Arte e fé: Companhia Mirante de Teatro

Fundada em 2018, a Companhia já realizou diferentes produções artísticas, entre elas a adaptação do Auto da Compadecida

Luciney Martins/O SÃO PAULO

Idealizada em 2013 por Janaína Iszlaji e Mariana Chiuso, a Companhia Mirante de Teatro nasceu em resposta a um ambiente artístico pautado por iniciativas que transformavam os palcos em palanques político-partidários ou que acusavam constantemente o catolicismo como culpado das mazelas humanas. Resolveu-se buscar um caminho próprio e livre das amarras ideológicas.

Em entrevista ao O SÃO PAULO, Mariana Chiuso, atriz, pedagoga e uma das fundadoras da Mirante, recordou que, na ocasião, queriam montar um espetáculo, que acabou não tendo continuidade.

Com seu terceiro filho recém-nascido à época, contudo, Mariana não desanimou e buscou dar corpo à ideia. Isso ocorreu em 2018, quando ela veio a São Paulo e produziu, junto com Thiago Domingues e a pedido da Editora FTD, dois espetáculos focados no tema da Educação: “Diário de Classe” e “Religando-se”. Neste último, o ator Arthur Baldin passou a integrar a Companhia.

Hoje, a Mirante conta com o trabalho dos artistas Arthur Alonso, Arthur Acosta Baldin, Amanda Ribeiro, Rebeca Traldi, Felipe Abramovictz e Janaína Iszlaji. Composta por pessoas de diferentes credos, a Mirante preserva suas origens e não tem receio de abordar temas relativos à fé católica.

Fiel às origens

 “Ainda não fomos ‘cancelados’ por isso, mas, como apontamos anteriormente, foi necessário criarmos um espaço próprio, subirmos neste Mirante, para que esta liberdade e amor a Cristo e sua Igreja pudessem ser vivenciados sem amarras no fazer artístico”, explicou Mariana.

Ela recordou, ainda, que a Arte também parte desta relação do ser humano com o Bom, o Belo e o Verdadeiro: “A fé é uma relação de confiança que nasce como um ato de amizade, uma relação não com uma ideia ou um sentimento subjetivo, mas com Deus encarnado, Jesus”.

Para Janaína, “a arte é a contemplação; é o prazer do espírito que penetra a natureza e descobre que a natureza também tem alma”, como disse Auguste Rodin.

“Como atores, buscamos revelar, por meio dos nossos corpos e da nossa sensibilidade, a alma dos personagens que construímos. Esse processo nos exige uma conexão com a natureza de maneira muito particular. Nós aprendemos a ver, ouvir e observar as pessoas e tudo que nos cerca com uma atenção diferenciada. Notamos os detalhes, os silêncios, os movimentos sutis das nuvens, o delicado aperto de mãos dos enamorados. Quando olhamos essa beleza sutil, somos tomados pelo sentimento de gratidão”, afirmou Janaína.

Ela disse, ainda, que, como atriz, faz um exercício de reconhecer Deus nas pequenas ações. “É a graça! E no palco, imitamos essas ações com o simples intuito de partilhar essas experiências. A nossa fé se revela pela imitação da vida, uma vida por vezes trágica, por vezes cômica, mas uma vida, a única possível; vida que nos foi dada pela graça divina”.

Interessada em Arte, especialmente na linguagem teatral, os integrantes da Companhia afirmam que não se trata de Catequese, mas integrar arte e fé. Se tocarmos o Bom, o Belo ou o Verdadeiro em nossos trabalhos, então atualizaremos o chamado original desta Companhia de arte”, afirmou Mariana.

As críticas positivas sobre as produções são frequentes, mas a Companhia diz acolher, com respeito, as críticas negativas, as quais são importantes para a busca do aperfeiçoamento artístico.

Projetos Além dos espetáulos teatrais produzidos em 2018, a Mirante fez uma intervenção performática na PUC-SP, em 2020, “Feminina Poesia”. A Companhia produziu também, em 2019, a montagem de uma adaptação do “Auto da Compadecida” com o grupo de jovens “Divino Coração”, da Paróquia Nossa Senhora do Brasil; fundou a “Trinitas Cia. Teatral”, com um grupo oriundo do Encontro de Jovens com Cristo (EJC) da Paróquia Santíssimo Sacramento e com estes montou “O Auto de Natal da Estrela”. Montou, ainda, “O santo e a porca” e o “Auto da Compadecida”, com estudantes da Fapcom, em 2019.

“Este ano, produzimos o curta ‘Via Dolorosa’ com a Trinitas. Além disso, a Mirante firmou uma parceria muito feliz com a Associação Fernanda Bianchini, conduzindo as aulas de teatro infantil há 3 anos na Associação e com dois trabalhos originais montados: ‘A grande Festa’, ‘O bullying é feio’ e estrearemos o curta ‘João, Mayara e o pé de feijão’, texto elaborado com nossos alunos, que também será publicado em livro”, explicou Mariana.

Outros dois curtas estão em fase de projeto: um sobre a crise de um jovem “sem voz” diante das demandas da escola e de uma família excessivamente controladora, e outro, para o público infanto-juvenil, sobre o processo de maturação de uma menina que descobre a dignidade e a beleza de ser mulher nas diversas vocações de suas ancestrais.

É possível acompanhar no blog miranticiablog.wordpress.com os projetos da Mirante, além de artigos sobre arte, entrevistas e uma agenda cultural. “O blog é uma forma de partilharmos os frutos dos grupos de estudo organizados durante a pandemia, assim como pesquisas individuais de cada componente da Mirante. Também possibilita uma troca muito frutuosa com artistas de várias linguagens que acabam enriquecendo nossa formação como Companhia”, explicou Mariana.

“O tempo ‘assombroso’ da pandemia foi justamente o momento em que recebemos novos companheiros de trabalho na Mirante, semeamos parte dos projetos mencionados e, principalmente, percebemos, de modo contundente, a importância da arte em ‘tempos de cólera’ ideológica, tanto à esquerda quanto à direita”, pontuou a atriz.

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