Lei estadual vai restringir o uso de telefones celulares nas escolas de São Paulo

Projeto de lei sobre a temática foi aprovado na ALESP e aguarda a sanção do governador. Medida já existe na cidade do Rio de Janeiro, com resultados positivos

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O estado de São Paulo está prestes a ter uma lei que proibirá o uso de telefo­nes celulares e outros dispositivos eletrô­nicos com acesso à internet pelos estu­dantes durante todo o período em que estiverem na escola – pública ou particu­lar –, incluindo o horário do intervalo. É isso que prevê o projeto de lei 293/2024, de autoria da deputada estadual Marina Helou, que foi aprovado pela Assem­bleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), no dia 12.

O texto já está em posse do governa­dor Tarcísio de Freitas, que até o fim do mês poderá sancioná-lo ou vetá-lo total ou parcialmente. Após a sanção da lei, o governo paulista definirá protocolos sobre a fiscalização aos estudantes, puni­ções por descumprimentos e locais para armazenar os aparelhos nas unidades escolares.

Conforme o projeto de lei, o uso dos celulares ou dispositivos eletrônicos será permitido apenas nos casos em que haja necessidade pedagógica para tal, como para o acesso de conteúdos digitais ou ferramentas educacionais on-line; e para o aluno com deficiência que necessite do aparelho para participar das atividades escolares.

A legislação também obriga que as escolas, tanto da rede pública quanto da rede privada, criem canais acessíveis para a comunicação entre pais, respon­sáveis e a instituição de ensino.

PREJUÍZOS NO RENDIMENTO ESCOLAR E NA SOCIALIZAÇÃO

“A forma com que os celulares vêm sendo usados por crianças é preocu­pante e está associada a diferentes tipos de problemas de saúde mental e até de desenvolvimento físico, como miopia e problemas de postura, além do próprio aprendizado. Portanto, restringir o uso de celulares é uma medida eficaz na es­cola, já que é lá que o estudante passa a maior parte do seu tempo”, analisou Rodolfo Canônico, diretor-executivo do Family Talks.

Segundo Canônico, a proibição do uso também resultará em ganhos de so­cialização: “A interação virtual não tem a mesma qualidade da interação real e o aumento de uso das redes sociais está associado ao crescimento dos índices de solidão. Portanto, reduzir o tempo do uso do celular na escola levará ao maior con­vívio entre os estudantes e isso sim tem mais associação com o bem-estar do que o tempo de uso da internet”, prosseguiu.

RESULTADOS POSITIVOS NO RIO DE JANEIRO

Secretaria da Educação do RJ

Na cidade do Rio de Janeiro, o uso do telefone celular e de outros disposi­tivos eletrônicos pelos estudantes está proibido desde fevereiro. Os aparelhos devem permanecer desligados ou liga­dos em modo silencioso e sem vibração, e guardados nas mochilas ou bolsas dos alunos no período escolar. Caso alguém desrespeite a medida, o professor tem a autorização para adverti-lo e cercear o uso em sala de aula. O dispositivo pode ser usado para fins pedagógicos, com a autorização do docente, e pelos alunos com deficiência que dele necessitem.

Em outubro, a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro informou que em escolas nas quais o uso de celula­res é proibido, as chances de alunos do 9º ano alcançarem um nível adequado em matemática aumentaram em 53%; e que também houve ganhos gerais em con­centração,

No texto de justificativa do projeto de lei é apontado que “o uso constante de dispositivos móveis durante as aulas tem sido associado a uma diminuição signi­ficativa na capacidade de concentração e desempenho acadêmico”; que “pode re­duzir a capacidade cognitiva, resultando em uma menor retenção de participação e desempenho dos estudantes, além de redução signifi­cativa dos casos de cyberbullying.

Em âmbito nacional, já tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei para proibir o uso de dispositivos ele­trônicos dentro e fora da sala de aula de escolas públicas e privadas. Em outubro, o substitutivo do PL 104/15 foi aprovado na Comissão de Educação e agora será apreciado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), antes ir à votação no plenário.

OS DESAFIOS DE UMA ESCOLA QUE JÁ LIMITA O USO

O Colégio Padre Luiz Tezza, na Vila Dom Pedro II, na zona Norte da capital paulista, tem restringido o uso dos te­lefones celulares pelos estudantes: até o 5º ano do ensino fundamental, eles não podem levar o aparelho para a escola; e do 6º ano até o ensino médio, a entrada é permitida, mas uso está restrito aos 20 minutos do intervalo.

Ao entrar na sala para o começo do dia de aula, os estudantes são orientados a deixar o telefone celular em uma caixa organizadora. O contato com o disposi­tivo somente volta a acontecer quando são realizadas atividades pedagógicas on-line, na hora do intervalo e ao deixa­rem a escola.

Claudia Guastamacchia, coordena­dora pedagógica do colégio, observou, porém, que há alunos e até alguns pais que questionam a medida, argumentan­do que o celular é um objeto de uso pes­soal e que não existe uma legislação que permita à escola adotar tal restrição.

“A maioria dos professores ficou mui­to feliz ao saber que haverá uma lei proi­bindo o uso do celular, porque hoje eles têm que ficar um bom tempo tentando explicar o porquê de não se poder usar o celular em sala. Até todos colocarem na caixa seus aparelhos gasta-se cerca de 15 informações e notas mais baixas”; além de ser preciso considerar que “o uso frequente de tele­fones e mídias sociais pode ter um efeito cumulativo e duradouro nas habilidades dos adolescentes de se concentrarem e se dedicarem a tarefas importantes”.

Esses impactos do uso dos celulares no processo educativo também são per­cebidos pelo Family Talks, instituição voltada à defesa dos direitos das famílias nas esferas civis e governamentais. dos 50 minutos do tempo total de uma aula. Isso atrasa o conteúdo da discipli­na, leva à perda do tempo de aula, e no intervalo para a troca de um professor por outro, alguns estudantes pegam seus celulares. Toda aula é uma luta”, disse.

Cláudia detalhou o quanto a depen­dência de celular afeta o rendimento es­colar. “Dá para perceber isso pelas notas baixas, pela falta de atenção ou pela não participação nas aulas, além do isola­mento”, explicou, dizendo ainda perce­ber que na hora do intervalo os adoles­centes quase não conversam entre si nem fazem outras atividades por permanece­rem com seus celulares.

ORIENTAÇÃO DA FAMÍLIA E PARA A FAMÍLIA

Na avaliação da coordenadora pe­dagógica do Colégio Padre Luiz Tezza, a futura lei só terá impacto efetivo se for apoiada pelos pais: “Existindo a lei, haverá um respaldo para a escola, e a família vai ter de assumir seu papel. Os pais terão de entender que a proibição do uso do celular será uma regra, assim como já o é usar o uniforme ou ter um material escolar específico. Teremos, é claro, uma conversa com as famílias para orientá-las e para que percebam o quanto uso do celular é prejudicial aos estudantes”.

No entender de Rodolfo Canônico, diretor-executivo do Family Talks, esse diálogo com as famílias também será fundamental. “Mais do que a conscien­tização da família sobre os riscos deste uso, o principal trabalho será o de ajudá­-la a criar bons hábitos nessa relação com o mundo digital, pois se elas estivessem vivendo isso de modo adequado não se­ria preciso esta lei. Portanto, é necessário dar passos além dessa legislação para que os próprios adultos tenham um uso ade­quado da tecnologia e ajudem as crian­ças a fazer o mesmo”, concluiu.

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