Dignidade e vocação da mulher

Recentemente, ouvi de uma profissional de renomado escritório de Advocacia, com boa formação acadêmica, carreira estruturada e futuro promissor, o quanto se arrependia por ter colocado sua carreira à frente da gravidez; encontrava-se em dificuldade de engravidar após diversos tratamentos dolorosos e estressantes. Outra jovem, no mesmo período, relatou também que, em sua busca de emprego, foi aconselhada por uma headhunter a esconder sua condição de mulher recém-casada e sua potencial maternidade para não prejudicar sua construção de sua carreira. Muitas vezes, nesses contextos, a mulher é aconselhada a negar sua vontade e disposição de ser mãe.

Parece haver um desvirtuamento nessa conquista da mulher de carreira e espaço no mundo corporativo. As ideias de direitos iguais passam muito longe da dignidade da mulher. E essa visão preconceituosa sobre a mulher profissional, desapegada da família, do casamento e da maternidade, impede, muitas vezes, a mulher de estabelecer uma parte essencial de sua dignidade e de sua vocação que é a própria maternidade.

Essa afirmação do direito feminino à maternidade não significa negar a importância, na vida da mulher, do trabalho quotidiano, da dedicação da mulher a um empreendimento próprio, de sua formação acadêmica e profissional, de participação ativa nos trabalhos sociais e na política. Também não significa relativizar uma luta dura e necessária por maior proteção da mulher contra a violência doméstica e o feminicídio, por menor discriminação da mulher em seus ambientes de estudos e trabalho, e maior colaboração masculina em casa.

Todos esses relatos nos fazem lembrar dos ensinamentos de São João Paulo II, em sua carta apostólica Mulieris dignitatem, que, desde a década de 1980, fala da necessidade de reconhecimento das especificidades da situação da mulher e da vocação feminina na sociedade.

A mulher gera em seu ventre a vida humana e tem direito de proteção da vida, a partir da proteção constitucional da maternidade, incluído entre direitos sociais e reconhecido acima de qualquer circunstância, o que implica a proteção do direito da mulher para sustentar e educar seus filhos. A carreira é meio e não fim, e não pode ser justificativa para nenhuma forma de alienação, especialmente a parental.

A mulher pode se dedicar ao trabalho e desenvolver seus talentos onde e como quiser, sendo mãe de família, acompanhando seu filho ao médico, ajudando em sua lição de casa e equilibrando família e carreira. Deve, acima de tudo, ter sua dignidade reconhecida na proteção ao seu direito de ser mãe.

Sujeitar a mulher à uma escolha exclusiva maternidade versus carreira parece submetê-la a uma escolha injusta, indigna, viciada de uma vontade que não se expressa livremente. Tudo isso significa entender que o próprio Direito, ao prever que todos são iguais perante a lei, busca estabelecer uma igualdade em dignidade de ser humano, com suas vocações, em busca de oportunidades, nunca sem intervir para balancear as desigualdades.

A igualdade está em tratar desiguais desigualmente, tratar a igualdade na medida das necessidades, e não em simplesmente tratar uma mulher como se homem fosse e a obrigar a negar a maternidade e sua importância na completude de sua vida. Isso está longe de ser igualdade e longe de ser dignidade. O debate sobre direitos femininos é polêmico e sempre tende aos extremos e aos radicalismos. Algo precisa ter um equilíbrio na situação da mulher na sociedade e no Direito. A mulher deve ser livre para seu desenvolvimento e sua vocação, e o Direito deve promover sua proteção com mecanismos adequados e efetivos, respeitando diferenças e decisões. E isso nos leva a concluir pensando muito no papel do Direito na conformação dessa igualdade e na exigência de uma sociedade mais engajada, de homens e mulheres, comprometidos com a eliminação de discriminações e injustiças de longa data.

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