Liberdade de imprensa: em busca do direito à verdade

A liberdade de imprensa diz respeito à própria liberdade da pessoa humana. Deve ser ampla, muito embora não seja absoluta e ilimitada. Trata-se de um poder-dever que exige de cada um de nós a responsabilidade no agir com o outro, na escuta e na transmissão de princípios e valores; um direito, portanto, interrelacional e não autorreferencial, e que tem, ao seu lado, um dever da imprensa quanto à verdade.

A liberdade de imprensa, baluarte da liberdade, serve para que se alcance o bem comum. Caracteriza-se pela livre manifestação de pensamento, expressão e informação, sob qualquer forma, processo, meio ou veículo. A ela, portanto, não cabe embaraços, contanto que se construa em absoluto respeito ao outro, levando em consideração essa sociedade que expressa suas angústias e problemas e que busca a dignidade do homem em um contexto de fraternidade social.

Em nosso País, a liberdade de imprensa pode se sujeitar constitucionalmente a restrições em situações bastante específicas, caso, por exemplo, da decretação de um estado de sítio por comoção grave de repercussão nacional, verificação de fatos que evidenciem a ineficácia de medidas tomadas durante um estado de defesa, declaração de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira. Sem prejuízo e distante da redação constitucional, essa liberdade se encontra cada vez mais sitiada e enfraquecida, especialmente se considerarmos o estado de polarização e desrespeito à pluralidade de opiniões.

A prerrogativa de divulgar uma informação depende do testemunho da verdade que se faz cada vez mais urgente no Brasil e no mundo; todavia, tem sido usada para manobrar uma sociedade conflitual, focada em interesses individuais e de grupos, com uma leitura partidária e ideológica da realidade, servidora de propaganda de governos populistas e fomentadora de tensões sociais.

No fim, o mau uso dessa prerrogativa, com interferência na independência jornalística, tem suprimido o próprio direito à verdade na transmissão das informações, com grave afronta à cidadania, pois a liberdade de imprensa é também liberdade constitucional inerente à própria cidadania, a qual se compõe de direito de informar e de se informar.

Um recente relatório e ranking mundial de liberdade de imprensa, publicado pela associação Repórteres sem Fronteiras (Reporters sans Frontières), demonstra quantos prejuízos tivemos à liberdade de imprensa mundial com a difusão de desinformação e notícias falsas, aumento de violência, perseguição e censura contra jornalistas. Constatou, ainda, o uso da pandemia como um pretexto para obstrução da liberdade de imprensa em quase metade dos 193 países-membros da Organização das Nações Unidas. Nesse relatório, o Brasil foi considerado em situação problemática, com identificação de uma violência estrutural contra jornalistas, alvos de ataques, hostilidades e censuras, forte concentração midiática nas mãos de poucas empresas do setor privado e graves efeitos da onda de desinformação.

É preciso coragem para proteção e reconstrução de um espaço democrático, a fim de que nós, cidadãos, possamos ter a garantia do nosso direito à verdade, com justa medida e definição do dever à verdade marcante e definidor da liberdade de imprensa, não somente da imprensa tradicional, mas, também, das mídias digitais e redes sociais.

Crisleine Yamaji é advogada, doutora em Direito Civil e professora de Direito Privado. E-mail: direitosedeveresosaopaulo@gmail.com

guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
Veja todos os comentários