Europa discute transformar objeção de consciência em negligência médica diante da recusa à prática do aborto

Relatório sobre saúde, direitos sexuais e reprodutivos na União Europeia pode levar à votação do reconhecimento do direito ao aborto na região e propõe condenar os médicos que se recusarem a fazê-lo

Sede do Parlamento Europeu (foto: Dvulgação)

O Parlamento Europeu vota na próxima semana um documento “radical”, convocando todos os Estados-membros da União Europeia (EU) a legalizar o acesso ao aborto.

O “Relatório sobre a situação da saúde e direitos sexuais e reprodutivos na UE, no âmbito da saúde da mulher”, proposto pelo eurodeputado croata de centro esquerda, Predrag Fred Mati, busca o reconhecimento de um “direito ao aborto” e a redefinição da objeção de consciência como “negação de assistência médica”.

A proposta foi apresentada no dia 25 de maio e deve ir a votação na próxima sessão plenária do Parlamento Europeu, o órgão legislador da UE, de 7 a 10 de junho.

Grupos pró-vida alegam que o documento, se aprovado, violaria o princípio estabelecido de que as leis sobre aborto são da competência dos Estados-membros, e não das instituições da União Europeia.

A maioria dos 27 Estados-membros da UE permite o aborto. As únicas exceções são Malta e Polônia, que têm leis fortemente pró-vida.

Estratégia dissimulada

O Centro Europeu de Direito e Justiça (ECLJ na sigla em inglês), uma ONG com sede em Estrasburgo, na França, disse que o projeto tenta “introduzir uma nova norma sem que à primeira vista ela parecesse ser imposta”.

“A escolha da instituição nessa estratégia não deve ser subestimada, pois embora as resoluções do Parlamento Europeu não tenham valor jurídico vinculativo, elas são a expressão de uma opinião que o Parlamento deseja dar a conhecer aos Estados-membros”, afirma o ECLJ.

“Uma resolução pode posteriormente servir para legitimar politicamente a ação dos Estados-membros ou das instituições; ela se destina a produzir efeitos práticos”, continua o texto. “Mais importante ainda, ela pode expressar uma intenção pré-legislativa, que pode, posteriormente, ser utilizada para justificar atos vinculantes”, diz o Centro. “Não há dúvida, portanto, que um ato do Parlamento Europeu representa a porta de entrada para o coração do sistema normativo”.

Duas integrantes do Parlamento Europeu, a espanhola Margarita de la Pisa Carrión e a polonesa Jadwiga Winiewska, definiram uma “posição minoritária”, argumentando que o relatório não tinha “nenhum rigor legal ou formal”. “Ele vai além de suas atribuições ao abordar questões como saúde, educação sexual e reprodução, assim como aborto e educação, que são prerrogativas legislativas dos Estados-membros”, escreveram.

Direito inexistente

O relatório que será votado na próxima semana, segundo as parlamentares, “trata o aborto como um suposto direito humano que não existe no direito internacional”. “Isto é uma violação da Declaração Universal dos Direitos Humanos e dos principais tratados vinculantes, assim como da jurisprudência do Tribunal Europeu de Direitos Humanos e do Tribunal de Justiça da União Europeia”, afirmaram.

Observando que muitos Estados-membros da UE reconhecem o direito dos profissionais de saúde de se recusarem a participar de procedimentos que violem suas consciências, o relatório propõe: “De agora em diante, a chamada objeção de consciência deverá ser considerada negação de assistência médica”.

Para o ECLJ, o direito à liberdade de consciência é garantido pelo direito internacional e europeu. “A natureza fundamental desta liberdade não precisa mais ser comprovada; ela é descrita pela própria Corte Europeia [de Direitos Humanos] como o fundamento da sociedade democrática”, comentou.

Fonte: ACI Digital

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