‘Senhor, é bom ficarmos aqui’

Depois de anunciar a sua Paixão e Morte, Jesus disse aos discípulos que deveriam tomar a própria cruz e garantiu que “alguns dos que aqui estão não provarão a morte até que vejam o Filho do Homem vindo em seu reino” (Mt 16,28). Então, levou Pedro, Tiago e João “a um lugar à parte, sobre uma alta montanha” (Mt 17,1) e lhes mostrou em que consistiria tal “vinda em seu reino”: transfigurou-se, com “o rosto brilhante como o sol e as roupas brancas como a luz” (Mt 17,2). Os apóstolos saborearam um lampejo do que será o Céu, a visão beatífica. Moisés e Elias – representando a Lei e os Profetas do Antigo Testamento – falavam com Jesus. Manifestaram-se também o Pai e o Espírito Santo: “uma nuvem luminosa os cobriu com sua sombra. E da nuvem uma voz dizia: ‘Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo meu agrado’” (Mt 17,5).  

Deste modo, o Senhor quis confirmar o que pouco antes Pedro confessara – “Tu és o Cristo, Filho do Deus vivo” (Mt 16,16). Além disso, dava aos discípulos um grande conforto para que, no momento da Paixão, ao verem Jesus desfigurado e morto, não perdessem a fé. Não à toa, João seria o único apóstolo a permanecer com o Senhor no Calvário. No prólogo do seu Evangelho, recordaria: “nós vimos a sua glória, como de um Unigênito do Pai cheio de graça e verdade” (Jo 1,14). São Pedro também justificaria sua autoridade apostólica pelo fato de que “nós ouvimos a voz de Deus Pai quando ela foi dirigida do Céu, ao estarmos com Cristo na montanha santa” (2Pd 1,18).

A Transfiguração marcou de tal modo os três Apóstolos que se pode dizer que foi determinante para que suportassem as tribulações e trabalhos que lhes esperavam. Assim também em nossas vidas, o Senhor nos reserva alguns momentos de doçura e de clareza espiritual para que, nas dificuldades, nos sirvam de sustento e nos recordem o caminho a seguir. O Senhor é tão bom e solícito que, prevendo os momentos de escuridão e dor, prepara-nos previamente com a sua luz. 

Temos, porém, a oportunidade de receber cotidianamente um pouco da luz fortalecedora de Cristo, por meio dos momentos diários de oração. Podemos nos colocar em “um lugar à parte” com Jesus fazendo silêncio diante de uma imagem, visitando uma igreja para orar, rezando o Terço ou visitando o Santíssimo Sacramento. Nesses momentos, o Senhor nos ilumina, aumenta-nos a fé e fala-nos ao coração sem ruído de palavras. Empregar tempo para estar a sós com Deus, sobre a “alta montanha” da oração, é algo necessário para que permaneçamos fiéis ao Senhor mesmo que tudo se torne difícil. Por isso, Santo Afonso de Ligório dizia a famosa frase: “quem reza se salva, quem não reza se condena”. 

A oração deve ser ainda mais intensa na Quaresma! Por meio dela, Deus nos confirma na fé. Sem ela, perdemos a direção, a esperança e a caridade. Sem ela, ainda que queiramos fazer o bem, erramos! No início, a oração é difícil. Depois, com um pouco de prática, passamos a amá-la e a dizer “Senhor, é bom ficarmos aqui” (Mt 17,4)!

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