‘A cúria diocesana deve refletir a caridade pastoral que anima toda a Igreja’

Padre Mauricio Landra, Doutor em Direito Canônico (reprodução da internet)

A missão das cúrias diocesanas e suas práticas jurídico-administrativas foram o destaque de um curso de extensão promovido pela Faculdade de Direito Canônico São Paulo Apóstolo, nos dias 8 e 9. 

Voltada para bispos, mestres e doutores em Direito Canônico e oficiais da cúria, a formação on-line foi ministrada pelo Padre Mauricio Landra, da Diocese de Gualeguaychú, na Argentina. Ele é doutor em Direito Canônico pela Universidade Católica da Argentina (UCA), e professor ordinário das cátedras de Metodologia Canônica, Igrejas Particulares e Direito Matrimonial na mesma instituição. 

Organismo de serviço 

O curso foi aberto pelo Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo e Grão-Chanceler da faculdade. Ele ressaltou que, muitas vezes, a cúria é entendida apenas como um lugar onde são realizados trabalhos meramente burocráticos e administrativos, quando, na verdade, trata-se do organismo de governo do bispo e que, portanto, está a serviço do seu pastoreio na diocese. 

O Arcebispo acrescentou que, nas cúrias, deve ser refletida a caridade pastoral que anima toda a Igreja. Para isso, são necessários vários serviços que buscam favorecer a organização pastoral e administrativa da diocese, sempre tendo em vista a primeira missão da Igreja, a evangelização. “As cúrias são expressão do serviço pastoral da Igreja, de sua memória, história e organização necessárias para bem servir”, completou o Cardeal.  

Ao longo das duas tardes de curso, Padre Mauricio Landra destacou os documentos da Igreja que fundamentam a vocação e a missão da cúria diocesana, sua coordenação, as pessoas e serviços que a constituem, além das metodologias de trabalho. Também foram apresentados modelos de estatutos, regulamento e a análise de decretos e demais documentos emitidos nas cúrias. 

Finalidade 

O professor sublinhou que, como lembra o Código de Direito Canônico, os ofícios eclesiásticos como os das cúrias devem ser exercidos com uma “finalidade espiritual”. 

Recordando o que diz o decreto Christus Dominus, do Concílio Vaticano II, sobre o múnus pastoral dos bispos, Padre Mauricio destacou que o trabalho das cúrias, como extensão do ministério do bispo, deve colaborar para a unidade da diocese. 

Esse mesmo documento conciliar exorta que a cúria diocesana deve ser “instrumento apto nas mãos do bispo, não só para administrar a diocese, mas também para fomentar as obras de apostolado”.  

Tarefa comum 

Nesse sentido, o canonista salientou que quem realiza um trabalho na cúria, por mais técnico que seja, o faz com uma finalidade pastoral, colaborando diretamente no exercício do múnus, isto é, a missão própria confiada por Jesus a um bispo, sucessor dos apóstolos, de governar e pastorear a porção do povo de Deus reunida em uma diocese. 

Para explicar o significado da palavra múnus, em vez de usar os termos ofício e função, Padre Mauricio traduziu como “tarefa” – dever obrigatório de um indivíduo, encargo, obrigação – decorrente de uma vocação e missão. No caso do bispo, é intrínseco ao seu ministério o múnus de santificar, ensinar e governar (pastorear). 

A partir dessa definição, o canonista convidou os participantes do curso a olharem cada um dos organismos, funções e atividades da cúria como uma tarefa realizada em comum, a serviço da Igreja. Desse modo, assim como enfatiza o decreto Christus Dominus, “os membros de uma cúria não são meros funcionários, mas colaboradores do ministério pastoral do bispo”. 

(Reprodução da internet)

Estruturas 

Outro aspecto ressaltado pelo professor é que, assim como não há dioceses iguais, não há cúrias idênticas. A organização de cada uma delas irá se configurar à realidade da Igreja particular. Contudo, existem algumas estruturas que, mesmo com nomes diferentes, correspondem a uma missão comum a todas as dioceses. 

Entre esses serviços estão a chancelaria, onde são emitidos e autenticados os documentos de uma diocese, como nomeações, decretos etc. Também fazem parte da cúria os departamentos administrativos, jurídico e, recomenda-se que a coordenação e articulação das pastorais integrem esse organismo. São parte da estrutura das cúrias, ainda, o arquivo e o tribunal eclesiástico, mesmo que não funcionem no mesmo local, como no caso da Arquidiocese de São Paulo, que possui um arquivo metropolitano e um tribunal eclesiástico interdiocesano. 

É o bispo, em primeiro lugar, quem coordena os trabalhos da cúria. Para isso, porém, pode delegar alguém que realize essa tarefa diretamente, uma vez que o bispo não pode estar presente de maneira integral na cúria, devido às outras tarefas que fazem parte de seu ministério.   

Padre Mauricio também lembrou que as cúrias possuem uma missão subsidiária para as paróquias e organismos eclesiais que possuem certa autonomia de ação, mas preservam a comunhão entre si. 

Dimensão espiritual 

O canonista acrescentou que a tarefa administrativa própria de uma cúria não pode ser dissociada da dimensão espiritual, pessoal e comunitária de seus colaboradores. Por essa razão, o diretório pastoral para o ministério pastoral dos bispos Apostolorum successores recomenda, por exemplo, que os padres que colaboram nas cúrias diocesanas tenham “algum outro ministério com cura [cuidado] de almas, para manter vivo o seu zelo apostólico e evitar que desenvolvam, por falta de contato direto com os fiéis, uma mentalidade burocrática prejudicial”. 

Ainda sobre a dimensão espiritual da cúria diocesana, Padre Mauricio apontou a importância da oração da celebração da fé entre os integrantes desse organismo. 

“Muitas cúrias têm um momento do dia dedicado à oração, à oração do Angelus, à celebração da Eucaristia, um momento de meditação. Outras cúrias utilizam no calendário de trabalho momentos de descanso ou recreação. Há, ainda, aquelas que realizam retiro espiritual da cúria diocesana”, destacou o professor. 

Padre Mauricio sublinhou que a cúria não tem um fim em si mesma, é um serviço aos irmãos, “aos que vão a ela, aos que esperam uma resposta, que solicitam um espaço de escuta”. Nesse sentido, o canonista ressaltou a importância da “porta” de uma cúria, isto é, o serviço encontrado logo na entrada de sua sede. “Aquele que vem ao lugar físico da cúria diocesana deve ser atendido cristãmente, com respeito e paciência”, completou. 

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