Santa Sé reitera que os elementos e palavras dos ritos dos sacramentos não podem ser alterados

Vatican Media

O Dicastério para a Doutrina da Fé publicou no sábado, 3, uma nota sobre a validade dos sacramentos da Igreja. Com o título de Gestis verbisque (Com gestos e palavras), o texto, discutido e aprovado pelos cardeais e bispos membros na recente Plenária do Dicastério e pelo Papa Francisco, reitera que as fórmulas e os elementos materiais estabelecidos no rito essencial dos sacramentos não podem ser alterados por vontade própria em nome da criatividade, o que tornaria os sacramentos inválidos.

Na apresentação do documento, o Cardeal Victor Fernández, Prefeito deste Dicastério, explica que a nota se tornou necessária diante da multiplicação de “situações em que se era obrigado a constatar a invalidade dos sacramentos celebrados” com modificações que “tinham depois levado à necessidade de rastrear as pessoas envolvidas para repetir o rito do Batismo ou da Crisma, e um número significativo de fiéis expressou corretamente a sua preocupação’. São citadas alterações na fórmula do Batismo, por exemplo: “Eu te batizo em nome do Criador…” ou “Em nome do pai e da mãe… nós te batizamos”.

São circunstâncias que preocuparam também alguns sacerdotes, que “tendo sido batizados com fórmulas como essas, descobriram dolorosamente a invalidade da sua ordenação e dos sacramentos celebrados até então”. O Cardeal Fernández sublinha que “enquanto em outros âmbitos da ação pastoral da Igreja se dispõe de amplo espaço para a criatividade”, no âmbito da celebração dos sacramentos isso “transforma-se antes em uma vontade manipuladora”.

AÇÃO DE DEUS

A nota doutrinária começa recordando que, “com eventos e palavras intimamente interligadas, Deus revela e realiza o seu plano de salvação para cada homem e mulher”. O documento acrescenta que essa relação salvífica se concretiza de maneira eficaz na ação litúrgica, na qual “o anúncio da salvação, que ressoa na Palavra proclamada, encontra sua realização nos gestos sacramentais”.

O texto reconhece, contudo, que a celebração litúrgica, em particular a dos sacramentos, nem sempre se realiza em plena fidelidade aos ritos prescritos pela Igreja, e enfatiza que a Igreja “tem o dever de assegurar a prioridade do agir de Deus e de salvaguardar a unidade do Corpo de Cristo naquelas ações que não têm igual porque são sagradas “por excelência” com uma eficácia garantida pela ação sacerdotal de Cristo”.

A Igreja é, além disso, “consciente de que administrar a graça de Deus não significa apropriar-se dela, mas tornar-se instrumento do Espírito no transmitir o dom de Cristo pascal. Ela sabe, em particular, que a sua potestade em relação aos sacramentos para diante da sua substância” e que “nos gestos sacramentais ela deve salvaguardar os gestos salvíficos que Jesus lhe confiou”.

MATÉRIA E FORMA

A nota explica, ainda, que a matéria do sacramento consiste na ação humana por meio da qual Cristo age. “Nela, às vezes, está presente um elemento material (água, pão, vinho, óleo), outras vezes um gesto particularmente eloquente (sinal da cruz, imposição de mãos, imersão, infusão, consentimento, unção)”.

Quanto à forma do sacramento, essa é constituída pela palavra, que confere um significado transcendente à matéria, “transfigurando o significado ordinário do elemento material e o sentido puramente humano da ação realizada”. Tal palavra, continua o texto, “inspira-se sempre, em vários graus, na Sagrada Escritura, alicerça suas raízes na viva Tradição eclesial e foi definida com autoridade pelo Magistério da Igreja”. Nesse sentido, o documento salienta que matéria e forma “nunca dependeram e não podem depender da vontade de um único indivíduo ou de uma única comunidade”.

O documento reitera que “para todos os sacramentos, em cada caso, sempre foi exigida a observância da matéria e da forma para a validade da celebração, com a consciência de que modificações arbitrárias de uma e/ou de outra – cuja gravidade e força que invalidam são verificadas de tempos em tempos comprometem a efetiva concessão da graça sacramental, com evidente dano aos fiéis”. Portanto, o que se lê nos livros litúrgicos promulgados deve ser fielmente observado, sem “acrescentar, retirar ou alterar nada”.

ADAPTAÇÕES PERMITIDAS

A nota doutrinal reconhece que a própria liturgia permite uma variedade que preserva a Igreja da ‘rigidez uniforme’, lembrando que o Concílio Vaticano II estabeleceu que, “salvaguardada a substancial unidade do rito romano, mesmo na revisão dos livros litúrgicos, se de lugar às legítimas diversidades e adaptações legítimas aos vários grupos étnicos, regiões, povos, principalmente nas missões”.

“Nesse sentido, a reforma litúrgica desejada pelo Concílio Vaticano II não apenas autorizou as conferências episcopais a introduzirem adaptações gerais à edição típica latina, mas também previu a possibilidade de adaptações particulares por parte do ministro da celebração, com o único propósito de atender às necessidades pastorais e espirituais dos fiéis”, acrescenta.

No entanto, o documento enfatiza que, para que a variedade “não prejudique a unidade, mas a sirva”, fica claro que, fora dos casos expressamente indicados nos livros litúrgicos, “regular a sagrada Liturgia compete exclusivamente à autoridade da Igreja”, que reside, dependendo das circunstâncias, no Bispo, na assembleia episcopal territorial, na Sé Apostólica. Por isso, a nota frisa ser evidente que “modificar por iniciativa própria a forma celebrativa de um Sacramento não constitui simples abuso litúrgico, como transgressão de uma norma positiva, mas uma lesão simultânea à comunhão eclesial e à reconhecibilidade da ação de Cristo, o que, nos casos mais graves, torna inválido o próprio Sacramento, por que a natureza da ação ministerial exige transmitir com fidelidade o que foi recebido (cf. 1Cor 15,3)”.

NA ARQUIDIOCESE

A publicação da nota doutrinária Gestis verbisque acontece em uma ocasião oportuna para a Arquidiocese de São Paulo, que acaba de promulgar o seu Diretório da Pastoral dos Sacramentos. O documento, que entrou em vigor no dia 25 de janeiro, é fruto da reflexão efetuada durante o 1º sínodo arquidiocesano de São Paulo, no qual foi enfatizada a necessidade de valorizar os sacramentos da Igreja em sua vida pastoral, assim como a necessidade de motivar e orientar os fiéis para sua celebração frutuosa.

Na apresentação do Diretório, o Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo, afirma que “sem os sacramentos devidamente celebrados, corremos o risco de transformar a vida cristã em mera ideia e ação humana, pretendendo dar eficiência à vida cristã a prescindir da graça de Deus”.

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