Rafael D’Aqui: ‘A ACN ajuda aqueles lugares em que os cristãos já não têm mais a quem pedir socorro’

ACN Brasil

Nos centros urbanos ou nas comunidades rurais praticamente inacessíveis; em bairros bem planejados ou em meio aos bolsões de pobreza nas periferias das cidades. Em todo o lugar e em qualquer contexto, sempre haverá a presença da Igreja e cristãos dispostos a testemunhar a fé, a esperança e a caridade. E é para apoiá-los e para assegurar a dignidade de vida de quem mais precisa que foi criada, em 1947, a fundação pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN), que somente no ano de 2021 deu apoio a quase 5,3 mil projetos, em 132 países, entre os quais o Brasil, onde a instituição mantém um escritório desde 1997.

Nas últimas semanas, Rafael D’Aqui, que desde 2020 é diretor de projetos da ACN para a América Latina, sendo também responsável pela aprovação de projetos no Brasil, visitou dioceses em diferentes partes do País e dialogou com os bispos sobre os desafios que enfrentam para a evangelização e de que forma podem ser ajudados pela ACN, conforme detalha na entrevista a seguir, na qual também agradece a todos os benfeitores que apoiam essa rede de ajuda à Igreja que sofre, cujos trabalhos podem ser conhecidos no site.

O SÃO PAULO – Desde 1997, a ACN mantém um escritório no Brasil e já apoiou mais de 6,9 mil projetos no País. Se pudéssemos fazer uma comparação dos tipos de projetos que receberam apoio naquela épo- ca com os que a instituição apoia hoje, o que mudou em relação aos pedidos?

Rafael D’Aqui – A ACN sempre buscou socorrer a Igreja em necessidade, auxiliando projetos pastorais. Aqui no Brasil, isso se traduziu na construção e reforma de seminários, igrejas e capelas; ajuda para sacerdotes e religiosas nas regiões mais pobres, distribuições de mais de 10 milhões de exemplares da Bíblia da Criança e tantos outros projetos que sempre tiveram como intenção permitir que membros da Igreja possam levar o Evangelho aos lugares mais distantes e difíceis.

No final da década de 1990, nosso histórico de projetos mostra que havia no Brasil uma necessidade muito grande de ajudar a Igreja a expandir sua presença na mídia, levar a Boa-Nova por meio dos canais de televisão e de rádios. Nesse ponto, auxiliamos também as emissoras de tevê e rádios católicas para que pudessem ter um maior alcance.

Hoje, os projetos que recebemos do Brasil continuam a pedir melhor infraestrutura para a Igreja. Existe uma grande necessidade na região Norte, onde muitos padres precisam de barcos para visitar as comunidades mais distantes. Em regiões do Amazonas, um sacerdote precisa passar dias em um barco para chegar a uma comunidade. O problema é que muitas vezes o padre não o possui e, então, a ACN pode ajudá-lo a conseguir esse meio de transporte. No Nordeste, as distâncias também são enormes, padres são responsáveis por dezenas de comunidades e, muitas vezes, não as visitam por não terem um veículo adequado. Há pedidos de ajuda também para auxiliar no sustento de religiosas e missionários inseridos nas realidades mais pobres dos grandes centros urbanos do Brasil. Essas missionárias e religiosos são muitas vezes a mão estendida da Igreja que chega até os mais vulneráveis.

Quais são os principais balizadores para que a ACN apoie um projeto total ou parcialmente? Como se dá o processo de contato da paróquia ou da congregação religiosa com a ACN?

O principal balizador para que um projeto seja apoiado pela ACN é sua natureza pastoral e a necessidade. Ou seja, ajudamos aqueles lugares em que os cristãos já não têm mais a quem pedir socorro. Para muitas comunidades, é quase impossível conseguir construir uma capela ou sustentar a presença de um missionário apenas com os recursos do povo. Para o processo de envio do pedido, é necessário sempre a aprovação por escrito do bispo local ou superior geral, no caso de congregações. Uma vez que o pedido chega até a nossa sede administrativa, é analisado e, se aprovado, fazemos as campanhas para que os benfeitores da ACN possam ajudar com suas doações. Afinal, são os benfeitores que fazem toda essa obra de amor acontecer.

Recentemente, o senhor foi a dioceses brasileiras e também esteve, em abril, na 60ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Nessas conversas com os bispos e com outras lideranças diocesanas, quais foram as maiores necessidades apontadas?

Eu encontrei muitas histórias da Igreja no Brasil em lugares desafiantes. Distâncias enormes, centenas de quilômetros a serem percorridos pelos padres e religiosas. Outro aspecto são as realidades culturais, diversas etnias indígenas inseridas em uma mesma diocese. Há também zonas de conflito social. Existem dioceses que estão onde há atividade de garimpo ilegal e a Igreja vive esse drama junto com a população local. Outro ponto são os lugares de violência. Muitos bispos relatam sobre a realidade das drogas e da violência gerada como uma grande chaga que afeta a vida pastoral. Mas também encontrei uma gratidão muito grande dos bispos com os benfeitores da ACN, por tudo o que estes têm feito pela Igreja que sofre no Brasil, na região Amazônica, no Sertão, do Oiapoque ao Chuí. Encontrei bispos que manifestaram, em lágrimas, a gratidão porque podem realizar seu ministério pastoral graças ao apoio de homens e mulheres generosos, os benfeitores da ACN.

A realidade pandêmica impactou a saúde de muitas pessoas e também as condições financeiras das famílias, que acabam por bater às portas das igrejas em busca de algum auxílio. Diante disso, o perfil dos projetos que requerem a ajuda da ACN aqui no Brasil mudou após o início da pandemia?

O perfil dos projetos mudou durante a pandemia. Vamos recordar que muitas paróquias ficaram sem a ajuda financeira de seus fiéis durante o isolamento. Recebemos muitos pedidos emergenciais de padres que não tinham o mínimo para continuar sua missão. Paróquias que estão nas regiões mais pobres também não tinham os meios para fazer a transmissão on-line da missa. Por isso, a ACN ajudou com muitos projetos de equipamentos para transmissão.

Já no momento atual, percebemos que os projetos são mais para manter as estruturas da Igreja, pois o Brasil – e consequentemente a Igreja – passa por um tempo econômico muito difícil. Muitos fiéis gostariam de ajudar mais a sua Igreja local, mas não têm condições. Muitos bispos me relataram que não sabem o que poderia ter acontecido nos últimos anos sem a ajuda da ACN.

Qual mensagem o senhor deixa aos que são benfeitores da ACN? E o que diz àqueles que ainda estão em dúvida se colaboram ou não com essa rede que ajuda à Igreja que sofre?

Aos benfeitores da ACN, meu muito obrigado. Qualquer ajuda nos permite dar as mãos para os que estão em necessidades. Essa doação transforma a vida das pessoas. Juntos, tornamos a Igreja mais viva e mais próxima das pessoas. Para aqueles que ainda não são benfeitores da ACN, digo que, se as necessidades da Igreja no Brasil e no mundo tocam o seu coração, torne-se um benfeitor da ACN. Precisamos de você para tornar a Igreja mais viva e dinâmica, para que muitas pessoas possam descobrir a felicidade que é ser santo.

As opiniões expressas na seção “Com a Palavra” são de responsabilidade do entrevistado e não refletem, necessariamente, os posicionamentos editoriais do jornal O SÃO PAULO.

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