Damos início no domingo, 1º de dezembro, ao Advento, período em que a Igreja se veste de roxo e modera o uso dos instrumentos musicais (IGMR, n. 313), em sinal de sua espera e preparação para a alegria do Natal.
Como o Advento é um tempo litúrgico, uma boa maneira de penetrar em sua espiritualidade é por meio dos cantos que a Liturgia nos propõe para a ocasião. Pensamos em particular no Conditor Alme Siderum (“Ó doce Criador dos astros”), um dos mais antigos e veneráveis hinos do tesouro milenar da Igreja, o qual narra poeticamente toda a história do mundo, desde a criação até o fim dos tempos e a segunda vinda de Cristo. A melodia original, que data do século VII, é usada também na tradução moderna de língua inglesa, que conserva a métrica do original (“Creator of the Stars of Night”). No Brasil, ele é traduzido como “Eterna luz dos homens”, e é rezado pelos padres todos os dias do Advento, até 16 de dezembro, na oração das Vésperas.
Na sua primeira estrofe, o hino se refere à criação do mundo: “Eterna luz dos homens, / dos astros Criador, / ouvi as nossas preces, de todos Redentor”. Jesus é verdadeiramente o Criador dos astros, pois foi por meio Dele que, no princípio, tudo foi feito, quando Deus disse “Haja luz”. Mas, se Cristo é a luz do mundo, que resplandeceu nas trevas quando trouxe as primeiras estrelas à existência, bilhões de anos atrás, Ele é também a eterna luz que ilumina todos os homem que vêm a esse mundo (cf. Gn 1,1-3; Jo 1,1-9; 8,12).
A segunda e a terceira estrofes são dedicadas ao mistério da Redenção, que tem início quando Jesus se faz homem no seio de Maria: “Ao ver compadecido / do mundo a perdição, / em vosso amor viestes / trazer-lhe a salvação. / Se a sombra do pecado / a tudo escurecia, / Esposo, vós saístes / do seio de Maria”. O texto fala de um mundo novamente entregue à escuridão e à perdição, como que gemendo e em dores de parto por causa do pecado humano (cf. Rm 8,19-23), e de como Cristo resolveu vir pessoalmente para restaurar a luz ao povo que andava nas trevas e na região tenebrosa (cf. Is 9,1). A menção ao esposo que sai do seio de Maria é uma alusão ao salmo em que se diz, na mentalidade nômade da Antiguidade, que Deus dá ao sol uma tenda para descansar durante a noite, e que ao raiar da manhã Ele sai “como um esposo do quarto nupcial, como um herói exultante em seu caminho” (Sl 18,6).
A quarta estrofe fala do Triunfo Pascal de Cristo: “Ao simples ecoar / do vosso nome eterno, / joelhos vão dobrando / o céu, a terra, o inferno”. Tem-se aqui uma alusão ao hino cristológico sobre “Cristo, o Servo de Deus” (Fl 2,6-11), em que o São Paulo contrasta o rebaixamento da primeira vinda de Cristo, na manjedoura e no Calvário, com a glória que por isso recebeu do Pai. Fazendo-se homem, o Verbo eterno “esvaziou-se de sua glória e assumiu a condição de um escravo (…), obedecendo até à morte, até à morte humilhante em uma cruz” – mas justamente por causa desta humilde obediência, Cristo foi exaltado até o mais alto dos céus, para que perante Seu nome se dobre todo joelho e proclame toda língua, “Jesus Cristo é o Senhor!”.
A 5ª estrofe, por fim, se dirige ao futuro, ao fim dos tempos, quando Ele vier não mais escondido em uma gruta, mas glorioso perante toda a criação: “Um dia voltareis, / Juiz e Rei de tudo. / Oh dai-nos hoje a graça, / na tentação escudo”. De fato, o Advento tem também este sentido de espera não apenas pelo nascimento de Cristo no Natal, mas também de espera por sua segunda vinda, na Parusía. Preparemo-nos para esta chegada: é tempo de rezar mais, de praticar mais o silêncio contemplativo, de fazer um bom exame de consciência e se confessar. Desse jeito, poderemos oferecer ao Menino Deus morada em nosso coração puro – que apesar de pobre como a gruta de Belém, estará limpo e arrumado para Ele.