativa também envolve a prática de oração, o ensino catequético, o estímulo às boas virtudes, oferta de alimentação equilibrada e cuidados de saúde.
Ariane Aparecida Carneiro, 37, conta que antes de ingressar no contraturno, em abril de 2023, a filha, Sophie, 9, era uma criança rebelde, com rotina de sono desregulada, se alimentava mal e tinha pouca motivação para as atividades. “Depois que ela começou a frequentar o Instituto, melhorou 100%. Foi um divisor de águas”, conta, dizendo, ainda, que Sophie tem hoje maior senso de responsabilidade.
Já Letícia, 9, ingressou no contraturno em agosto do ano passado. A mãe Ana Paula Vieira dos Santos Carvalho, 45, assegura que as melhorias na vida da menina são evidentes, desde a melhor qualidade de alimentação até a segurança para lidar com medos. Ela exemplifica que Letícia quando tinha pesadelos acordava chorando muito alto, mas hoje rapidamente se acalma após rezar.
AQUI TAMBÉM SE FAZ A CARIDADE ORGANIZADA
CASA DE ORAÇÃO DO POVO DA RUA: Mantido pela Arquidiocese de São Paulo, o espaço é referência para ações solidárias e de fortalecimento da fé às pessoas em situação de rua. Doações de alimentos, itens de higiene pessoal e de roupas em bom estado podem ser entregues no próprio local (Rua Djalma Dutra, 3, Luz) ou na Paróquia São Miguel Arcanjo (Rua Taquari, 1.100, Belenzinho), cujo Pároco é o Padre Julio Lancellotti, Vigário Episcopal para a Pastoral do Povo de Rua.
MISSÃO EUCARÍSTICA VOZ DOS POBRES: A instituição realiza diariamente a pastoral de rua, com missionários consagrados e voluntários que levam refeições e dialogam com os ‘irmãos da rua’. Também acolhe pessoas com a saúde debilitada que vivem nas ruas ou que tenham sido abandonadas por familiares em hospitais e em suas próprias casas.
CENTRO SOCIAL NOSSA SENHORA DO BOM PARTO: O Bompar atende mais de 17 mil pessoas por dia, entre crianças, adolescentes, jovens, idosos, famílias e pessoas em situação de rua, estas últimas em três ações específicas: Centro de Acolhida Morada São Martinho (Largo Senador Morais Barros, 160, Brás); Núcleo de Convivência São Martinho de Lima (Rua Padre Adelino, 43, Belenzinho); e Consultório na Rua (Rua Sapucaia, 413, Alto da Mooca), que atende pessoas em situação de rua e as encaminha para os cuidados médicos em hospitais e unidades básicas de saúde (UBS).
CARITAS ARQUIDIOCESANA DE SÃO PAULO: Este organismo da Arquidiocese de São Paulo atua para promover o desenvolvimento integral da pessoa humana, na defesa de seus direitos, especialmente por meio de seus seis núcleos regionais, empenhados na sensibilização, animação, articulação e promoção da caridade (leia mais detalhes no caderno especial publicado nesta edição do O SÃO PAULO).
PASTORAL DO MENOR: Entre as frentes de atuação desta Pastoral estão: ações judiciais referentes a violências praticadas contra crianças e adolescentes; monitoramento do trabalho dos conselhos tutelares; cobrança do poder público para o abrigamento de famílias com crianças que estão em situação de rua; atenção a adolescentes que cumprem medidas socioeducativas de meio aberto ou de internação na Fundação Casa; e suporte material a crianças e adolescentes que vivem em comunidades carentes, com campanhas específicas nos períodos da Páscoa e do Natal.