Arcebispos reiteram que liberdade religiosa é direito fundamental de todo ser humano

Cardeais brasileiros e o presidente da CNBB participaram do encontro virtual de apresentação de relatório que aponta crescimento da perseguição religiosa no mundo

Jornalista Aldo Quiroga mediou o evento promovido pela ACN Brasil (Reprodução da internet)

A  Fundação Pontifícia  Ajuda à Igreja que Sofre (ACN Brasil) realizou na terça-feira, 27, uma live para a apresentação do Relatório de Liberdade Religiosa no Mundo 2021.

O evento contou com as participações do Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo; Cardeal Orani João Tempesta, Arcebispo do Rio de Janeiro; Cardeal Sérgio da Rocha, Arcebispo de Salvador; e Dom Walmor de Oliveira Azevedo, Arcebispo de Belo Horizonte e Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Com a mediação do jornalista Aldo Quiroga, os arcebispos refletiram sobre os resultados apontados na 15ª edição do Relatório, divulgado no dia 20 e que, entre outros dados, indica que as violações à liberdade religiosa acontecem em um a cada três países do planeta.

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Um em cada três países sofre violações de liberdade religiosa

Relatório global alerta para o crescimento da ‘perseguição religiosa educada’

Garantia inegociável

Cardeal Odilo Scherer (reprodução da internet)

Segundo o Relatório, o direito fundamental à liberdade religiosa não foi respeitado em 62 (31,6%) dos 196 países pesquisados, entre 2018 e 2020. Em 26 desses países as pessoas sofrem perseguição e, em 95% deles, a situação ficou ainda pior durante o período analisado.

Ao comentar os dados, Dom Walmor ressaltou que a liberdade religiosa é um garantia inegociável do ser humano. “Trata-se de uma necessidade humana, dimensão essencial à vida. A dignidade humana não depende apenas de bens e saberes alicerçados na razão, conhecimentos tecnológicos e científicos. A dimensão religiosa é imprescindível para se reconhecer o sentido da vida, especialmente nos mementos de dificuldades e desafios e no confronto das adversidades”.

Estado laico não é antirreligioso

Dom Odilo enfatizou que para abordar o tema da liberdade religiosa, é necessário estabelecer a distinção dos conceitos de Estado laico e Estado antirreligioso.  “O Brasil é um Estado laico e a nossa Constituição deixa muito claro que se entende por isso. É um estado que não tem uma religião oficial, nem impõe uma tradição religiosa aos cidadãos, respeita a religião ou a não religião de cada um, pois, isso diz respeito à liberdade individual”.

Já o Estado antirreligioso, explicou o Cardeal Scherer, “é aquele que usa de seu poder e sua autoridade para cercear a liberdade religiosa, para impedir aos cidadãos o livre desempenho da sua ação ou crença religiosa”.

“Isso é um perigo que pode rondar certos ambientes culturais, quando entra na gestão política ou é transformado em ideologia para busca de afirmação do poder”, alertou o Arcebispo de São Paulo, reforçando que a liberdade religiosa também implica na possibilidade de um cidadão poder manifestar suas convicções religiosas na vida pública, como na política. 

Dom Walmor Azevedo (reprodução da internet)

Não é uma concessão do Estado

Nesse sentido, o Presidente da CNBB também observou que os católicos não são chamados a “constituir bancadas em parlamentos, nem abraçar ideologias com seus riscos próprios de comprometimento, desfigurando valores e princípios intocáveis”. 

Dom Walmor considera “abominável” instrumentalizar a religião para “finalidades eleitoreiras”. “Ao invés disso, a espiritualidade cristã deve qualificar o exercício da política, para inspirar uma cidadania que busque consolidar a amizade social e o respeito às diferenças”, disse.

O Presidente da CNBB manifestou que o Estado laico deve dialogar com as diferentes confissões religiosas, a fim de respeita-las, “não como concessão benévola, arvorando-se no direito de fazer decretos ou legislar invasivamente na esfera da religião”.

Combate à intolerância

Considerando que o Rio de Janeiro é estado com a maior proporção de seguidores das religiões de matiz africana no Brasil e onde os adeptos mais sofrem intolerância, de acordo com o número de denúncias apresentado no Relatório da ACN, Dom Orani enfatizou a importância do trabalho conjunto das organizações religiosas.

O Cardeal Tempesta destacou as várias comissões de diálogo ecumênico e inter-religioso que atuam no combate à intolerância religiosa. Ele também atribui à eficácia dessas organizações para a quantidade significativa de denúncias feitas

Cardeal Orani Tempesta (reprodução da internet)

“A realização de projetos comuns nos ajudam a ver os passos consolidados nessa luta”, afirmou Dom Orani, reiterando que o diálogo inter-religioso não constitui uma ameaça à própria fé, nem retira a identidade religiosa de cada um. “Continuamos fiéis a nossa identidade, àquilo que acreditamos”, disse.

Perseguição ‘disfarçada’

A Bahia também é marcada pela forte presença das religiões afro-brasileiras e também sofre com a intolerância. Dom Sergio lamentou e condenou tais manifestações de violência.

“As violações  contra liberdade religiosa não acontecem apenas em países ou situações mais distantes de nós. Precisamos estar atentos porque, muitas vezes, não levamos a sério ou tomamos consciência daquilo que se passa próximo de nós, a começar das nossas atitudes”, afirmou o Primaz do Brasil, salientando que não são apenas as violações extremas que causam sofrimentos, mas também aquelas que acontecem de maneira “disfarçada”.

“Enquanto comunidade católica, não podemos jamais concordar nem favorecer a intolerância religiosa no nosso dia a dia, com comentários pejorativos sobre quem pratica outros cultos. Nossa atitude deve ser sempre de muito respeito, diálogo, de busca de convivência fraterna e pacífica”, acrescentou Dom Sergio, sublinhando, contudo, que o combate à intolerância e o respeito às diferentes religiões não implica na perda de identidade. “Pelo contrário, exige respeito à própria identidade”, reiterou.

Cardeal Sergio da Rocha (reprodução da internet)

Acolhida aos perseguidos

O Cardeal Scherer destacou que a cidade de São Paulo vive, de alguma forma, os reflexos desses conflitos religiosos, pelo fato de receber os inúmeros refugiados dos países marcados pelas perseguições religiosas. “Tivemos um grande fluxo de prófugos sírios,  também da região do Iraque. Recentemente, do extremo oriente, de Mianmar e até da índia. Sem contar os vindos dos países africanos”, relatou o Arcebispo,

Dom Odilo sublinhou que São Paulo é uma cidade que tem um histórico de acolhida de migrantes e parte da sua população é formada por povos de outros estados e nações.

“A Arquidiocese de São Paulo realiza um grande trabalho por meio de várias organizações para acolher os prófugos em busca de refúgio”, pontuou, mencionando o serviço de acolhida de refugiados da Caritas Arquidiocesana em convênio com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). Há, também, o trabalho desenvolvido pelos missionários Scalabrianianos, cujo carisma é o acompanhamento pastoral dos migrantes.

Assista ao evento de apresentação do Relatório de Liberdade Religiosa 2021:
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