
Na quinta-feira, 13, a Igreja celebra a memória de Nossa Senhora de Fátima, recordando as aparições da Virgem Maria em um pequeno vilarejo português, há 104 anos.
Em um ambiente simples e pobre, em Portugal, no início do século XX, não se poderia imaginar que teria início uma história de fé que ficaria conhecida em todo o mundo. Tudo começou em 1916, quando um anjo, que se identificou como Anjo de Portugal, apareceu a três pastorinhos que ajudavam seus pais com o rebanho, na distante Cova da Iria. Ali, onde hoje está a cidade e o Santuário de Fátima, morava a família de Lúcia, a mais velha dentre as três crianças para quem aconteceram as aparições.
Após a aparição do anjo, conhecida como período angélico, começou o período mariano, quando, em 1917, Nossa Senhora apareceu a eles por seis vezes. Lúcia, que na época tinha 10 anos, e seus primos Francisco, com 9, e Jacinta, com 7, receberam a mensagem na qual a “Senhora mais brilhante que o Sol” pedia orações, sacrifícios e reparação das ofensas ao seu Imaculado Coração e a Deus.
Aparições
A primeira aparição de Maria ocorreu no dia 13 de maio de 1917, quando Nossa Senhora pediu a Lúcia, Jacinta e Francisco que fossem à Cova da Iria durante seis meses consecutivos, a cada dia 13, sempre na mesma hora. Pediu também que rezassem o Terço pedindo o fim da Guerra – o mundo estava vivendo a Primeira Guerra Mundial (1914-1918).
“Era uma senhora toda vestida de branco, mais resplandecente que o sol, que difundia uma luz mais clara e in- tensa que um copo de cristal cheio de água pura, e atravessado pelos raios do sol mais ardente.” Assim Lúcia descreveu a Senhora que a eles apareceu, em suas memórias, escritas anos depois.

No mês seguinte, acompanhados por uma centena de pessoas, os três receberam de novo o pedido de rezar o Terço, e para que aprendessem a ler e a escrever. Naquele dia, souberam também que Francisco e Jacinta teriam uma vida curta e que Lúcia estaria destinada à missão de dar a conhecer as revelações de Nossa Senhora ao mundo. Lúcia podia ver, ou- vir e falar durante as aparições, enquanto Jacinta podia ver e ouvir; Francisco podia apenas ver, e depois a prima e a irmã lhe relatavam o que tinham ouvido.
Já na terceira vez que Nossa Senhora apareceu na Cova da Iria, no dia 13 de julho –, estima-se que havia de 2 a 5 mil pessoas. Mas foi no mês seguinte que Lúcia, Jacinta e Francisco tiveram uma visão do inferno, e que a Virgem anunciou que a guerra iria acabar, mas que um novo conflito, ainda pior, teria início. Assim, para evitar essa guerra, Nossa Senhora disse às três crianças que viria a Fátima pedir a consagração da Rússia ao seu Imaculado Coração.
Na penúltima vez que a Senhora apareceu a eles, anunciou que, em outubro, Nosso Senhor, Nossa Senhora das Dores e do Carmo e São José com o Menino Jesus, viriam abençoar o mundo. Assim, na sexta e última aparição, no dia 13 de outubro, cerca de 70 mil pessoas se reuniram para ver Nossa Senhora, que se deu a conhecer como Senhora do Rosário e anunciou que logo a guerra teria fim.
Os detalhes contados por Lúcia em suas memórias tornam os momentos das aparições cheios de beleza, a beleza própria de uma criança que crê. “O rosto indescritivelmente belo não parece tris- te nem alegre, mas sério, com um tom doce. As mãos unidas como em oração, apoiadas sobre o seio e direcionadas para o alto. Na mão direita, segurava um rosário. As roupas pareciam feitas somente de luz. A túnica branca, e ornada com ouro.”
O segredo
O Segredo de Fátima consiste em revelações feitas por Nossa Senhora aos três pastorinhos durante as aparições, e está dividido em três partes. Lúcia guardou as palavras da Senhora do Rosário e só as revelou quando, segundo ela mesma, recebeu “autorização do céu”.
A primeira parte do Segredo de Fátima é sobre a visão do inferno. A segunda diz respeito à devoção e à consagração ao Imaculado Coração de Maria e à conversão da Rússia. Segundo as memórias escritas por Lúcia em 1942, o país precisaria se converter e consagrar o primeiro sábado de cada mês à Nossa Senhora ou, do contrário, espalharia seus erros por guerra. Já a terceira parte refere-se à Igreja peregrina e mártir. Papa, bispos, religiosos e religiosas subiam uma montanha, onde estaria uma grande cruz. Essa procissão, que tinha o papa à frente, passou por uma cidade em ruínas, onde ha- via vários cadáveres e, ao chegar no topo da montanha, atacado por tiros e flechas, o pontífice foi morto junto com aqueles que o acompanhavam.
No mês de abril de 2000, no Carmelo de Coimbra, durante conversa com o Cardeal Tarcisio Bertone, então secretário da Congregação para a Doutrina da Fé, a Irmã Lúcia concordou que a terceira parte do Segredo consiste numa visão profética, sobre- tudo a respeito da luta do comunismo ateu contra a Igreja.
Canonização dos pastorinhos
A partir da primeira Aparição de Nossa Senhora, a vida de Lúcia e dos seus primos transformou-se completamente. Além das orações e sacrifícios cotidianos, eles eram constantemente interrogados sobre as aparições e até acusados de mentirosos. Por isso, Lúcia de Jesus foi recolhida no Asilo de Vilar, no Porto, depois da última aparição, em outubro de 1917 e, a partir daí, começou uma vida retirada que a levou a seguir a vocação religiosa na clausura do Carmelo de Santa Teresa, em Coimbra, onde permaneceu até à sua morte, em 13 de fevereiro de 2005.
Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado, nome que adotou quando professou os seus votos perpétuos, deixou numerosos escritos, incluindo suas memórias, escritas a pedido do bispo de Leiria e redigidas entre dezembro de
1935 e março de 1992. A fase diocesana do processo de canonização de Lúcia foi aberta por Dom Albino Cleto, em 30 de abril de 2008, e a sua conclusão foi anunciada em 13 de janeiro de 2017. A sessão solene de encerramento do processo aconteceu no dia 13 de fevereiro de 2017, nove anos depois do seu início e 12 anos após a morte de Lúcia.

Sobre a vida dos futuros santos, Francisco Marto e Santa Jacinta Marto, há poucos registros biográficos. Nascidos em Aljustrel, assim como Lúcia, eles morreram pouco tempo depois das aparições. Mas o curto tempo de vida foi suficiente para que a Igreja reconheces- se, pela primeira vez na sua história, a “heroicidade das virtudes e a maturidade de fé de crianças não mártires”, como afirmou São João Paulo II, num decreto escrito no dia 13 de maio de 1989.
Francisco morreu no dia 4 de abril de 1919, vítima da epidemia da gripe pneumônica que assolou o país, que ficou conhecida como “gripe espanhola”. Jacinta Marto, por sua vez, não chegou aos 10 anos de idade, tendo falecido em Lisboa, no dia 20 de fevereiro de 1920, também vítima da gripe espanhola.
A canonização dos dois pastorinhos aconteceu em Fátima, Portugal, no dia 13 de maio de 2017, em uma celebração presidida pelo Papa Francisco, durante as comemorações do centenário das aparições de Nossa Senhora. Eles serão os mais jovens santos não mártires da história da Igreja Católica.
Revelações públicas e privadas
No documento “A mensagem de Fátima”, publicado integralmente no site do Vaticano, o então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Cardeal Joseph Ratzinger (hoje, Papa Emérito Bento XVI), explica que a doutrina da Igreja distingue revelação pública e revelações privadas; entre as duas realidades existe uma diferença essencial. A noção de revelação pública designa a ação reveladora de Deus que se destina à humanidade inteira e está expressa literariamente nas duas partes da Bíblia: o Antigo e o Novo Testamento. Chama-se revelação, porque nela Deus deu-se a conhecer progressivamente aos homens, até ao ponto de ele mesmo se tornar homem, em Jesus Cristo.
“No entanto, apesar de a Revelação ter acabado, não quer dizer que este- ja completamente explicitada”, afirma o Catecismo da Igreja Católica. Nesse contexto, torna-se possível compreender corretamente o conceito de revelação privada, que se aplica a todas as visões e revelações verificadas depois da conclusão do Novo Testamento; nessa categoria, portanto, se deve colocar a mensagem de Fátima.
O texto é também composto por explicações sobre o “Segredo de Fátima”, bem como um extenso comentário teológico sobre as aparições e todas as mensagens decorrentes delas ao longo do tempo.
(Adaptado de texto de Nayá Fernandes, publicado originalmente em 15 de maio de 2017)