O ‘Covidão’ do aborto

Quem lesse de relance uma manchete como “Movimentos financiados por fundações internacionais na iminência de conseguir a legalização do aborto no Brasil” poderia inicialmente externar certo fastio: “Toda essa coisa de ‘fundações internacionais’ soa a teorias da conspiração…”

A verdade, porém, é que esta atuação, longe de teoria, é um fato confessado: a própria Fundação MacArthur, por exemplo, publicou, em 2004, o “Programa de População e Saúde Reprodutiva no Brasil – Lições Aprendidas” (disponível em inglês na internet), em que admite que “decidiu, em 1988, trabalhar em questões de população e saúde reprodutiva no Brasil (…), porque seu ambiente político-cultural permitia às ONGs influenciar a formulação e implementação de políticas públicas”. O relatório afirma, também, que a fundação “identificou algumas ONGs-chave, que poderiam valer-se de auxílio estrangeiro”, e que “a militância no Brasil concentrou-se (…) na criação de um quadro legislativo que permita às mulheres obter abortos”. Dele consta, ainda, que, entre 1990 e 2002, “a MacArthur concedeu, no Brasil, subvenções que alcançam o total de mais de 36 milhões de dólares”.

Este meticuloso ardil começou a ser implantado em nosso País a partir de uma “brecha” encontrada no Código Penal, segundo o qual “não se pune” o aborto em caso de estupro (art. 128, II). Distorcendo esta cláusula para tomá-la como hipótese de “aborto legal” (e confundindo, assim, uma excludente de punibilidade com uma excludente de ilicitude), o movimento pró-aborto começou a oferecê-lo publicamente: “O primeiro grande avanço”, diz o relatório, “ocorreu em 1989, com o estabelecimento do primeiro serviço público de fornecimento de aborto nos casos permitidos pela lei (sic)”.

Na sequência, nos governos FHC e Lula, o Ministério da Saúde editou administrativamente regulamentações para dar respaldo jurídico a este “aborto legal”. Assim, uma norma técnica de 1998 dispensava o exame de corpo de delito para a obtenção do aborto, bastando um simples Boletim de Ocorrência (B.O.), obtido unilateralmente, sem a apresentação de provas. A MacArthur reconhece que tal norma “foi sistematicamente atacada no Congresso Nacional”, mas que “apesar destas críticas, os serviços de aborto legal (sic) expandiram de quatro unidades em 1994 para 73, no fim de 2002”. Em 2004, uma nova norma técnica agravou a situação: com base numa “presunção de veracidade” das alegações da paciente, nem sequer seria necessária a lavratura de um B.O.

O golpe seguinte à ampla maioria pró-vida se deu com a chamada “Lei Cavalo de Troia” (Lei 12.845/13), a qual, a pretexto do (bastante louvável) combate à violência sexual contras as mulheres, acabou por obrigar os hospitais a fornecer “atendimento integral” – termo técnico hermético no qual se compreende o aborto – para as vítimas de “qualquer forma de atividade sexual não consentida”, mesmo que sem qualquer violência física ou psíquica. Com isso, basta que a gestante alegue que, em seu íntimo, não desejava a relação sexual, para ter imediato acesso ao aborto.

Esta é a situação em que estamos: por meio de artimanhas e subterfúgios jurídico-linguísticos, o movimento abortista conseguiu ampliar enormemente o âmbito do “aborto legal” – e hoje só não o há em maior número porque o Sistema Único de Saúde (SUS) não tem recursos financeiros para oferecê-lo em larga escala.

Neste ponto é que entra este editorial – e a sua participação, caro leitor. Com o atual cenário de saúde pública, o movimento pró-aborto tem apresentado projetos de lei, que, sob a roupagem de “medidas excepcionais de proteção à mulher”, permitirão desviar recursos de combate à pandemia para financiar abortos com dinheiro público. Neste momento delicado, urge que cada cidadão de boa vontade se manifeste a seus parlamentares, exigindo a frustração deste novo ardil abortista.

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