Atentado na escola: como pais, professores, estudantes e as autoridades podem agir?

Articulistas do O SÃO PAULO falaram sobre esta temática em artigos neste ano. Pacto Educativo Global, proposto pelo Papa Francisco, aponta para a união de esforço em prol das novas gerações

Foto: Agência Brasil

Manhã de segunda-feira, 23 de outubro. Repentinamente, os noticiários nas tevês, rádios e nos portais da internet estão com a mesma manchete: estudante é morta a tiros e outros três ficam feridos após ataque em escola na zona Leste de São Paulo.

Horas depois, outros detalhes surgem sobre o ocorrido na Escola Estadual Sapopemba: um adolescente, de 16 anos, também aluno da escola, efetuou os disparos com um revólver, devidamente registrado, que pertence a seu pai. Um dos tiros acertou a cabeça de Giovanna Bezerra Silva, 17, que morreu. Outras duas estudantes de 15 anos se feriram no tórax e na clavícula. Um quarto aluno, de 18 anos, machucou uma das mãos ao tentar fugir por uma janela da escola durante os disparos.

Passa-se um dia, e mais detalhamentos: o adolescente autor dos disparos era alvo de recorrentes episódios de bullying. Em abril, sua mãe o acompanhou a uma delegacia de Sapopemba para registrar queixa de agressão e informar que o menino recorrentemente tinha desentendimentos com um grupo de meninas. Por mais de uma vez, ele teria as ameaçado de morte. As ameaças se tornaram fato na manhã do dia 23.

No estado de São Paulo, este não foi o primeiro atentado com vítima fatal em uma escola este ano. Em 27 de março, a professora Elisabeth Tenreiro, de 71 anos, foi morta a facadas na Escola Estadual Thomazia Montoro, na zona Oeste da capital paulista, após ser atacada por um aluno de 13 anos, que também feriu três estudantes e outra professora.

Alguns dias depois, o governo paulista anunciou a contratação temporária de 550 psicólogos para atendimento nas escolas estaduais, além de mil vigilantes de empresas de segurança privada para atuar desarmados nas unidades.

Agora, após o recente episódio do dia 23, o anúncio do governo de São Paulo é que serão contratados mais mil seguranças privados para atuar em unidades educacionais em todo o estado, “uma iniciativa para reforçar a prevenção a episódios de violência”, conforme informou a Secretaria Estadual da Educação.

SIMONE FUZARO: A PREVENÇÃO COMEÇA EM CASA

Após o ocorrido na Escola Estadual Thomazia Montoro, a fonoaudióloga e educadora Simone Ribeiro Cabral Fuzaro escreveu um artigo no O SÃO PAULO ressaltando o papel dos pais para evitar que tais episódios de violência ocorram no ambiente escolar.

Simone apontou que diante de tais fatos de violência, os pais devem se aliar à escola em busca de soluções imediatas e não verem-na como rival na segurança dos filhos: “As escolas não têm interesse algum em se colocar em risco, tampouco colocar as crianças. Vejo muitos pais querendo medidas drásticas e radicais sem considerar que as escolas têm uma visão diferente da realidade. Eles estão dentro da cena escolar, percebem a realidade daquela instituição em particular, avaliam os riscos com maior visão. Não pressionem a escola a medidas radicais que possam aumentar o pânico nas crianças e não a sensação de segurança”.

A educadora reforça que compete aos pais ter um olhar cuidadoso em relação ao processo de formação de caráter dos filhos, acompanhando-os de perto. “Quantos pais se surpreendem com comportamentos dos seus filhos adolescentes, simplesmente porque, ao longo da infância, não acompanharam de perto a formação deles? Quantas famílias acabam optando por processos educativos mais permissivos, mais fáceis, em que os embates nunca acontecem e, com isso, formam pessoas com senso moral inexistente, com pouquíssima habilidade social? O amor, o afeto e a firmeza precisam estar presentes na formação dos filhos”.

Nesse sentido, Simone lembrou: “pais que conhecem e acompanham de perto os filhos, que conversam e convivem com eles, observam rapidamente qualquer mudança de comportamento, percebem se estão envolvidos com más companhias, se estão em algum jogo ou desafio digital que possa ser prejudicial, enfim, ajudam, e muito, a preservar a sociedade do convívio com personalidades malformadas e desequilibradas”. E observou: “As mochilas que chegam à escola, nas quais pode haver objetos que ferem e matam, saem de casa, do aconchego do lar. Será mesmo necessário que a escola reviste essas mochilas ou seria muito mais adequado que os pais soubessem o que os filhos levam tanto na mochila quanto no coração?”.

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MARLI PIROZELLI N. SILVA: UM PROBLEMA, MUITOS FATORES

Também articulista do O SÃO PAULO,  Marli Pirozelli N. Silva, mestra em Filosofia da Educação e professora universitária de Doutrina Social da Igreja, escreveu um artigo em abril deste ano analisando o episódio ocorrido na Escola Estadual Thomazia Montoro.

A especialista lembrou que o Estado “é frequentemente apontado como o maior responsável pelo ataque, por engavetar projetos que previam a assistência psicológica nas escolas e por não oferecer a segurança necessária. Isto é correto. São décadas de abandono da educação, de professores realizando o trabalho em condições desafiadoras, com pesadas cargas horárias e baixos salários, ao sabor de projetos que mudam frequentemente”.

No entanto, ela recordou que “a influência negativa das redes sociais também é bem conhecida e sua utilização foge à capacidade de controle dos pais, ainda que estes procurem acompanhar os filhos de perto”, de modo que as redes podem influenciar a ocorrência de tais atos violentos.

Ao listar as muitas iniciativas de prevenção, como a presença de psicólogos nas escolas, acompanhamento social, instalação de botão de pânico em locais estratégicos, detector de metais, criação de canais de denúncia e monitoramento de inteligência policial, Marli observou que tais medidas “podem ser necessárias e algumas já deveriam vigorar a muito tempo, como o acompanhamento psicológico e a interação com as famílias. Elas, porém, também têm alcance limitado”.

E observou que “ainda que os professores atuem com grande empenho e generosidade, faltam adultos capazes de propor um ideal de vida e isto não afeta somente os educadores. Todos nós perdemos a capacidade de reconhecer as necessidades essenciais da alma humana e a sensibilidade para perceber as riquezas e os sofrimentos dos que estão à nossa volta, em especial dos jovens”.

Por fim, a professora apontou que se os jovens mergulham em bolhas de ódio e preconceito “talvez seja porque não encontrem locais para alimentar seu desejo de uma vida plena de significado, mas, sim, um mundo repleto de violência cotidiana. Infelizmente, não há soluções eficazes em curto prazo: é preciso iniciar processos na certeza de que a realidade está imbuída pela presença de Cristo, como sempre diz o Papa Francisco, para que os jovens possam descobrir-se aceitos e amados; apesar de suas incoerências, amados por Deus”.

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O OLHAR DO PAPA FRANCISCO NO PACTO EDUCATIVO GLOBAL

Em 12 de setembro de 2019, em uma mensagem por ocasião do anúncio do Pacto Educativo Global, o Papa Francisco lembrou ser necessário “construir uma ‘aldeia da educação’, onde, na diversidade, se partilhe o compromisso de gerar uma rede de relações humanas e abertas. Como afirma um provérbio africano, ‘para educar uma criança, é necessária uma aldeia inteira’. Mas, esta aldeia, temos de a construir como condição para educar. Antes de mais nada, o terreno deve ser bonificado das discriminações com uma inoculação de fraternidade”.

Em uma aldeia com tais características – sublinhou o Pontífice – “é mais fácil encontrar a convergência global para uma educação que saiba fazer-se portadora de uma aliança entre todos os componentes da pessoa: entre o estudo e a vida; entre as gerações; entre os professores, os alunos, as famílias e a sociedade civil, com as suas expressões intelectuais, científicas, artísticas, desportivas, políticas, empresariais e solidárias. Uma aliança entre os habitantes da terra e a ‘casa comum’, à qual devemos cuidado e respeito. Uma aliança geradora de paz, justiça e aceitação entre todos os povos da família humana, bem como de diálogo entre as religiões”.

Por fim, exortou o Pontífice: “Juntos, procuremos encontrar soluções, iniciar sem medo processos de transformação e olhar para o futuro com esperança. Convido a cada um para ser protagonista desta aliança, assumindo o compromisso pessoal e comunitário de cultivar, juntos, o sonho de um humanismo solidário, que corresponda às expetativas do homem e ao desígnio de Deus”.

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