Francisco ouve relatos sobre cristãos sul-sudaneses assassinados

Sacerdotes do Sudão do Sul também relataram ao Pontífice que mesmo com limitações estruturais a Igreja local busca estar próxima dos que mais sofrem

Foto: Vatican Media

Os sonhos de duas religiosas sul-sudanesas assassinadas em meados de agosto de 2021, enquanto voltavam da festa centenária da Paróquia de Nossa Senhora da Assunção, de construir um albergue para financiar a educação de meninas resgatadas da violência da guerra civil, e uma clínica de obstetrícia em Juba foram lembrados por uma irmã diante do Papa Francisco no sábado, 4.

O da irmã Regina Achan é o segundo dos dois testemunhos levados ao Papa durante o encontro com os bispos, sacerdotes, diáconos, consagrados e consagradas e seminaristas do Sudão do Sul, na Catedral de Santa Teresa, em Juba. Diante dela, o Padre Luka Hassan Arnu, da Diocese de El Obeid, no Sudão, falou, elevando sua oração a Deus para que, graças à visita histórica de Francisco, “possa tocar o coração de todos os sudaneses e nos trazer uma paz duradoura”.

Duas religiosas e dois fiéis mortos em uma emboscada contra um ônibus

Irmã Mary Daniel Abut e Irmã Regina Roba Luate, diz Irmã Achan, foram mortas em 16 de agosto de 2021 em uma emboscada por bandidos em seu ônibus, a 30 quilômetros de Juba, quando voltavam de Loa, a cidade da missão de fundação de sua Congregação, a do Sagrado Coração. Também morreram com elas Leon Zozimo e Taban Caesar, que estavam no mesmo ônibus atacado por bandidos.

A Irmã Mary tinha quase 68 anos de idade e a Irmã Regina 67. Ambas nascidas no Sudão do Sul, “haviam encontrado sua vocação enquanto refugiadas em Uganda”, lembrou a Irmã Regina Achan. Juntas, elas haviam feito sua primeira profissão em 7 de janeiro de 1973 no convento de Moyo, Uganda, onde também fizeram seus votos perpétuos em 1º de janeiro de 1979. E celebraram juntas, em janeiro de 1998, o 25º aniversário de sua profissão religiosa em Cartum, Sudão.

Recordando a figura da irmã Mary Abut, a Irmã Regina, que falou em nome das 218 religiosas professas do Sudão do Sul, assinalou que ela tinha sido eleita Superiora Geral duas vezes, entre 2006 e 2018: “Como educadora, ela havia sido diretora da escola primária em Usratuna, Juba, e na época de sua morte residia na comunidade de Kator”. Em seus 12 anos como superiora geral, ela havia servido, com grande simplicidade, “como sacristã na Igreja de São Miguel, lavando, varrendo e limpando a igreja com a ajuda de apenas um assistente”.

Seus sonhos para a congregação incluíam “a criação de um albergue como fonte de renda” para apoiar atividades como a educação de meninas resgatadas, “nossos orfanatos e sua administração”.

O trabalho, explicou a irmã Regina, “tinha começado mas ainda não foi concluído devido à falta de fundos”. A irmã Mary “também queria construir uma biblioteca para os alunos da escola primária Usratuna, em Juba”. Esperamos que tudo isso seja realizado em sua memória”.

A Irmã Regina Roba, recorda depois a Irmã Achan, que tinha se formado como enfermeira primeiro em Kampala, Uganda, e depois em Cartum, Sudão, e “havia trabalhado como enfermeira e agente de saúde em vários locais no Sudão do Sul”.

No momento de seu falecimento, ela estava ensinando e treinando enfermeiras no Instituto Católico de Treinamento em Saúde, em Wau”.  Seu sonho “era construir um centro de maternidade em Juba”. Esperamos, com a ajuda de bons samaritanos, construir uma clínica de obstetrícia em sua memória”.

Em homenagem às irmãs, a Arquidiocese de Juba declarou o fechamento de todas as instituições eclesiásticas durante uma semana e celebrou missas diárias para elas. As irmãs foram enterradas no cemitério de Rejaf, ao sul de Juba.

IGREJA PRÓXIMA DOS QUE SOFRE

O padre sudanês Luka Hassan Arnu, da Diocese de El Obeid, falou ao Papa que  veio a Juba junto com outros irmãos “para adorar o Senhor e celebrar a unidade do povo de Deus destes dois países irmãos”.

Ele assegurou a Francisco que no Sudão e no Sudão do Sul “apesar de viver com a guerra civil e todos os danos consequentes, a Igreja nunca deixou de desempenhar seu papel sacerdotal, profético e pastoral”. Por meio de suas instituições pastorais, sanitárias e educacionais, “a Igreja coordena e oferece serviços ao próximo, apesar dos recursos limitados”.

O Padre Luka lembrou os muitos desafios enfrentados pela Igreja dos dois países irmãos, unida em uma única conferência episcopal, a Scbc (Conferência dos Bispos Católicos Sudaneses), liderada pelo bispo de sua diocese, Dom Yunan Tombe Trille Kuku Andali.

“Ateísmo sistêmico, indiferença às práticas religiosas, conflitos tribais e confrontos pela terra e outros recursos naturais, fome, serviços sociais deficientes devido à escassez de alimentos, preços altos, falta de trabalho e salários inadequados”, listou.

Tudo isso, frisou ele, “se deve à prolongada guerra civil e à relutância de nossos líderes políticos em trabalhar juntos pela paz”. E ele terminou seu testemunho com uma oração ao Senhor, para que ele possa “com esta visita histórica, tocar os corações sudaneses e nos trazer uma paz duradoura”. E invocou a intercessão da Virgem Maria, Rainha da Paz, e de Santa Josefina Bakhita, que nasceu no oeste do Sudão e morreu em Schio, perto de Vicenza, Itália.

Fonte: Vatican Media

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