Cardeais brasileiros: Conclave foi tranquilo e o Papa Leão XIV é acima de tudo um missionário

Os cardeais brasileiros que participaram do Conclave que resultou na eleição do Papa Leão XIV manifestaram satisfação com a escolha, enfatizaram que o então Cardeal Robert Francis Prevost se destacou por sua experiência pastoral e missionária e desmentiram rumores sobre as dinâmicas “hollywoodianas” do Conclave. Eles atenderam os jornalistas em coletiva de imprensa na sexta-feira, 9, no Colégio Pio Brasileiro, em Roma.

Coletiva de imprensa no Colégio Pio Brasileiro (fotos: Padre Robson Caramano)

Compareceram ao evento seis cardeais eleitores Dom Jaime Spengler (Arcebispo de Porto Alegre, Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e Presidente do Conselho Episcopal Latino-americano), Dom Odilo Pedro Scherer (Arcebispo de São Paulo) Dom Orani João Tempesta (Arcebispo do Rio de Janeiro), Dom Sérgio da Rocha (Arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil), Dom Paulo Cezar da Costa (Arcebispo de Brasília) e Dom Leonardo Steiner (Arcebispo de Manaus); além de Dom Raymundo Damasceno (Arcebispo emérito de Aparecida), que não participou do Conclave, pois já tem mais de 80 anos.

Dom Odilo Pedro Scherer, o único presente que participou tanto do Conclave atual quanto daquele de 2013, que elegeu o Papa Francisco, afirmou em sua fala inicial que se tratou de uma “experiência única e muito forte”. Ele disse que, muitas vezes, há uma “imaginação muito fértil” na discussão pública sobre o conclave – dessa vez em grande parte influenciada também pelo filme “Conclave” –, mas, na verdade, o Conclave é “uma celebração”.

“É uma celebração precedida por dez, doze dias de reflexão, partilha, consideração sobre o estado da Igreja, a situação do mundo. Fazendo isso, os cardeais, ao mesmo tempo, traçam o perfil do futuro Papa. Como deveria ser o futuro Papa? Pensam nisso sem expressar de forma direta [o nome do cardeal a ser eleito]”, explicou. “Assim, vai se formando uma consciência sobre a pessoa que precisa ser escolhida.”

O Cardeal Scherer enfatizou que as votações são sempre intercaladas por momentos de oração e, nos intervalos, os cardeais conversam. “Isso é previsto, para amoldarem suas visões, sem que isso se torne um comício ou uma negociação. Isso não existe. O mais forte para mim foi o fato de termos uma responsabilidade enorme. Realizamos um ato humano, mas que deve ser orientado por critérios da fé que motivam nossa vida como Igreja”, declarou.

UM PAPA NORTE-AMERICANO?

O então Cardeal Robert Francis Prevost, o primeiro norte-americano eleito Pontífice, apresentava diferentes qualidades de um bom Papa: tem ampla experiência pastoral e de governo, com vivência tanto nos Estados Unidos, onde nasceu e viveu até os 27 anos de idade; no Peru, onde foi sacerdote e bispo; e também em Roma, onde baseou-se durante os 12 anos em que foi o padre geral da Ordem de Santo Agostinho.

Também é um poliglota e se expressa bem em inglês, espanhol, italiano, francês e português, além de ler latim e alemão. Além disso, tem um doutorado em Direito Canônico, algo que lhe dá vantagem na leitura das normas da Igreja.

Antes de sua eleição, entretanto, a sua nacionalidade norte-americana parecia ser um obstáculo – historicamente, dada a grande influência geopolítica e militar dos Estados Unidos no mundo. Até então, jamais havia sido escolhido um Pontífice proveniente desse país.

Perguntado por O SÃO PAULO sobre isso, o Cardeal Jaime Spengler respondeu: “A genética dele é francesa e espanhola, a nacionalidade é americana; como missionário, é latino-americano; como bispo, é profundamente latino-americano; e, como superior dos agostinianos, foi extremamente universal. É um privilégio termos como papa um homem com essa visão de mundo que ele tem.”

Nesse sentido, o Cardeal Prevost foi mais descrito como “missionário” ou “latino-americano”, em virtude de ter vivido quase 30 anos de sua vida no Peru.

“Tivemos um Papa latino-americano da Argentina e agora um Papa latino-americano do Peru”, resumiu o Cardeal Sérgio da Rocha. “Ele era bispo e missionário ali. Isso mostra a importância e responsabilidade que temos como Igreja na América Latina e no Brasil. Sem negar a origem norte-americana, ouvi de muitos dizerem que a América Latina nos oferece mais um Papa.”, complementou.

ESCOLHA DO NOME ‘LEÃO XIV’

“Nenhum Papa repete o outro”, disse o Cardeal Orani Tempesta. “Ele tem um jeito mais discreto do que o do Francisco, mas é um jeito próprio dele. É outra pessoa, são outras experiências, mas a mesma doutrina e mesmas preocupações”, explicou.

A escolha do nome Leão XIV foi atribuída como uma referência ao último Pontífice que usou esse nome, Leão XIII, entre outras coisas o autor da primeira encíclica social da história, a Rerum novarum (“Das coisas novas”), publicada em 1891, considerado o pai da Doutrina Social da Igreja. Essa interpretação foi confirmada pelo Papa Leão XIV no sábado, 10, em seu primeiro encontro com os cardeais após sua eleição.

“O Papa Leão XIII, de fato, com a histórica encíclica Rerum novarum, enfrentou a questão social no contexto da primeira grande revolução industrial; e hoje a Igreja oferece a todos o seu patrimônio de Doutrina Social para responder a uma nova revolução industrial e aos desenvolvimentos da inteligência artificial, que trazem novos desafios para a defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho”, declarou o Santo Padre.

O Cardeal Paulo Cezar Costa analisou o papel do Pontífice como construtor de pontes no mundo: “Ele terá um papel político, de diálogo com o mundo e a sociedade. Ele vai permitir que o Evangelho, a Palavra de Deus e a Doutrina Social da Igreja possam ajudar a sociedade”.

Também o Cardeal Leonardo Steiner comentou que “em questão de política e de paz, o Papa nunca está sozinho. No Vaticano tem um conjunto de relações e organismos internos que ajudam o Papa a refletir, a questionar, a sugerir. Ele não está só. Toda a política do Vaticano é pensada em conjunto. O Papa Leão XIV é um homem de muita escuta”.

A coletiva de imprensa teve transmissão ao vivo da TV Canção Nova. Assista a íntegra abaixo.

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