Presépio: a tradição que anuncia a natividade de Jesus

‘Montagem em família e nas escolas pode se tornar um processo catequético sobre o advento e o mistério da salvação’

Ira Romão – dez.2021

No 1º Domingo do Advento, tempo de espera e preparação para o nascimento de Jesus, a Igreja convida os fiéis a uma manifestação visível da fé, com a montagem dos presépios nas paróquias, comunidades, casas e outros espaços privados e públicos.

“Representar o acontecimento da natividade de Jesus equivale a anunciar, com simplicidade e alegria, o mistério da encarnação do Filho de Deus. De fato, o presépio é como um Evangelho vivo que transvaza das páginas da Sagrada Escritura. Ao mesmo tempo em que contemplamos a representação do Natal, somos convidados a colocar-nos espiritualmente a caminho, atraídos pela humildade Daquele que se fez homem a fim de se encontrar com todo o homem, e a descobrirmos que nos ama tanto, que se uniu a nós para podermos, também nós, unir-nos a Ele”, escreveu, em 2019, o Papa Francisco na carta apostólica Admirabile signum (AS), sobre o significado e valor do presépio.

ORIGENS

A montagem do presépio tal qual se conhece atualmente foi iniciada por São Francisco de Assis (1182-1226). No ano de 1223, na cidade de Greccio, na Itália, ele organizou, na noite de Natal, uma encenação sobre o nascimento de Jesus, que foi pouco a pouco sendo propagada em todo o mundo pelos frades franciscanos.

Tomás de Celano, o primeiro biógrafo de São Francisco, conta que 15 dias antes do Natal daquele ano, o Santo pediu a um homem chamado João para que lhe ajudasse a representar de algum modo, “‘com os olhos corporais, os apuros e necessidades da infância dele [Jesus], como foi reclinado no presépio e como, estando presentes o boi e o burro, foi colocado sobre o feno’. O bom e fiel homem, ouvindo isso, correu mais apressadamente e preparou no predito lugar tudo o que o Santo dissera”. Celano prossegue o relato dizendo que, chegado o dia do Natal, “o bosque faz ressoar as vozes, e as rochas respondem aos que se rejubilam. Os irmãos cantam, rendendo os devidos louvores ao Senhor, e toda a noite dança de júbilo”.

CRISTO NASCE EM TODOS OS LARES

A montagem do presépio é uma tradição que atravessa gerações. O casal Paulo dos Santos e Karen Eufrosino dos Santos sempre reserva tempo para no 1o ou no 2o Domingo do Advento fazer a preparação do presépio, na companhia do filho, Thiago, 7.

“Nosso presépio tem peças de mais de 70 anos, outras com 53 anos e algumas mais novas. A tradição veio da minha avó, depois da minha mãe. Quando eu era criança, o presépio tinha mais de um metro de comprimento, tinha lagoa com cisne, poço, flautista, gruta feita de papel pedra”, recordou Karen ao O SÃO PAULO.

Ela comentou que, ao longo dos anos, algumas peças precisaram ser trocadas e que hoje o presépio é montado em um espaço menor do que antes, mas tem o devido destaque na casa neste período em que a família também monta a coroa do Advento e reza a novena de Natal.

 “Na montagem do presépio, sempre há espaço para explicações ao nosso filho, aproveitamos para fazer o passo a passo do nascimento de Jesus. É um momento de alegria”, relatou Karen.

 Também na casa da família Pito, o começo de dezembro é destinado à montagem do presépio, com o envolvimento de todos: os pais – Christian e Vanessa – e as filhas – Luiza, 10, e Catarina, 7.

“Montamos duas árvores de Natal: a das crianças e a da decoração geral. A área das crianças fica na sala de estar, com uma árvore feita em feltro e com enfeites pendurados que representam os reis magos, Nossa Senhora, São José, o Anjo, os animais e a estrela. As meninas colocam luzes também. No presépio, as personagens têm cara de crianças”, detalhou Vanessa Henriques Pito.

“As crianças entendem o sentido do Natal, e se preparam conosco, participam da novena, do Advento nas missas e têm pleno conhecimento de que o Natal faz memória ao nascimento do Menino Jesus, nosso Salvador! ”, prosseguiu Vanessa, paroquiana da Paróquia Santa Teresinha, na Região Santana.

Presépio montado na casa da filha Pito (Arquivo pessoal)

UMA ESCOLA DE VIRTUDES

A montagem de presépios também é uma prática comum em colégios católicos, como é o caso da Escola Maria Rainha do Amor, no Jardim Peri, na zona Norte, mantida pela Congregação dos Humildes Servos da Rainha do Amor.

Não se trata, porém, de uma simples ornamentação para o Natal. Os cerca de 150 estudantes do 1o ao 5o ano do ensino fundamental, antes de montarem o presépio, entendem as origens dessa tradição e o significado de cada um dos elementos.

“Primeiro, fazemos o ‘presépio espiritual’, explicando o que representam os pastores, os animais, a manjedoura. Procuramos fazer com que entendam, por exemplo, que os animais indicam a humildade, e, assim, estimulamos que ao longo da vida os estudantes procurem essa virtude. Portanto, não se trata apenas de ter o presépio montado visualmente, mas, sim, de interiormente estar pronto para acolher o Menino Jesus”, detalhou a Irmã Esperança Maria de Jesus, que participa da orientação aos estudantes.

O processo de montagem dos presépios na escola dura aproximadamente duas semanas. Depois, cada estudante leva o presépio que confeccionou para casa. “Nós propomos que a família possa acolher em algum momento de oração este presépio feito pela criança”, prosseguiu a religiosa, que recentemente orientou os estudantes a se caracterizarem com os seus santos e beatos de devoção para celebrar o Dia de Todos os Santos, em 1o de novembro.

A TRANSMISSÃO DA FÉ A PARTIR DO PRESÉPIO

Na carta apostólica Admirabile signum, o Papa Francisco indica que “o presépio faz parte do suave e exigente processo de transmissão da fé. A partir da infância e, depois, em cada idade da vida, educa- -nos para contemplar Jesus, sentir o amor de Deus por nós, sentir e acreditar que Deus está conosco e nós estamos com Ele, todos filhos e irmãos graças àquele Menino Filho de Deus e da Virgem Maria. E educa para sentir que nisto está a felicidade” (AS,10).

O Pontífice também expressa o desejo de que essa prática, repassada às novas gerações pelos pais e avós, nunca desapareça; “e mais, espero que a mesma, onde porventura tenha caído em desuso, se possa redescobrir e revitalizar” (AS,1).

O Santo Padre também reflete sobre o porquê de o presépio tanto comover a quem o vê: “Antes de mais nada, porque manifesta a ternura de Deus. Ele, o Criador do universo, abaixa-se até à nossa pequenez. O dom da vida, sempre misterioso para nós, fascina-nos ainda mais ao vermos que Aquele que nasceu de Maria é a fonte e o sustento de toda a vida” (AS,3).

NOVENA DE NATAL

Além da montagem do presépio, todas as famílias e comunidades são chamadas a realizar a novena de Natal. Na Arquidiocese de São Paulo, um subsídio foi produzido para que seja bem celebrada ao longo de nove encontros. O livreto pode ser adquirido em todas as paróquias.

Este ano, o subsídio tem como tema “Deus vem ao nosso encontro”, e, conforme declarou o Cardeal Scherer, Arcebispo Metropolitano, em coletiva de imprensa em outubro, trata-se de uma temática que lembra os fatos e pessoas que envolveram o nascimento de Jesus, e que “Deus também vem ao nosso encontro hoje e nos chama a nos envolvermos no evento que marcou e continua a marcar a história da humanidade”.

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