Ação iniciada em 2016 por um grupo de paroquianos da Igreja São José, em Perus, auxilia 40 pessoas em situação de rua e 28 famílias em vulnerabilidade
Há cinco anos, às segundas-feiras, das 18h30 às 19h30, um grupo de leigos da Paróquia São José, em Perus, na zona Noroeste da capital paulista, percorre o bairro em busca das pessoas em situação de rua para lhes oferecer refeições.
Por mês são distribuídas, em média, 170 marmitas, acompanhadas de sobremesa e suco. Todos os alimentos dessa ação provêm de doações arrecadadas por 38 voluntários que batizaram o coletivo como Grupo Assistencial Mãe Peregrina (GAMP).
Além de comida, são distribuídos cobertores, chinelos, kits de higiene pessoal, roupas, entre outras coisas. Só neste ano, o grupo já ofertou 1,31 mil marmitas, 2,04 mil máscaras, 720 garrafas de água e 43 litros de álcool em gel.
Quando tudo começou
Em 2016, inspirados pelo Ano Santo da Misericórdia, decretado pelo Papa Francisco, devotos da Mãe Peregrina se uniram para fazer algo concreto em prol dos irmãos em situação de rua encontrados em diferentes pontos do bairro.
“Decidimos dar o que comer para quem não tinha, dar-lhes o que beber e o que vestir e, assim, seguir os atos de misericórdia”, afirma Marinha Caramigo, coordenadora do GAMP.
Desde então, o grupo mantém um cadastro com dados das pessoas em situação de rua que assiste. Por meio das informações coletadas, o GAMP busca, sobretudo, resgatar a identidade de cada indivíduo atendido.
“Uma coisa que colocamos no cadastro é qual ou quais profissões a pessoa já exerceu na vida. Entre os assistidos há advogado, degustadora de vinhos, assistente social e até dono de padaria”, relata Marinha.
Para além do gesto
Segundo a coordenadora, a ação do GAMP vai muito além do que levar comida, roupas e calçados aos irmãos em situação de rua. “O objetivo maior é tentar tirá-los da rua, por meio do afeto e da amizade, fazendo com que eles vejam que queremos o bem deles”, narra Marinha, frisando que na abordagem os voluntários sempre tentam falar sobre a importância dos laços e do lar, incentivando o retorno às famílias de quem está nas ruas.
Segundo a coordenadora, ao longo destes anos de atuação, embora o grupo ainda não tenha visto nenhum deles retornar ao lar, já testemunhou dois irmãos que saíram das drogas.
Marinha conta que antes da pandemia, durante a distribuição das marmitas, o grupo conseguia sentar e conversar com os assistidos. Muitas vezes, até levava a imagem da Mãe Peregrina nos encontros, o que rendia boas conversas e momentos de oração.
“Agora, neste período em que temos que evitar o contato, não podemos parar e conversar muito. Tenho fotos do nosso grupo sentado, comendo e rezando junto com eles”, comenta.
A coordenadora diz com orgulho que o GAMP estabelece uma relação de confiança com os assistidos. “Sabemos da vida de todos e os conhecemos pelos nomes. Apesar dos apelidos, graças ao cadastro que fazemos, sabemos o nome completo de pelo menos 80% deles”, afirma Marinha. “Isso é importante. Até mesmo se precisarmos, por exemplo, direcioná-los a algum tipo de auxílio médico”.
Ela também compartilha que, ao longo da pandemia, o número de pessoas em situação de rua no bairro aumentou. “Antes, entregávamos 25 marmitas. Com essa pandemia, porém, houve muito desemprego e há mais gente na rua. Hoje, distribuímos, em média, 45 marmitas a cada segunda-feira.”
Dedicação diária
Embora a distribuição ocorra somente às segundas-feiras, os voluntários se revezam em encontros diários na casa da Marinha para organizar e preparar tudo. Durante a pandemia, para não haver aglomeração, eles se reúnem de quatro a cinco pessoas por encontro.
“Todos os dias tem algo pra fazer. Quando recebemos doações de verduras e legumes, por exemplo, precisamos ensacar e congelar tudo para não perder, até ser usado no preparo das refeições”, explica Marinha.
Os voluntários também se mobilizam para conseguir e buscar doações, e ainda contribuem com itens. “Todos ajudam como podem. No caso do kit de higiene, um traz sabonete, outro absorvente, e assim por diante”, exemplifica Marinha.
Eles, inclusive, se dedicam aos cuidados com as roupas que são distribuídas. “Às vezes, chegam peças rasgadas e sujas. Então, lavamos e costuramos. Sabemos que elas são descartáveis, pois os irmãos em situação de rua as usam até não dar mais. Porém, doamos sempre em boas condições”, detalha.
Atuação no bairro
Padre Cilto Rosembach, Pároco da Paróquia São José, enxerga o GAMP como uma “atuação profética” no bairro. “O grupo está com a prática da caridade bem antes da pandemia. As pessoas engajadas neste projeto são simples e pobres. São exemplos de dedicação e partilha”, diz.
O Pároco também afirma que a “ação de fé e vida do GAMP” sempre impactou a vida pastoral da Paróquia e que os resultados das ações, inclusive, a quantidade de pessoas envolvidas e atingidas, impressionam.
“Trata-se de um grupo com devoção mariana que age no silêncio, como orienta a palavra de Deus. ‘Ora et labora.’ Que a tua mão direita não saiba o que faz a mão esquerda, e vice-versa, de modo que a tua caridade fica oculta (Mt 6,1-6.16-18)”, enfatiza Padre Cilto.
Além da população de rua, há cerca de quatro anos o GAMP passou a assistir com cestas básicas 28 famílias do bairro que vivem em “casas não habitáveis” (precárias).
“Chegamos a lugares que, muitas vezes, a mão do Padre não consegue chegar. São lugares muito distantes da Paróquia e pessoas que, embora católicas porque foram batizadas, não frequentavam a igreja”, pontua Marinha.
O GAMP leva as cestas básicas às casas das famílias todo primeiro sábado de cada mês. “São famílias que moram em casas em que, quando chove, fica uma lameira só, pois enchem de água e eles acabam perdendo tudo”, relata Marinha, ressaltando que essas famílias não têm sequer condições de buscar as doações em nenhum lugar.
Trabalho em conjunto
O GAMP conta com as doações que chegam por meio da campanha da Mãe Peregrina, comerciantes do bairro, paroquianos e pastorais da Paróquia São José.
Marinha enfatiza a parceria do grupo com as Pastorais Social e do Menor. “Temos uma boa interação. Quando podemos contribuir com elas, assim fazemos. E, quando precisamos de algo, elas também nos socorrem.”
Padre Cilto também comenta sobre a partilha entre os grupos. “Um procura suprir a necessidade do outro. Com a pandemia, isso vem se intensificando. Não há necessidade de orientação a não ser o princípio da partilha que emana da mesa da Palavra e da Eucaristia. Partilhar o pão como nos orienta João [capítulo] 6”, menciona o Pároco.
Apesar disso, ao longo da pandemia, o GAMP precisou pensar em alternativas para assegurar as ações caritativas. Recentemente, por exemplo, o grupo rifou 11 unidades de cobertores do modelo soft, que ganhou e que não eram suficientes para a demanda. “Assim fizemos dinheiro e deu para comprar cestas básicas e cobertores mais simples, que distribuímos entre as pessoas em situação de rua e as famílias”, explica Marinha.