Dom Odilo: 20 anos como sucessor dos apóstolos na grande metrópole

Cardeal Cláudio Hummes impõe a mitra em Dom Odilo Scherer, durante sua ordenação episcopal, em 2 de fevereiro de 2002 (foto: Arquivo Pessoal)

Era uma tarde de domingo entre o fim de fevereiro e o início de março de 2002, quando dois jovens estudantes do Ensino Médio avistaram um Bispo que parecia perdido no meio da multidão na estão Sé do Metrô. Com uma mala, ele acabara de vir da rodoviária da Barra Funda onde desembarcou do ônibus que o trouxe de uma visita à família no Paraná.

Era Dom Odilo Pedro Scherer, recém-nomeado Bispo Auxiliar de São Paulo, que havia recebido a ordenação episcopal semanas antes. “Disseram-me que com o Metrô de São Paulo se chega a qualquer lugar da cidade. Então, decidi experimentar. Sabem em que direção embarco para Santana?”, perguntou com um sorriso tímido aos jovens que logo o reconheceram e o acompanharam até a estação da zona Norte que também era o destino deles.

No caminho, o Bispo contava que ainda estava se adaptando à metrópole totalmente nova para ele. Havia feito a mudança havia poucos dias, mas ainda precisava organizar as coisas em casa, principalmente seus livros. Depois disso, iria começar o trabalho.

“Pronto! Chegamos. O senhor vai tomar um táxi?”, perguntaram os jovens. “Não é necessário. Minha casa é perto. Só preciso recordar agora para que lado é… Sim. É nesta direção”, respondeu Dom Odilo, acompanhado pelos estudantes nos dez minutos de caminhada até o início da rua Frei Vicente Salvador, onde se despediu deles e subiu com sua mala a íngreme ladeira até a casa onde morava na época.

A imagem daquele desconhecido Bispo, há 20 anos, no meio da multidão na principal estação de Metrô de São Paulo gravada na memória daqueles jovens – dos quais um é o autor desta reportagem – simboliza o que viria a ser a missão de Dom Odilo na maior metrópole do Brasil.

Cinco anos depois, também na Sé, entretanto dessa vez na imponente Catedral sob a qual a estação do metrô foi construída, Dom Odilo tomava posse como 7º Arcebispo Metropolitano de São Paulo, em 29 de abril de 2007.

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O que é um bispo?

Bispo auxiliar

Gaúcho de Cerro Largo, o filho de Edwino Scherer e Francisca Wilma Steffens Scherer, Dom Odilo nasceu em 21 de setembro de 1949. Cresceu em Toledo (PR), onde foi ordenado sacerdote em 7 de dezembro de 1976. Nessa Diocese, exerceu diversas funções pastorais.

Quando foi nomeado Bispo Auxiliar de São Paulo por São João Paulo II, em 28 de novembro de 2001, Dom Odilo era oficial da Congregação para os Bispos, no Vaticano, e colaborava em duas paróquias de Roma.

Scherer recebeu a ordenação episcopal na Catedral de Toledo, tendo como ordenante principal, o então Arcebispo de São Paulo, Cardeal Cláudio Hummes, e como coordenantes, Dom Armando Círio, Arcebispo Emérito de Cascavel (PR), e Dom Anuar Battisti, então Bispo de Toledo e atual Arcebispo Emérito de Maringá (PR).

Como Bispo Auxiliar da Arquidiocese, Dom Odilo foi designado Vigário Episcopal para a Região Santana, função que exerceu até 2005. Entre 2003 e 2007, também foi secretário-geral da CNBB.

Posse de Dom Odilo como Arcebispo de São Paulo em 2007 (foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

Arcebispo

Em 20 de março de 2007, com a nomeação de Dom Cláudio Hummes como Prefeito da Congregação para o Clero, no Vaticano, o Papa Bento XVI nomeou Dom Odilo como arcebispo de São Paulo.

Em maio do mesmo ano, o novo Arcebispo teve a missão de acolher Bento XVI em sua visita a São Paulo, ocasião em que foi canonizado Santo Antonio de Sant’Anna Galvão, no Campo de Marte. Em seguida, participou da V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, em Aparecida (SP), da qual foi Secretário-Geral Adjunto. 

Em 24 de novembro de 2007, o Santo Padre o tornou Cardeal com o título de Sant’Andrea al Quirinale. É membro de diversos organismos da Cúria Romana, participou do conclave em elegeu o Papa Francisco, em 2013, além de participar dos Sínodos dos Bispos de 2008, 2012, 2014 e 2015. Desde 2019, é o 1º Vice Presidente do Conselho Episcopal Latino Americano (Celam).

‘Deus habita esta cidade’

Como Arcebispo, o Cardeal Scherer celebrou, em 2008, o centenário da Arquidiocese. Essas comemorações tiveram como referência o versículo bíblico “Deus habita esta cidade” (Sl 47,9) que logo se tornou um lema para a vida e a missão da Igreja em São Paulo. 

Em 2010, Dom Odilo convocou o 1º Congresso Arquidiocesano de Leigos, com o objetivo aprofundar a reflexão sobre a vida e a missão dos cristãos leigos na Igreja e na sociedade com “sal da terra a luz do mundo”.

Preocupações de pastor

Por meio de suas cinco cartas pastorais, é possível compreender as questões que inquietam o coração do pastor da maior Arquidiocese do Brasil. 

Na primeira delas, intitulada “Paróquia, torna-te o que tu és”, publicada em 2011, Dom Odilo dedicou sua atenção às paróquias propondo uma renovação pastoral para que essa realidade eclesial correspondesse cada vez mais à sua missão. Ele enfatizou que a paróquia é “o rosto mais visível e concreto do mistério da Igreja, ‘Sacramento da salvação’ no mundo”.

Na segunda carta, em 2012, por ocasião do Ano da Fé, Dom Odilo motivou todo o povo da Arquidiocese a renovar o conhecimento e apreço pela fé que a Igreja recebeu dos apóstolos e é chamada a transmitir. “Quero, pois, fazer um apelo, que pode soar como um desafio: cada católico praticante, durante o ano, traga para a prática da fé mais um irmão católico não praticante. Com todo o respeito pela liberdade de consciência do próximo, mas também com todo o zelo de quem quer lhe fazer um imenso bem, fale de sua fé, de nossa fé, das coisas bonitas da fé da Igreja”, exortou.

Em 2016, motivado pelo Jubileu Extraordinário da Misericórdia, convocado pelo Papa Francisco, o Arcebispo escreveu a carta na qual sublinhou que a misericórdia não é para algo opcional ou secundário para os cristãos, mas uma firme recomendação de Jesus, que exorta todos a serem “misericordiosos como o Pai é misericordioso” (Lc 6,36).

No ano seguinte, 2017, por ocasião dos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida, Dom Odilo escreveu a carta “Viva a mãe de Deus e nossa!”, recordando o papel da Virgem Maria na vida da Igreja e a estreita relação da padroeira do Brasil com a Arquidiocese de São Paulo, cujo território abrangia a região onde hoje está a cidade de Aparecida (SP).

Celebração de bertura do sínodo arquidiocesano em 2018 (foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

Sínodo arquidiocesano    

Em 2017, o Cardeal Scherer vez uma proposta audaciosa: a realização de sínodo arquidiocesano, convidando a Igreja em São Paulo a “olhar-se no espelho”, refletir sobre sua presença e missão da cidade, perguntar-se se a atual organização pastoral, administrativa correspondem aos desafios atuais da sociedade.

O sínodo tem como tema “Caminho de comunhão, conversão e renovação missionária” e o lema retoma o mote do centenário: “Deus habita esta cidade, somos suas testemunhas”.

“A mudança de época em curso na sociedade e na cultura também atinge fortemente a vida eclesial e seus efeitos aparecem numa persistente crise de fé religiosa, na adesão sempre menor à vida eclesial e no progressivo abandono da Igreja e até da fé cristã. Essa crise não atinge apenas a nossa Arquidiocese, mas a Igreja Católica em várias partes do mundo”, manifestou o Arcebispo, ao convocar o sínodo.

Nova evangelização

Na sua quinta carta pastoral, publicada em 2019, o Cardeal Scherer propõe a revisão do caminho já realizado durante o sínodo e apontar os novos passos que devem ser dados em 2019. “Será que a preocupação com a ‘nova evangelização’ e a ‘conversão pastoral e missionária’ já chegou às nossas comunidades e conseguiu mudar alguma coisa nas bases concretas da nossa Igreja em São Paulo?”. E convida as comunidades a uma reflexão: “Perguntemo-nos: o que ficou e mudou em nossas comunidades a partir da Conferência de Aparecida, em 2007?”, escreveu

Prevista para acontecer em 2020, a assembleia sinodal arquidiocesana, última etapa do sínodo, foi suspensa devido à pandemia de COVID-19. A expectativa é que o processo reja retomado 2022.

‘Pai espiritual’

Em 20 anos de episcopado, Dom Odilo marcou a vida a história de inúmeros católicos que vivem na cidade, inclusive, de alguns jovens que hoje se tornaram padres. Um deles é o Padre João Henrique Novo do Prado, que conheceu Dom Odilo ainda na adolescência, na Paróquia Nossa Senhora das Neves, na Região Episcopal Santana. Lá ele chegou a ajudar como coroinha em celebrações presisida pelo então Bispo Auxiliar, de quem recebeu o sacramento da Crisma em 2005, aos 15 anos. Nessa ocasião, o jovem nem imaginava que 10 anos depois, o mesmo Dom Odilo o ungiria novamente com o óleo do Crisma, dessa vez em suas mãos, na ordenação sacerdotal.

Padre João destacou ao O SÃO PAULO que, nesta ocasião, ele já sentia o chamado para o sacerdócio. No entanto, ele ressaltou que após receber a Crisma teve maior convicção vocacional. “Não só me senti confirmado nas promessas batismais, como também na vocação. Por isso, receber esse sacramento foi uma experiência muito forte para mim”, disse.

Cardeal Scherer preside ordenações na Catedral (foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

O Padre Álvaro Moreira Gonçalves também recebeu a Crisma do Cardeal Scherer, em 2009, na Paróquia São José, em Perus, na Região Episcopal Brasilândia. Na ocasião com 15 anos, o jovem discernia sobre a vocação sacerdotal e considerou este sacramento como um “impulso na vivência e testemunho da fé” e oportunidade para fazer um bom discernimento para compreender a melhor maneira de realizar a vontade de Deus.

“É uma sensação de crescer e ser confirmado na fé, com a responsabilidade de vivê-la e testemunhá-la, levando isso à radicalidade, agora, colaborando com sua missão mais diretamente na Arquidiocese. Sinto um forte vínculo espiritual, justamente por esse crescimento, e perceber o quanto Dom Odilo marcou minha história e sou grato a Deus por isso”, salientou Padre Álvaro, ordenado sacerdote no dia 4 de dezembro de 2021.  

“A Igreja, nos seus documentos, mostra-nos a importância da paternidade espiritual do bispo. Em relação a Dom Odilo, eu percebo muito isso. Eu o vejo como um pai na fé. Ele não só me crismou como também me conferiu os ministérios de leitor e acólito e, depois, ordenou-me diácono e sacerdote. Para mim, é uma alegria muito grande tê-lo presente em minha vida e poder colaborar com ele como ministro ordenado no serviço ao povo de Deus nesta Arquidiocese”, completou Padre João.

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