Os livros e o Cardeal

Ilustração Sergio Ricciuto Conte

Dom Paulo Evaristo Arns, de quem celebramos o centenário de nascimento neste mês, tem uma extensa coletânea de escritos. Ele, ao longo de sua vida, desde os anos do Centro Radiofônico Franciscano até quando se tornou Arcebispo Emérito de uma das maiores metrópoles da América Latina, publicou inúmeros artigos em jornais e revistas acadêmicas, concedeu entrevistas, redigiu livros, organizou traduções e grafou sua autobiografia. Seus textos foram vertidos para diversos idiomas, desde o italiano, passando pelo espanhol e pelo alemão até o maltês, vernáculo de um pequeno arquipélago no Mar Mediterrâneo, quiçá falado no sul da Itália ou por migrantes maltenses.

Sua extensa obra literária, associada aos seus atos e posicionamentos, diz muito a respeito do Cardeal. Eles denunciam para onde se dirigia o olhar desse grande intelectual. Homem que verteu sobre si a humildade do hábito de São Francisco, mas que também se revestiu do espírito de muitos dos grandes intelectuais de sua ordem como, entre outros, São Boaventura (que, como Dom Paulo, frequentou a Sorbonne) ou o Doctor Apostolicus Lourenço de Brindisi. Foi um homem da academia, da Igreja e do povo. 

Na sua vasta produção, encontram-se inúmeras traduções. Foi ele que verteu para a nossa língua textos como “Cartas de Santo Inácio de Antioquia”, “A Carta de São Clemente Romano” ou “Sacramentos e os mistérios”, de Santo Ambrósio. Também do bispo franciscano, quando ainda padre jovem, sob os albores do Vaticano II, do qual ele é um filho ilustre, uma das primeiras traduções para o português dos decretos Presbyterorum ordinis, Perfectae caritatis e Apostolicam actuositatem, e da Declaração Gravissimum educationis.

Não faltou em sua produção a fidelidade a sua Família Franciscana. Entre outras, publicou “Olhando o mundo como São Francisco”, “Conversas com São Francisco”, “Dez caminhos para a perfeita alegria” ou “I Poveri e la pace prima di tutto”. São textos que revelam o modo como o Bispo, que foi formado nas fileiras dos filhos do povorello de Assis, contemplava seu, assim chamado, Pai Seráfico e seu sonho para o mundo. 

Dom Paulo Evaristo Arns era filho de Francisco, mas também filho da Igreja. Por essa razão, temáticas ligadas à Igreja despontam em seus livros. Redigiu “Viver é participar”, no qual antecipava a ideia que mais tarde seria assumida pela Igreja de que a comunidade eclesial fosse pautada pela comunhão e participação. Escreveu, ainda, “O Evangelho: Incomoda? Inquieta? Interessa?”, versando sobre a questão da evangelização e repercutindo o sínodo de 1974. Advogou no opúsculo “Ministérios na Igreja” a renovação dos ministérios eclesiais. Enfim, a temática eclesiológica era uma constante de Dom Paulo.

Por fim, não faltaram livros autobiográficos. Entre os quais podem-se citar “Da esperança à utopia” ou “Corintiano, graças a Deus”. O primeiro desvela a história de um filho de colonos, que por amor a Cristo e a São Francisco, se fez frade, bispo e defensor dos pobres. O segundo, um homem que, por amor ao clube, salvou a devoção a São Jorge. Afinal, não se poderia prejudicar a Inglaterra tampouco a nação corintiana.

Enfim, vasta é a literatura do Cardeal já falecido. São mais de cinco dezenas de livros. Neste ano em que celebramos seu centenário, escolher e ler uma entre as várias obras se torna um especial caminho para conhecer e entender – e, por que não, se apaixonar? – pelo intelectual e pastor que foi Paulo Evaristo Arns. 

Padre Reuberson Ferreira, MSC, é pároco da Paróquia Nossa Senhora do Sagrado Coração e mestre e doutorando em Teologia pela PUC-SP.

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