Gestão comunitária de resíduos e promoção da agricultura urbana: conheça a ‘Revolução dos Baldinhos’

Em sintonia com o tema da CF 2023, iniciativa prioriza a preservação do planeta e a produção de alimentos orgânicos para mesa de famílias carentes

Arquivo pessoal

Com o intuito de sensibilizar as famílias sobre a reciclagem das sobras de comida, a fim de transformá-las em adubo orgânico, foi criado em 2008 o projeto “Revolução dos Baldinhos” com a participação dos moradores do Complexo do Monte Cristo, na periferia de Florianópolis (SC).

O ponto de partida para o projeto foi uma infestação de ratos devido à contaminação e ao manejo incorreto do lixo no Complexo, fato que causou a morte de várias pessoas. O ‘baldinho’ foi pensado para proporcionar a compostagem comunitária e conscientizar as famílias sobre o descarte correto e o consumo consciente.

O pátio de compostagem do projeto chega a receber, em média, 2 toneladas de resíduos por semana e um total de 8 toneladas por mês. Atualmente, 2,4 mil famílias participam da iniciativa que, recentemente, recebeu da organização World Future Council (WFC) a certificação “como uma das 15 práticas agroecológicas de excelência no mundo” por utilizar “uma tecnologia social replicável” e atender a critérios de sustentabilidade da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

CUIDAR DA CASA COMUM

Segundo dados da Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), estima-se que, no Brasil, mais de 60% de todo o lixo gerado é proveniente de resíduos orgânicos, isto é, cerca de 37 milhões de toneladas. A Abrelpe destaca, ainda, que apenas 1% do que é descartado é reaproveitado por cooperativas ou instituições.

O sistema de compostagem é um dos mecanismos que vem crescendo no País, e promove vários benefícios, seja ao meio ambiente, reduzindo a geração de gás metano nocivo à atmosfera, seja para a saúde pública, qualificando os indicadores de saneamento, além de promover emprego e renda às pessoas envolvidas em projetos de compostagem.

“Nosso projeto nasceu na perspectiva da compostagem comunitária, que é considerada um dos processos mais tradicionais de recuperação do lixo orgânico e com a missão de promover a transformação da nossa comunidade, com a força da coletividade e pelo bem da nossa Casa Comum, apelo constante do Papa Francisco; de qualidade de vida e alimentação saudável”, afirmou Cíntia Cruz, líder comunitária e presidente do “Revolução dos Baldinhos”.

AGIR EM COMUNIDADE

Em entrevista ao O SÃO PAULO, Cíntia enfatizou que o sistema do “baldinho” armazena resíduos orgânicos nas casas das famílias. Estes são recolhidos por voluntários em 28 pontos de coleta espalhados pela cidade e retornam ao meio ambiente em forma de terra adubada para hortas e jardins.

A coleta acontece toda terça e sexta-feira. Os resíduos são levados para a Escola América Dutra, que funciona na comunidade e é onde acontece o tratamento, por meio da compostagem. “Quem recicla orgânicos recebe de volta o adubo, o qual é usado na produção de alimentos. E isso também deixa a cidade mais bonita, pois há a preservação de jardins particulares e públicos e o cultivo de árvores frutíferas”, destacou a líder comunitária.

“Nossa atuação vem se expandindo, pois a comunidade abraçou o projeto e acredita no seu esforço e ações realizadas”, disse Cíntia, reforçando que escolas, creches, comércios, departamentos privados e públicos pedem a ajuda do projeto na conscientização e participação no processo de triagem e coleta de resíduos, de modo que o foco da “Revolução dos Baldinhos” é a transformação das pessoas e a preservação ambiental a partir da coletividade.

ATUAÇÃO CONSCIENTE

“A comida que antes sobrava nas refeições ia direto ao lixo. Hoje, é adubo para os novos alimentos que são cultivados aqui na horta da minha casa”, afirmou Vera Lucia Veloso Farias, beneficiada pelo projeto e voluntária.

“Quando conheci o projeto, achei a ideia meio estranha, mas, a convite da Cíntia, peguei um ‘baldinho’ e comecei a coleta seletiva. Quando recebi o adubo, fiquei encantada com o resultado e, desde então, além de envolver toda a família no processo, colaboro como voluntária na cozinha comunitária do projeto”, contou Vera, enfatizando que, diariamente, são produzidas entre 150 e 200 refeições aos voluntários do projeto e pessoas em situação de vulnerabilidade das comunidades: Chico Mendes, Monte Cristo e Novo Horizonte.

Alimentos orgânicos e plantas alimentícias não convencionais (Panc’s), são cultivados em uma horta comunitária do “Revolução dos Baldinhos”, e beneficiam as famílias carentes do bairro. O projeto é sem fins lucrativos e depende de doações para manter as refeições, as doações de cestas básicas e manutenção do espaço.

RECONHECIMENTO INTERNACIONAL

Sobre a premiação na Alemanha pela organização World Future Council (WFC), Cíntia enaltece o engajamento dos voluntários, da comunidade e das famílias envolvidas e beneficiadas. “O reconhecimento internacional confirma que estamos no caminho de promoção humana e social, cuidando do nosso planeta e promovendo a agricultura urbana”, disse, recordando que é possível cultivar hortaliças e legumes em pequenos espaços, inclusive em apartamentos.

“Ver crianças e adolescentes nas escolas empenhados e introduzindo a mentalidade nas famílias é a certeza de que um mundo melhor é possível”, finalizou.

CONHEÇA O PROJETO

Instagram: @revolucaodosbaldinhos

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